Justiça determina paralisação de licenciamento de Belo Monte

Decisão de juiz do Pará ordena que Ibama realize novas audiências públicas e cuide para que debates sejam democráticos e abrangentes

Manifestação durante a audiência de setembro em Belém a respeito de Belo Monte (Foto: Lucivaldo Sena. Agência Pará)

A Justiça Federal em Altamira (Pará) determinou a suspensão do licenciamento da hidrelétrica de Belo Monte e a realização de novas audiências públicas. A decisão atende ao pedido do Ministério Público Federal, que apresentou em outubro sua manifestação contra as quatro audiências organizadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

Os procuradores entendem que o Ibama não respeitou o espaço das comunidades locais na realização das audiências públicas e que a promoção em apenas quatro cidades não é suficiente. Rodrigo Costa e Silva, procurador da República em Altamira, afirmou à Rede Brasil Atual que espera que sejam organizadas discussões em onze cidades e em algumas comunidades ribeirinhas.

“Achar que Altamira é uma região-polo e que dá para trazer todo mundo é desconhecer a área ou não levar em consideração a população que está sendo atingida. Tem muita gente pelo Rio Xingu, muita gente que vai sofrer os impactos, e essa população, que demora horas ou dias para chegar a Altamira, não vai ser em uma única audiência pública que vão conseguir apresentar isso”, afirma.

O ápice dos problemas, na visão do Ministério Público, foi a última audiência, realizada no Pará, em que o espaço escolhido para o evento não comportava todas as pessoas e em que houve acusação de que integrantes de movimentos sociais foram impedidos de participar.

O juiz Edson Grillo, responsável pela decisão, destacou em sua sentença que a marcação de audiência em apenas quatro cidades demonstrou a intenção do Ibama de restringir a participação popular. “A audiência pública não pode ser considerada, como sustentam os requeridos, mero ato ritualístico encartado no procedimento de licenciamento ambiental. Deve ostentar a seriedade necessária, a fim de que possa fielmente servir à finalidade para a qual foi criada que, no caso presente, é informar custos, benefícios e riscos do empreendimento, propiciando o debate franco e profundo com as populações envolvidas”, relata.

Até esta quarta-feira (11), a expectativa do governo era obter rapidamente o licenciamento ambiental e realizar antes do Natal o leilão de Belo Monte, que será o maior empreendimento hidrelétrico brasileiro depois de Itaipu, com capacidade de geração de 11 mil megawatts e custo estimado em R$ 16 bilhões.

Agora, o Ibama deve recorrer ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região contra a decisão de primeira instância. A assessoria do instituto informou à reportagem que o departamento jurídico ainda analisa o formato do recurso e se ele será formulado em conjunto com outros órgãos estatais, mas que a decisão será imediatamente cumprida.

O Ministério Público Federal entende que o governo federal ambiciona alcançar uma velocidade maior que o recomendável para uma construção como Belo Monte. “Um empreendimento do porte da hidrelétrica, o volume de terra que será movido, a grandiosidade da engenharia e os impactos que vão causar, não é uma obra de governo, é uma obra de Estado. Não adianta correr com licenciamento ou com qualquer outra coisa. Nossa posição será sempre do zelo e da cautela”, afirma o procurador Costa e Silva.

Histórico

Organizações sociais e ambientais também contestam o andamento do processo de Belo Monte. O Movimento Xingu Vivo para Sempre estuda ingressar no Sistema Interamericano de Direitos Humanos para barrar o licenciamento. As entidades que integram o movimento entendem que os direitos dos povos indígenas não foram respeitados na questão e que a hidrelétrica terá forte impacto sobre o ecossistema da região.

Na última semana, o caso de Belo Monte foi debatido na Comissão Interamericana de Direitos Humanos em uma audiência pública especial sobre grandes barragens. O governo terá de apresentar esclarecimentos sobre as dúvidas que forem levantadas pelo órgão subordinado à Organização dos Estados Americanos (OEA).

A Associação Brasileira de Antropologia apresentou um comunicado criticando a pressa do governo no processo. Especialistas destacados pela entidade analisaram os estudos de impacto ambiental e afirmaram que os efeitos de Belo Monte sobre a Bacia do Rio Xingu estão subestimados. Apontando que os índios foram ignorados no processo, a associação apontou que tal atitude pode gerar conflitos graves no Pará.