Novos rumos

Sérgio Nobre, presidente da CUT: ‘Bolsonaro não é qualificado para o cargo de presidente da República’

Em momento adverso, política e economicamente, CUT aposta na negociação para buscar saídas e mostrar que o país precisa corrigir sua rota. Se o governo não dialoga, a saída é procurar o Congresso, empresários, governadores, prefeitos. "Vamos conversar com quem quiser conversar", diz o novo presidente da central

CUT/RS-Jordana Mercado/CUT
CUT/RS-Jordana Mercado/CUT
Recém eleito presidente da CUT, Sérgio Nobre quer debater recolocação do país na rota do crescimento: "Povo quer comer, não quer saber de estrutura sindical"

São Paulo –Ao ser eleito, duas semanas atrás, para a presidência da CUT, Sérgio Nobre afirmou que o movimento sindical e os trabalhadores vivem seu período mais difícil. Um cenário adverso na política, na economia e na organização social, depois de uma “reforma” trabalhista que não cumpriu sua promessa e piorou o mercado de trabalho, e de mudanças na Previdência, prestes a serem aprovadas no Senado, que ameaçam presente e futuro dos assalariados. Agora, vem aí uma “reforma” sindical, um debate que o metalúrgico considera inoportuno para o momento, considerando a situação do país.

“O povo não come estrutura sindical, o povo quer comer”, diz Sérgio Nobre. Para ele, esse é o debate a ser feito: implementar uma agenda contrária à atual, que privilegie o mercado interno como fator de crescimento econômico e distribuição de riqueza. “É o nosso passaporte para voltar a crescer.”

Por isso, em meio às dificuldades de sobrevivência, as centrais buscam se articular para discutir diferentes pautas para o país. Apostam na negociação com outros atores sociais, na medida em que o governo não se mostra aberto ao diálogo. Na próxima quinta-feira (24), por exemplo, se reunirão com a Confederação Nacional da Indústria para discutir políticas industriais, outros rumos para o país. Esse também é o objetivo de manifestação marcada para o dia 30, em Brasília: chamar a atenção para os efeitos da política econômica.

“Está ficando cada vez mais claro para a população brasileira que o Bolsonaro não é uma pessoa qualificada para exercer o cargo de presidente da República. Se a população já percebeu que o Bolsonaro não é uma pessoa em condições de governar o país, o (ministro) Paulo Guedes não é uma pessoa em condições de dirigir a economia. Se ele levar a cabo seu plano de abertura comercial, esse liberalismo exacerbado, vai comprometer o futuro. O país precisa mudar de rota”, afirma o presidente da CUT.

Mas qual seria a saída, em um cenário sem Bolsonaro? Hamilton Mourão? O sindicalista, que ao lado de outros dirigentes se reuniu com ele no início do governo, considerou o vice até “simpático”, mas lembra que é um defensor do mesmo projeto. Além disso, não se trata de pedir a destituição do governo, mas de exigir mudanças, independentemente de quem estiver do outro lado da mesa. “Nós vamos conversar com quem quiser conversar com a gente. Vamos conversar no Senado, no Congresso, porque está aberto. O governo não quer conversar com ninguém, para ele nós somos comunistas, inimigos do povo, e fechou as portas. Vamos conversar onde tiver espaço. A CNI, por exemplo, quer debater conosco. O Congresso está aberto a receber proposta nossa, então vamos discutir com eles. Assim como vamos conversar com governadores, com prefeitos.”

Você já se manifestou sobre a reforma sindical, considerando um debate fora de hora. As centrais se reuniram na semana passada com o (secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia) Rogério Marinho. Qual foi a sua impressão, considerando que ele tem “antecedentes”, com reforma trabalhista, da Previdência. Já deu para perceber qual a intenção do governo, com aqueles grupos de trabalho sem participação de trabalhador?

Na reunião eu afirmei a nossa posição de que quando você tem quase 30 milhões de pessoas sem trabalho, quando você tem metade da população que trabalha sem carteira assinada. Quando você tem uma economia que não cresce, vê famílias em situração de miséria, não quer saber de reforma sindical, por mais relevante que seja.

A CUT nasceu dizendo que a estrutura sindical brasileira precisa de mudanças, mas não é esse o tema. O nosso tema é combater a fome, é  gerar emprego, esse é o tema crucial. Como o governo Bolsonaro não tem sensibilidade para esse tema, não tem compromisso. Aliás, muito ao contrário: vai tomando medidas que inclusive pioram a crise social que estamos vivendo.

Quando ele incentiva a privatização de empresas importantes que podem ser indutoras do crescimento do país, como a Petrobras, como fez com a Embraer, que foi um crime contra o desenvolvimento, quando anuncia leilão do pré-sal para entregar pra multinacional o que seria nosso passaporte para melhorar saúde, educação… Então, para que ele implemente essa agenda precisa enfraquecer o movimento sindical.

Paulo Guedes não é uma pessoa em condições de dirigir a economia. Se ele levar a cabo seu plano de abertura comercial, esse liberalismo exacerbado, vai comprometer o futuro. O país precisa mudar de rota

Eu disse (a Marinho) que num momento como este propor uma reforma da estrutura sindical não tem outra razão que não seja tirar o movimento sindical do debate que realmente importa para o país. Agora, nós não podemos, de maneira nenhuma, permitir que o governo destrua o movimento sindical. Para a sociedade brasileira, se a gente conseguiu manter direitos a duras penas foi por conta da luta do movimento social, sindical. Não podemos permitir que o governo apresente um projeto desastroso.

Você acha que isso é o que se desenha?

É o que está por trás. Nós, não por opção, se o governo entrar com esse tema no Congresso Nacional, vamos unidos com as centrais sindicais para defender o movimento sindical. Mas não é opção nossa. O tema do país não é reforma sindical.

Tem uma PEC (proposta de emenda à Constituição) também que foi apresentada…

Tem várias, o Congresso Nacional deve ter mais de 20 que tratam do assunto, tem novas dizendo que vão entrar… Todas com o mesmo objetivo, no sentido de enfraquecer (o movimento sindical), para que o governo consiga implementar sua agenda econômica, social, que é desastrosa para o país.

Diante disso, as centrais estão se organizando para atuar juntas dentro do Congresso, mas não era vontade de ninguém fazer esse debate agora. E nem achamos que esse debate é estratégico para o país. O povo não come estrutura sindical, o povo quer emprego, quer comer. É absurdo que, diante da tragédia social que estamos vivendo e está se aprofundando, que esse tema apareça como fundamental.

Lá atrás, as centrais chegaram a discutir um organismo de autorregulação. Esse debate andou ou não é a agenda do momento?

O que a OIT (Organização Internacional do Trabalho) recomenda e se pratica de mais moderno é a compreensão de que a estrutura sindical tem que ser uma decisão de quem vive essa relação, dos trabalhadores e dos empresários. Não é papel do governo determinar como funcionam as organizações sindicais, o governo não deve se intrometer. Os empresários têm que ter liberdade de se autorregular e os trabalhadores também. Isso é um entendimento no mundo. Por isso que tem um consenso nas centrais de que o melhor caminho é a autorregulação.

A estrutura sindical brasileira tem problema, a CUT nasceu lá em 1983 dizendo que precisava ter mudança, mas mudança modernizadora, construída dentro do entendimento, de um debate. E o que tem acontecido no Brasil desde 2016 é que se vem fazendo mudanças, seja na legislação trabalhista, na estrutura sindical, de maneira autoritária, sem nenhum debate. O Temer fez uma reforma trabalhista da noite para o dia, sem conversa com ninguém, precarizando empregos, os poucos que a gente tem de qualidade no Brasil. E hoje está comprovado: foi feita uma reforma que incentivou formas de contratação precária e o emprego não cresce.

A lei da “reforma” trabalhista (13.467) está completando dois anos. Durante a tramitação do projeto, o discurso recorrente foi o da “modernização” para criar empregos.

Nós sempre alertamos: o que gera emprego é investimento. É ter políticas para expansão do mercado interno, é investir em infra-estrutura, melhorar estradas, melhorar portos, construir habitação popular. Não é incentivar emprego precário.

Então, o que está acontecendo? Vamos permitir que se contrate por metade do salário, sem direito, que isso vai gerar emprego. Não é verdade. Estamos destruindo empregos que era de jornada de tempo integral, com proteção social, e estamos incentivando trabalho intermitente. Se a gente for ver, o país criou emprego criou neste semestre, mas todos no setor de serviços e com trabalho precário. O emprego de qualidade, que não é só na indústria, mas a indústria simboliza muito isso, na engenharia, na transformação, não está criando. A indústria regrediu 2% (segundo o IBGE, a produção industrial caiu 2,3% em agosto em relação igual mês de 2018 e acumula retração de 1,7% no ano e em 12 meses).

Eu consigo entender que um jovem de 16, 17 anos, que vai viver sua primeira experiência profissional, tenha um trabalho em tempo parcial. Agora, você não pode dizer que esse é o trabalho que vai determinar o futuro do seu país. Como alguém vai sustentar uma família, vai para a universidade com esse tipo de emprego? Não é razoável.

O emprego que tem futuro, que é estruturante, é o de qualidade, como médico, engenheiro, professor. Estamos destruindo e criando empregos terceirizados, de tempo parcial, sem carteira assinada, que portanto não contribui para o sistema de Previdência, não arrecada impostos para o Estado.

Não tivemos oportunidade de fazer debate. Essa reforma foi feita de goela abaixo. E mais grave: já no governo Bolsonaro, a edição da MP 873, também sem nenhum debate, inviabilizou a cobrança de taxa negocial ou imposto sindical dos trabalhadores, com o objetivo de inviabilizar o funcionamento dos sindicatos.

Você sabe que no mundo a taxa de sindicalização é de 18%. No Brasil, é mais ou menos parecido. Porque os trabalhadores ainda são reprimidos quando se filiam a sindicato, é um problema ainda muito grave no Brasil. Em qualquer lugar do mundo, os sindicatos vivem da mensalidade dos associados, mas também da cobrança de uma taxa quando os trabalhadores são beneficiados por algum acordo econômico importante. Quando negocia campanha salarial, tem aumento real, PLR (participação nos lucros ou resultados), aqueles que não são associados contribuem com uma taxa razoável, decidida em assembleia.

Então, o governo inviabilizou esse tipo de cobrança para inviabilizar o movimento sindical. Fez por medida provisória, sem debate com ninguém. É triste que isso aconteça em pleno século 21, em um país importante como o Brasil. Essa reforma que está sendo anunciada, de novo, pelo governo Bolsonaro vai na mesma linha. Na reunião que a gente fez com o Rogério Marinho, eles deixaram claro. Montou um grupo de estudos, que não tem nenhum sindicalista. Disseram que estavam abertos a receber contribuição das centrais, mas que até novembro aquilo vai virar um projeto de lei e vai para o Congresso Nacional.

Você não pega uma estrutura sindical que foi construída ao longo de 100 anos pelos trabalhadores, que tem uma cultura, e em 30 dias você desmancha desse maneira, sem nenhum debate. Nem com os trabalhadores e nem com os empresários. Até os próprios empresários estão reclamando que não estão representados naqueles grupos. Eles (do governo Bolsonaro) têm um projeto de desmonte da soberania nacional, dos direitos dos trabalhadores, e precisam enfraquecer a representação dos trabalhadores para levar a cabo seus planos.

Estamos na iminência da confirmação da reforma da Previdência no Congresso. Somando-se ao que já foi aprovado, qual a consequência talvez não para a atual, mas para as futuras gerações?

Para a atual também. O que nós discutimos durante a reforma? O mercado de trabalho expulsa as pessoas com 45 anos. Quando vou visitar alguma empresa, fazer assembleia, a primeira coisa que eu pergunto é quem tem mais de 50 anos. É raro. Como as pessoas vão se aposentar com 65 anos? Não é 65 anos de idade, tem que ter os 40 anos de contribuição. É impossível, vai condenar as pessoas a morrer trabalhando. Essa reforma foi feita para impedir as pessoas de se aposentar.

Quando o país não tem um programa de proteção social… Como a gente fala, o banco social do Brasil não é o BNDES, é a Previdência. Você pode ver que em mais de 70% dos municípios brasileiros a principal renda são os benefícios da Previdência – aposentadoria, auxílio-doença.

A gente que é sindicalista sabe que quando a indústria nasceu na Inglaterra, na Revolução Industrial, pessoas morriam aos milhares, de fome, de frio, porque não existia uma regulação social, que protegia as pessoas na ocasião do desemprego, do acidente de trabalho. Nós estamos voltando a isso.

A Previdência foi criada para apoiar o trabalhador quando ele adoece, não pode mais trabalhar, quando se acidenta, na velhice, quando engravida. Se você destrói isso, vai para a selvageria. Tanto a questão da previdência como a da seguridade social foram extremamente fragilizadas com a reforma, e isso terá consequência. Em um país com as características como as do Brasil, desmontar o sistema de proteção social é desastroso. Com certeza, isso vai ter grande impacto para o futuro.

Ainda no congresso da CUT, você anunciou um ato em Brasília no dia 30. Para que pautas vocês pretendem chamar a atenção?

Que o país está no rumo errado. Acho que está ficando cada vez mais claro para a população brasileira que o Bolsonaro não é uma pessoa qualificada para exercer o cargo de presidente da República. O que não está ficando claro é que a agenda econômica que ele está implementando, que tem apoio de setores sem compromisso com o país – as multinacionais não têm compromisso com o desenvolvimento nacional, têm compromisso com sua matriz –, exige que o governo faça uma abertura comercial cada vez maior, para poder importar, gerar emprego nos outros países e não no Brasil, (exige) a entrega da soberania, a Amazônia, as riquezas do solo, a água, os minerais, a privatização da Petrobras, que está em curso, do Banco do Brasil, da Caixa Econômica. Se tudo isso vier a cabo, o futuro está comprometido. Então, a mobilização do dia 30 é para chamar a atenção da sociedade.

Ninguém elegeu ditador. Você tem de se subordinar aos interesses da sociedade, que quer geração de emprego, soberania, os direitos respeitados.

Se a população já percebeu que o Bolsonaro não é uma pessoa em condições de governar o país, o Paulo Guedes não é uma pessoa em condição de dirigir a economia. Se ele levar a cabo seu plano de abertura comercial, esse liberalismo exacerbado, vai comprometer o futuro. O país precisa mudar de rota.

Qual seria o caminho, então? Vamos imaginar uma queda do Bolsonaro. Mourão é solução? Você teve um encontro com ele no início do ano. Ele passou uma impressão um pouco melhor, ou seria mais do mesmo?

Se estão no mesmo governo, é porque compartilham da mesma visão. Ele me pareceu uma pessoa extremamente simpática, mas que compartilha do projeto político que o Bolsonaro representa, igualmente desastroso para a classe trabalhadora brasileira.

A presidenta Dilma foi impedida de governar, ela foi derrubada sem ter cometido nenhum crime, o que é uma violência para a democracia. Então, o movimento sindical não está propondo que o Bolsonaro seja destituído. O que nós queremos é que o país mude de rumo. A política que ele está implementando penaliza os mais pobres, vai comprometer o futuro de maneira irreparável. Bolsonaro, Mourão, seja lá quem for, precisa entender que é presidente do povo brasileiro. Ninguém elegeu ditador. Você tem de se subordinar aos interesses da sociedade, que quer geração de emprego, soberania, os direitos respeitados.

Vocês pretendem reapresentar aquela agenda de desenvolvimento, que foi discutida com os empresários alguns anos atrás? (As centrais atualizaram um documento com 23 itens.)

Vamos ter agora, na próxima quinta-feira, no Rio de Janeiro um evento sobre política industrial. Vão estar todas as centrais sindicais e a Confederação Nacional da Indústria. Vamos discutir a necessidade de reindustrializar o país. Não tem como o Brasil garantir padrão de vida para o seu povo, melhorar os serviços de educação, de saúde, se não tiver uma base industrial muito forte. A indústria brasileira está morrendo, vem caindo ao longo do tempo. Precisamos botar essa agenda no centro. Vamos apresentar um conjunto de propostas novas, mas que já estamos falando há bastante tempo, no sentido de reindustrializar o país.

Qual é o nosso passaporte para voltar a crescer? É olhar para o nosso mercado interno. Temos mais de 30 milhões de trabalhadores desempregados, se estivessem ocupados com carteira assinada, estariam gerando renda, consumo, ia comprar camisa, refrigerante, sapato e fazer a economia andar. Nosso povo, a maioria, ainda não tem casa própria, não tem saneamento básico, transporte…

Se a gente olha para isso, o Brasil pode crescer por 50 anos ainda de maneira tranquila. Não somos igual à Alemanha, que já fez tudo, já tem toda a infraestrutura. Temos tudo pra fazer. Se a gente se volta para o mercado interno e pensa num projeto de desenvolvimento a partir daí, o país volta a crescer. Que foi o que o presidente Lula fez ao longo de suas duas gestões: ele olhou para o povo. Incluindo esse povo o Brasil vai crescer. Precisamos recuperar essa experiência que foi positiva.

Considerando um entendimento entre trabalhadores e empresários, na ausência do governo, quem seria o interlocutor? O Congresso?

Nós vamos conversar com quem quiser conversar com a gente. Vamos conversar no Senado, no Congresso Nacional, porque está aberto. O governo não quer conversar com ninguém, para eles nós somos comunistas, inimigos do povo, e fechou as portas. Não é opção. Vamos conversar onde tiver espaço. Não escolhemos interlocutor.

A CNI, por exemplo, quer debater conosco. O Congresso está aberto a receber proposta nossa, então vamos discutir com eles. Assim como vamos conversar com governadores, com prefeitos, porque muita coisa de política de desenvolvimento e geração de emprego pode ser implementada no município, por lei municipal, por lei estadual. Se tiver prefeito que quiser, vamos conversar, independentemente de partido, governador, e vamos conversar com presidente da Câmara, do Senado. E se o governo quiser abrir espaço de diálogo vamos também, sem nenhum preconceito.

Tono_Carbajo/ Fotomovimiento

“Estamos caminhando para uma situação social tão grave que é meio o que está acontecendo no Chile. A vida está piorando e no Brasil é a mesma coisa. A insegurança está chegando

Hoje, o governo Bolsonaro, com as atitudes, seus pronunciamentos, caminha para um isolamento político?

Pelo menos em relação à gente. Os pronunciamentos dele são extremamente agressivos, desrespeitosos com a classe trabalhadora, em especial com o movimento sindical. É opção dele. Não é que não queremos, ele que não se dispõe a conversar. A cada declaração dele, vai distanciando cada vez mais os representantes dos movimentos sociais de seu governo. Tem muitos analistas, inclusive, que acham que ele não quer ser presidente da República. Ele quer ser liderança de 10%, 15%. De uma direita raivosa que se formou  no Brasil nos últimos anos. Vamos aguardar.

Não falta as pessoas irem para as ruas? Não há um certo adormecimento da sociedade, não falta alguma coisa?

Eu vejo com naturalidade. Quando a situação está ruim, você vê o salário cair, fábrica fechando, as pessoas perdendo emprego, elas se recolhem, com medo de perder emprego, inseguras em relação ao futuro. É compreensível. Quando você está num momento bom, o que você faz, em especial o movimento sindical? Tira as pautas da gaveta, vai cobrar mais salário, mais condições de trabalho, melhoria nas condições de vida. Num cenário de recessão, de desemprego elevado, é mais difícil você mobilizar.

Mas penso que estamos caminhando para uma situação social tão grave que logo as pessoas vão perceber, e é meio o que está acontecendo no Chile. É ingênuo achar que a população está lá nas ruas só porque aumentou a passagem do metrô. Estão percebendo que a vida está piorando e no Brasil é a mesma coisa.

A insegurança está chegando. Logo vamos ter grandes mobilizações no Brasil, e espero que essas mobilizações sejam lideradas por nós, pelas centrais sindicais, que é quem tem legitimidade para fazer isso. Porque o pior dos mundos seria se a gente tivesse mobilizações como a que vivemos em 2013, por exemplo, em que as pessoas vão para a rua sem uma pauta, sem uma liderança.

Acho que o papel agora do movimento sindical, do movimento popular, é se preparar para liderar esse processo, e que ele tenha comando e que fique nos limites da democracia. Esse é nosso desafio.

É preciso também convencer as pessoas sobre a importância dos sindicatos, depois de um tempo em que foi alimentado um certo discurso anti-sindical e anti-social?

Eu não conheço nenhum empresário importante que não tenha seu sindicato. A Fiesp, por exemplo, é um sindicato poderosíssimo. Então, os empresários se organizam em torno da Fiesp, da CNI, para levar suas reivindicações ao governo. A classe trabalhadora também.

Tem problema que você só resolve coletivamente. O que nós precisamos mostrar pro povo? Que quando ele está trabalhando, seja na indústria, no campo, no comércio, nos serviços, ele está gerando riqueza, e ele não pode deixar que os outros decidam para onde essa riqueza vai. E ele só faz isso de maneira organizada, seja em sindicato, em movimento social, em partido político. Então, o sindicato é tão importante na vida dele como é a igreja, como é a escola, ele precisa compreender isso, o sindicato precisa fazer parte da vida dele.

Qual a importância da questão do ex-presidente Lula na consolidação de uma retomada do processo democrático?

Acho fundamental. O presidente Lula tem uma contribuição inestimável para a organização dos trabalhadores no Brasil. Em 1978, ele fez a classe trabalhadora erguer a cabeça e perceber que se nós produzimos a riqueza, não podemos deixar que os outros decidam, então temos que nos organizar como sindicato, como partido.

Estou com 54 anos, tenho certeza de que os melhores anos da minha vida, da minha família, foram os anos do governo dele, nosso povo pôde comer, pôde viajar, o país estava unido, todo mundo reconhecendo a importância do governo que ele fez. E ele está preso só por uma razão: as pessoas “queriam” retroceder. Apagar da história esse período bom que a classe trabalhadora construiu, apagar a sua liderança, subordinar novamente nosso país aos interesses dos Estados Unidos, entregar nossas riquezas, privatizar a Petrobras.

Aquilo que a gente dizia está ficando claro com as denúncias do Intercept. Eles queriam tirar o presidente Lula das eleições, fraudar as eleições, porque se ele fosse candidato não teria nem segundo turno, Bolsonaro não seria presidente. Porque não cometeu crime nenhum, a Lava Jato tinha por trás um projeto de poder, perseguiu o presidente Lula o tempo inteiro. Por isso está claro para o mundo que ele é um preso político. E a liberdade dele tem a ver com a manutenção de direitos no Brasil.

Acho que essa é também uma tarefa importante para o movimento sindical: mostrar para o povo brasileiro que o Lula solto tem a ver com a manutenção de direitos dele (o povo). Se ele quer emprego, quer direitos, é importante que o presidente saia e possa percorrer o Brasil e nos ajudar a não permitir que o país seja destruído do jeito que estão fazendo. A liberdade dele vai ser fruto da mobilização dos trabalhadores. Acho que o STF, esse povo que deu o golpe, não tenho nenhuma esperança. Ele só sai com pressão popular.

 

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