Estado de direito

Para analista, pressões sobre o STF não serão suficientes para impedir ‘freios à Lava Jato’

"Mesmo do ponto de vista do antipetismo e dos apoiadores da Lava Jato, já se considera o cálculo de Lula sair da cadeia", acredita professor da Unicamp

Dorivan Marinho/SCO/STF
Dorivan Marinho/SCO/STF
"A grande dificuldade do Supremo é administrar o quanto voltam atrás", diz cientista político

São Paulo – O Supremo Tribunal Federal está sob forte pressão diante da perspectiva de julgar muito em breve a questão relativa à prisão após condenação em segunda instância (no plenário) e também a suspeição do juiz Sergio Moro (na Segunda Turma da corte) – neste caso, em pedido de habeas corpus da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Isso sem contar a definição da tese para concluir o julgamento que decidiu que réus delatados têm o direito de apresentar argumentos após os delatores nas alegações finais. Este último julgamento provocou reações de indignação em setores à direita, segundo os quais o STF quer “enterrar” a operação Lava Jato.

Eventual benefício a Lula dependerá da tese a ser definida, após a decisão a favor dos réus delatados. Especulações em Brasília dão conta de que a proposta do ministro Alexandre de Moraes é cotada a prevalecer. Para o ministro, os direitos dos delatados só devem ser considerados para os réus que questionaram esse direito ainda na primeira instância.

Para o cientista político e professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Frederico de Almeida, diferentemente da pressão sobre o STF no auge da Lava Jato, atualmente há maior convergência de interesses entre os atores políticos no sentido de limitar os poderes da chamada força tarefa.

“Não creio que essa pressão crie reações tão contundentes, porque a própria Lava Jato está desmoralizada por conta dos vazamentos do The Intercept. Também não acho que haverá mobilizações de rua significativas, de movimentos da direita, suficientes para ameaçar o Supremo, como aconteceria há três anos”, diz. “Acredito que o sistema político vai procurar legitimar uma decisão do Supremo. Mesmo do ponto de vista do antipetismo e dos apoiadores da Lava Jato, já se considera o cálculo de Lula sair da cadeia como uma possibilidade.”

Na opinião do analista, se o STF pode ser considerado “cúmplice” de todo o processo que levou Lula à prisão, no atual cenário os ministros devem voltar atrás na questão da segunda instância e outras decisões que “legitimaram práticas pouco ortodoxas e até arbitrárias”. “Vai ficar evidente que o Supremo foi permissivo por conta de questões políticas que evitaram a candidatura do Lula.”

Para Almeida, o Supremo tenta administrar “o quanto voltam atrás e o que devem resolver quanto a Lula”, pois haverá “impactos fortes” com sua libertação. “Porque é o principal opositor do governo e tem a capacidade de articular a oposição de fato. Mas voltar atrás já está claro que o Supremo vai, e também colocar freios na Lava Jato é inevitável.”

A questão da segunda instância poderia ter sido julgada desde o início de 2018, já que o ministro Marco Aurélio Mello liberou para o plenário as ações diretas de inconstitucionalidade 43, 44 e 54, das quais é relator, em dezembro do ano anterior. Elas não foram pautadas por decisão da então presidenta da corte, ministra Cármen Lúcia.

Almeida lembra que, se a decisão do tribunal for a favor de que o réu só pode ser preso após decisão de tribunais superiores (STF e STJ), Lula “vai para casa no dia seguinte”. Mas há outras pendências.

Se as informações dão conta de que o STF já tem maioria no plenário para reverter o entendimento, o que libertaria Lula da prisão decorrente do caso do tríplex do Guarujá, por outro lado o caso ainda não foi concluído no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que poderia condenar Lula, esgotando os recursos nesse âmbito. Com isso, ele voltaria a ser preso.

Mas a hipótese, até politicamente, parece remota. “Pode ser que Lula saia depois do julgamento do STF, o STJ o condene em seguida e ele volte à prisão. Mas não acho que o STJ vá comprar essa briga. A decisão recente do STF (sobre réus delatados e delatores) pode, inclusive, ser um recado ao STJ”, avalia. “Não parece haver no STJ um movimento lavajatista ou sinal de que, se o STF mudar o entendimento sobre segunda instância, o STJ vá devolver Lula à prisão.”

No STJ, a defesa de Lula tem recurso em que pede a suspensão da condenação no caso do tríplex enquanto o STF não decidir seus habeas corpus sobre a suspeição de Sergio Moro. Na segunda instância, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região ainda não julgou o caso do sítio de Atibaia.

Suspeição

Se a Segunda Turma do Supremo reconhecer a suspeição de Moro, o julgamento do caso tríplex deverá ser anulado. A questão, na opinião de Almeida, é que o caso não é juridicamente simples, pois a declaração da suspeição do ex-juiz depende da avaliação dos vazamentos e de seu valor jurídico. “Esses vazamentos não foram tratados juridicamente. O único que menciona os vazamentos como prova é Gilmar Mendes.”

A Segunda Turma é composta pelos ministros Cármen Lúcia (presidenta), Celso de Mello, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Edson Fachin. Cármen e Fachin já votaram contra o HC de Lula no julgamento suspenso em junho, mas Cármen indicou a possibilidade de mudar sua posição.

Segundo a Folha de S. Paulo, Gilmar, que não tem poupado pesados ataques à Lava Jato, articula, inclusive com a Procuradoria Geral da República, a análise dos arquivos de vazamentos tecnicamente, com objetivo de validá-los.

“Se conseguirem fazer isso antes do julgamento da suspeição de Moro, deve ser fatal. Se não avançar do ponto de vista de investigação e perícia, o argumento da suspeição fica mais frágil”, acredita o professor da Unicamp. De acordo com a matéria da Folha, outros ministros do STF apoiam o movimento de Gilmar nos bastidores.

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