Câmara dos Deputados

Deputados questionam Moro. Ex-juiz se defende atacando jornalismo do ‘Intercept’

Ministro da Justiça depõe a três comissões e diz que vazamentos são fruto de atos de "grupo criminoso". "É trivial que juízes falem com procuradores e advogados", afirma

Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
Moro afirmou que o material Telegram “não existe mais”, já que saiu do aplicativo em 2017, segundo ele

São Paulo – O ex-juiz e atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, presta depoimento nesta terça-feira (2) a três comissões da Câmara: de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ); de Trabalho, Administração e Serviço Público; e de Direitos Humanos e Minorias. Ele responde a questões dos deputados sobre as revelações do site The Intercept Brasil sobre sua condução dos processos da Operação Lava Jato. A audiência é tumultuada e o presidente da sessão, deputado Felipe Francischini (PSL-PR), ameaçou suspender a reunião.

O ex-juiz mencionou ataques ao seu celular e disse que “alguém com muitos recursos” está por trás das invasões de seu celular para anular “condenações”. Segundo ele, quem estaria por trás das invasões não são “adolescentes com espinhas”, termo usado duas semanas atrás, também na Câmara. “É ilustrativo de uma conduta de contra-inteligência que não é condizente com ‘adolescentes com espinhas’”, acrescentou. Reiterou que “um grupo criminoso” estaria por trás das revelações.

O ministro afirmou que o Intercept talvez quisesse ser objeto de “busca e apreensão” em suas dependências “como mártir” da imprensa. Como no depoimento ao Senado, afirmou não reconhecer a autenticidade dos diálogos, mas admitiu que “algumas” (mensagens) podem ser dele, “algumas podem ter sido adulteradas total ou parcialmente”. As mensagens foram divulgadas “com sensacionalismo”. Citando o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Federal (STF) Carlos Velloso, disse que os diálogos divulgados “não tinham nada de ilícito”.

“É comum que juízes falem com procuradores e advogados. (São) coisas triviais. Esse contato (de juiz) existe com procuradores, delegados e advogados. Como juiz, sempre agi com correção, com base na lei, na imparcialidade, sem qualquer espécie de desvio. “

Moro repetiu que não está demonstrada a autenticidade das gravações. “(Mas) Se as mensagens não foram adulteradas, não tem problema. Não reconheço a autenticidade. Pode ter material adulterado total ou parcialmente.”

A deputada Professora Marcivania (PCdoB-AP) atacou a ameaça à liberdade de imprensa contida nas respostas dos envolvidos nos diálogos revelados. “Se confirmada a autenticidade, vossa excelência violou o decoro, o dever de imparcialidade, transparência, uso privado de bens públicos, violação da honra da magistratura.”  A parlamentar acrescentou: “O senhor violou 18 artigos do Código da Magistratura Nacional”, entre os quais, a quebra do dever da imparcialidade.

No Twitter, o deputado Marcelo Freixo (Psol-RJ) também acusou como “grave” o ministro da Justiça “criminalizar o jornalismo e a liberdade de imprensa, fundamentais pra a democracia”. Para Freixo, “Moro age de forma ardilosa ao tentar igualar a ação criminosa de hackers com a prática do bom jornalismo que divulga informações de interesse público”.

O deputado Rogerio Correia (PT-MG) lembrou que, em um dos trechos de diálogos de Moro, ele aconselha o procurador Deltan Dallagnol a afastar a procuradora Laura Tessler, que não era suficientemente “firme” para conduzir o processo contra o ex-presidente Lula. “Pediu para afastar, e afastou”, disse Correia. “The Intercept, BandNews, Veja, Folha de S.Paulo, Correio Braziliense, todos confirmam os conteúdos (da Vaza Jato). O senhor continua negando os diálogos? Eu sugiro uma CPI”, prosseguiu.

Moro respondeu dizendo que, apesar das críticas, “a Lava Jato foi a maior investigação de corrupção e lavagem de dinheiro da história do país”. “Foi um trabalho institucional, reunindo MP, polícia e juízes”.  “Após o acordo com a Odebrecht, (a Lava Jato) atingiu todos os partidos.”

Moro afirmou ainda que houve “muitas tentativas de destruir a reputação dos envolvidos na operação”. Ele acrescentou que o material do Telegram “não existe mais”, pois ele saiu do aplicativo em 2017. “Apresentem as mensagens para autoridades competentes. Não posso comprovar a autenticidade de um material que não tenho.”

“Moro diz que quem está divulgando quer impedir as investigações. Quem quer impedir investigação é quem diz para não investigar FHC, porque é aliado. Aliado em quê? Quem está impedindo as investigações dos corruptos?”, questionou a deputada Erika Kokay (PT-DF).

Paulo Pimenta (RS), líder do PT, disse que a Lava Jato se transformou em um projeto de poder, o que é comprovado pela ida de Moro ao ministério de Jair Bolsonaro. O parlamentar perguntou se o ex-juiz nega que tenha grampeado escritórios de advogados de Lula.

Moro não respondeu à questão sobre os advogados. “Se as mensagens não foram adulteradas, não tem nada ali.” Ele se defendeu de uma série de questões dizendo que, no sistema de Justiça, existe a revisão de decisões. “A maioria das decisões foi mantida”, afirmou, citando o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), o STF e o Superior Tribunal de Justiça (STJ). “Nunca me satisfiz pessoalmente de condenar qualquer pessoa e as decisões foram mantidas.”