Marco legal para mineração traz riscos análogos a mudança no Código Florestal

Em discussão no Congresso Nacional, alteração na legislação do setor faz pouco no combate a problemas socioambientais. Governo quer mais valor agregado a bens

São Paulo – O novo marco regulatório para a mineração planejado pelo governo pode, na visão de movimentos sociais, trazer poucos avanços em relação a problemas socioambientais e representa ameaças provocadas pelo lobby das empresas junto ao governo. Segundo relata reportagem de Eduardo Sales de Lima, do jornal Brasil de Fato, as propostas em formulação no Palácio do Planalto, promessa de campanha da presidenta Dilma Rousseff, são esperadas desde o início do ano. Mesmo sem ter confirmado detalhes do texto, um dos aspectos mais polêmicos é o provável aumento dos royalties sobre os produtos, medida que sofre forte oposição das empresas, mas há outras questões que preocupam os ativistas.

O Executivo federal trabalha principalmente com dois objetivos. O primeiro é aumentar a arrecadação aplicada ao setor, um dos mais fortes exportadores da economia brasileira. Ao mesmo tempo, a intenção é incentivar que se agregue valor aos minérios no Brasil, em vez de vender material bruto ou in natura, sem qualquer beneficiamento. Segundo o Ministério de Minas e Energia, 90% do minério de ferro e do nióbio retirados no Brasil são exportados, por exemplo.

Esse empurrão deve ocorrer com alíquotas menores para o material manufaturado no país após a extração ou usado pela indústria nacional. Ao mesmo tempo, há previsão de mudanças na outorga de título mineral – licença para extrair e manejar em diferentes etapas os bens extraídos.

Atualmente, os royalties dos minérios são calculados a partir do faturamento líquido – receitas da venda do produto, menos impostos e custos de transporte e seguro. A proposta do governo é de usar a receita bruta com base para as contas, além de elevar os percentuais de cobrança. Para cada minério deve ser estabelecido uma alíquota específica, dentro de uma margem de 0,5% a 8%.

Para Alexandre Gonçalves, da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e do Comitê Mineiro dos Atingidos pela Vale, as mudanças mantêm uma limitação: poucos ficam com os lucros. Ele cita como exemplo a presença da Votorantim em Minas Gerais, acusada de encaminhar resíduos com metais pesados ao rio São Francisco para a atividade de extração. “E essas riquezas são exportadas quase sem pagar impostos”, lamenta.

Entre as preocupações de movimentos sociais também está o fato de o Departamento Nacional de Produção Mineral ser convertido em uma agência reguladora do setor. “(Com isso, se quer) tirar toda a autonomia do Ministério de Minas de Energia”, explica Raimundo Gomes da Cruz, educador popular do Centro de Educação, Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular, de Marabá (PA), a 440 quilômetros a sudeste de Belém. A região abriga uma siderúrgica da Vale, além de minas de ferro.

O risco da adoção de uma agência reguladora e o esvaziamento do ministério é que ocorra situação análoga à de outros setores. As responsáveis por regulamentar e fiscalizar a aviação, as telecomunicações e a distribuição de energia elétrica, por exemplo, são comumente criticadas por movimentos sociais por agirem de acordo com as pressões das empresas. A formulação de políticas e a própria definição de regras específicas acaba ficando mais suscetível a influências do mercado, deixando de lado uma perspectiva de interesse social ou ambiental.

Maria Teresa Viana de Freitas Corujo, representante do Movimento pelas Serras e Águas de Minas, acredita que o novo Código de Mineração precisa ser visto de modo análogo ao Florestal, que tramita no Senado, depois de ter sido aprovado em maio na Câmara dos Deputados. Ambos têm, para ela, o objetivo de atender “à voracidade dos empreendimentos de mineração, para que se apossem das riquezas do território brasileiro”.

“Imagine juntar a alteração do Código de Mineração com a do Código Florestal. Estão alterando termos e legislações construídas durante décadas”, critica. Segundo ela, uma mudança no conjunto de leis do setor deveria, antes, contemplar interesses de comunidades, do ambiente e dos trabalhadores da mineração.

Gonçalves, da CPT, lembra ainda que a mudança defendida pelas empresas do setor inclui permitir o avanço da mineração em áreas atualmente restritas, como unidades de conservação, zonas de amortecimento e de fronteira. “(Isso pode acontecer) também nas áreas indígenas, quilombolas e de outras populações”, afirma. Isso reforça, para ele, os elos entre os códigos florestal e o de mineração.

A necessidade de mudanças na legislação é defendida pelo ativista para evitar situações como a da outorga na cidade de Riacho dos Machados (MG), a 560 quilômetros de ao norte de Belo Horizonte, para a canadense Carpathian Gold Inc. explorar jazidas de ouro. Segundo o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), a licença foi “facilitada” pelo governo estadual, sem passar por instâncias federais. Esse tipo de autonomia permite falta de controle, já que autoridades regionais tendem a ser mais suscetíveis à pressão de grandes empresas.

Minas Gerais é o estado com maior arrecadação do royalties de mineração no país, totalizando 50,6% de toda a receita do setor em território nacional. Fonte de recursos, a mineração ganha das autoridades do estado espaço para crescer sem o devido cuidado, na visão dos movimentos sociais. Eles acusam ainda a administração de fazer vista grossa a casos de grilagem de terra e fraudes em licenças ambientais por parte ads empresas.

Com informações do Brasil de Fato

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