Telebrás como administradora da banda larga universal divide opiniões

Especialistas entendem que governo tem papel fundamental como indutor da inclusão digital, mas não há consenso quanto ao papel da empresa estatal

Intenção é que praticamente toda a população tenha acesso à internet nos próximos cinco anos e a expectativa é utilizar as redes de fibra ótica existentes. Telebrás administraria conjunto (Foto: Rodolfo Clix/Sxc.hu)

O governo federal espera realizar até a próxima semana uma reunião para lapidar os pontos principais no Plano Nacional de Inclusão Digital. A iniciativa, que a princípio envolve quatro ministérios, está prevista para ser lançada ao longo de novembro com a promessa como uma das últimas realizações do governo Lula.

A intenção é que praticamente toda a população tenha acesso à internet nos próximos cinco anos e a expectativa é utilizar as redes de fibra ótica existentes, como as da Petrobras e da Eletrobrás, com investimento público de no mínimo R$ 1 bilhão e total de R$ 3 bi. As certezas param por aí.

A possibilidade de a Telebrás ser revitalizada para assumir a administração da banda larga é um projeto defendido por setores do Ministério do Planejamento, mas provoca dúvida em outras salas da Esplanada. Depois de uma forte alta das ações da estatal negociadas em bolsa de valores ao longo das últimas semanas, um comunicado ao mercado tratou de apontar que, por ora, não há qualquer definição.

Enfraquecida pelas privatizações do governo Fernando Henrique Cardoso, a Telebrás está há mais de uma década com poucas funções, mas mantém R$ 283 milhões em caixa e o Estado detém 91% das ações. Para assegurar o poder da empresa, a expectativa é de que seja feita uma oferta de papéis na Bolsa de Valores de São Paulo como forma de viabilizar investimentos. De acordo com a Lei Geral de Telecomunicações, aprovada em 1998, a Telebrás precisaria apenas de uma portaria ministerial para ganhar nova função.

A partir do momento em que se considera a estatal como a opção mais viável, surgem outras dúvidas: quais devem ser as atribuições da empresa ressuscitada?

Todos estão de acordo que, depois de uma década em mãos privadas, falta muito para que as telecomunicações caminhem de maneira justa no país. A banda larga brasileira é cara e lenta em qualquer comparação com países ricos, do mesmo nível de desenvolvimento ou até mais pobres. Além disso, o fornecimento de banda larga segue as leis do mercado: onde a demanda é pequena e não gera lucro para as empresas, o serviço simplesmente não é oferecido.

Luiz Cuza, presidente da Associação Brasileira das Empresas Prestadoras de Serviços Especializados de Telecomunicações (Telcomp), lembra que a imensa maioria do território brasileiro é servida por apenas uma empresa e, com falta de concorrência, o consumidor perde o poder de punir ou premiar as operadoras. Por isso, ele entende que o Estado tem o papel de indutor do desenvolvimento, com incentivos fiscais, empréstimos e determinação de diretrizes.

Mas, na avaliação do presidente da Telcomp, a entrada da Telebrás como operadora pode ter um efeito negativo caso se inicie uma competição desleal. Ele defende que o governo encontre outras maneiras de incentivar o desenvolvimento da banda larga brasileira. “Se para levar banda larga para uma área, a operadora vai perder R$ 20 por cliente, o governo pode cobrir. Em muitos países se está fazendo um leilão reverso: quem dá o menor preço, o governo paga”, afirma.

Carlos Afonso, representante da sociedade civil no Comitê Gestor de Internet (CGI), entende que está mais que comprovada a necessidade de atuação do governo. Ele lembra que há países europeus em que o acesso à internet será universalizado a partir do próximo ano e é difícil saber quanto do Plano Nacional de Inclusão Digital poderá ser executado rapidamente, ainda que existam várias redes prontas para interligação. “Acho que o governo federal demorou demais para propor um plano estratégico nacional de banda larga verdadeira – e a atual proposta em discussão ainda corre o risco de contestação forte pelos monopólios regionais de telecomunicações”, destaca.

A resistência foi demonstrada nesta semana durante a Futurecom, feira do setor realizada em São Paulo, na qual empresários do setor privado manifestaram insatisfação com a reativação da Telebrás. O ministro das Comunicações, Hélio Costa, entende que o governo não tem uma empresa capaz de assumir um empreendimento deste tamanho e defende as Parcerias Público-Privadas (PPPs).

Antonio Mendes da Silva Filho, professor da Universidade Católica de Pernambuco e consultor da área de Tecnologia e Informação, pensa que a eventual concorrência da Telebrás é saudável, mas entende que o plano a ser anunciado pelo governo deveria ser testado antes. “Deveria ser feito de maneira piloto em cidades de médio porte. Observar como se daria o uso propriamente antes de fazer um investimento massivo”, pondera.

O professor entende que, uma vez implantado, a Telebrás não deve assumir meramente o papel de administradora da banda larga, mas selar uma parceria com o Ministério da Educação para o oferecimento de cursos a distância para regiões remotas.

“A inclusão digital está baseada em três pilares. Uma das coisas é a rede, ou seja, a infraestrutura. Aliado a isso, precisa de renda e educação. Não adianta prover infraestrutura de primeiro mundo, com cabeamento de fibra ótica, se quem vai utilizar não tem renda e muito menos uma educação mínima”, afirma.

O Ministério da Educação está incluído nas discussões do Plano Nacional de Inclusão Digital. Além dos cursos a distância, deve haver um projeto de formação de usuários e de operadores nos telecentros, que devem ter o número fortemente ampliado no próximo ano.