Relação promíscua

Lava Jato usou site ‘O Antagonista’ para interferir na escolha de presidente do Banco do Brasil

Mensagens divulgadas pelo The Intercept Brasil mostram que "parceria" entre procuradores e jornalistas também serviu para que um escândalo de corrupção parasse de ser noticiado

Rodolfo Buhrer / La Imagem/Fotoarena/Folhapress
Rodolfo Buhrer / La Imagem/Fotoarena/Folhapress
Deltan Dallgnol pediu a Diogo Mainardi que o site parasse de noticiar escândalo de offshores envolvendo o escritório de advocacia Mossack Fonseca

São Paulo –  Mensagens trocadas via Telegram divulgadas nesta segunda-feira (20) pelo The Intercept Brasil mostram que procuradores da Lava Jato usaram o site O Antagonista para interferir na nomeação do presidente do Banco do Brasil no governo de Jair Bolsonaro. A publicação acrescenta novas ações ao acervo da Vaza Jato sobre impropriedades praticadas por Deltan Dallagnol

De acordo com a reportagem, em 21 de novembro de 2018 o coordenador-chefe da força-tarefa, Deltan Dallagnol, enviou ao grupo Filhos do Januario 3 uma reportagem da Folha de S.Paulo mencionando a insatisfação de Onyx Lorenzoni com a possível escolha do ex-presidente da Petrobras Ivan Monteiro para presidir o banco. Como deputado federal, o chefe da Casa Civil encampou e relatou as Dez Medidas contra a Corrupção na Câmara, sendo próximo de Dallagnol.

O procurador acionou os colegas em busca de informações que pudessem sabotar a possível nomeação de Monteiro. Depois de pedir a assessores que buscassem documentos apreendidos por conta da prisão de Aldemir Bendine, ex-presidente da Petrobras, em 2017, Dallagnol enviou quatro arquivos ao jornalista Claudio Dantas, do Antagonista. Na madrugada de 22 de novembro, voltou a mandar mais material. O site já vinha em campanha contra a escolha de Monteiro e Dantas não chegou a postar o material que o coordenador-chefe da Lava Jato lhe enviou para incriminar Monteiro.

O Intercept também revela que, por conta de uma informação falsa passada por Dantas, a força-tarefa acessou, sem autorização judicial, os dados fiscais de Marlene Araújo Lula da Silva, nora do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O procurador Januário Paludo é flagrado nas mensagens pedindo dados sobre ela para a Receita Federal. Outro procurador, Júlio Noronha, recebeu de um assessor a respeito de pedido feito ao Coaf. Nada jamais foi encontrado contra Marlene, casada com Sandro Luís Lula da Silva.

A “parceria” entre procuradores e jornalistas não pararia por aí. Em dezembro de 2015, O Antagonista publicou quatro notas sobre empresas offshore como suspeitas na Lava Jato, envolvendo o escritório de advocacia Mossack Fonseca. Diogo Mainardi, um dos diretores do site, recebeu mensagens de Dallagnol pelo Telegram pedindo que as notícias sobre as offshores parassem de ser divulgadas “em benefício do interesse social da investigação”. Dallagnol ainda acena com a possíveis informações exclusivas no futuro como forma de convencer Mainardi, que concordou. O site não publicou nada a respeito da Mossack Fonseca até 26 de janeiro de 2016, quando estoura a 22ª fase da Lava Jato.