Direitos humanos

Para presidente da OAB, Bolsonaro mostra traços de crueldade e ausência de empatia

Por fala de presidente da República na qual zomba do assassinato de seu pai na ditadura, Felipe Santa Cruz deve mover ação no STF

Instagram/Felipe Santa Cruz
Instagram/Felipe Santa Cruz
"Minha avó acaba de falecer, aos 105 anos, sem saber como o filho foi assassinado", diz Santa Cruz sobre o pai

São Paulo – O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, divulgou na tarde desta segunda-feira (29) nota em que responde as declarações do presidente Jair Bolsonaro sobre o desaparecimento de seu pai, Fernando Santa Cruz Oliveira, no período da ditadura civil-militar. “O mandatário da República deixa patente seu desconhecimento sobre a diferença entre público e privado, demonstrando mais uma vez traços de caráter graves em um governante: a crueldade e a falta de empatia”, disse o presidente da Ordem. Ele escreveu que as declarações de Bolsonaro são “inqualificáveis”.

“É de se estranhar tal comportamento em um homem que se diz cristão. Lamentavelmente, temos um presidente que trata a perda de um pai como se fosse assunto corriqueiro – e debocha do assassinato de um jovem aos 26 anos”, continua. Segundo o colunista Lauro Jardim, de O Globo, Santa Cruz entrará com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) “para que o presidente diga o que sabe” sobre a morte de seu pai, preso por agentes do DOI-Codi em fevereiro e morto em março de 1974.

“Por que a OAB impediu que a Polícia Federal entrasse no telefone de um dos caríssimos advogados? Qual a intenção da OAB? Quem é essa OAB? Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a verdade”, afirmou Bolsonaro, ao protestar contra a entidade pelo que julga ter sido sua ação no caso de Adélio Bispo, autor da facada no então candidato do PSL à Presidência.

Sobre a defesa das prerrogativas da advocacia brasileira, Santa Cruz explica que a garantia do sigilo da comunicação entre advogado e cliente é uma salvaguarda do cidadão, e não do advogado. Ele esclarece ainda que apenas o celular do advogado de Adélio foi protegido. “Jamais o do autor, sendo essa mais uma notícia falsa a se somar a tantas”. A informação sobre sigilo protegendo Adélio já foi confirmada como falsa.

“O que realmente incomoda Bolsonaro é a defesa que fazemos da advocacia, dos direitos humanos, do meio ambiente, das minorias e de outros temas da cidadania que ele insiste em atacar”, continua Santa Cruz na nota. “Por fim, afirmo que o que une nossas gerações, a minha e a do meu pai, é o compromisso inarredável com a democracia, e por ela estamos prontos aos maiores sacrifícios. Goste ou não o presidente”, conclui.

Ex-presidente da OAB do Rio de Janeiro, o ex-deputado Wadih Damous escreveu nas redes que o ataque do presidente a Santa Cruz “mostra que somos governados por um verme”. “Bolsonaro é um lixo humano”, afirma Damous.

Parlamentares também se posicionaram nas redes sociais. A deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) escreveu que é indigno “ter de ler uma afirmação com este nível de covardia sobre pessoas que foram torturadas e assassinadas pela ditadura militar”. “A história do Brasil merece mais respeito, e respeito Bolsonaro não tem por nada”, diz.

“Bolsonaro cruzou qualquer fronteira de responsabilidade e respeito ao falar de uma forma tão violenta a um filho que perdeu seu pai”, publicou o deputado Marcelo Freixo (Psol-RJ). “Em meio à sua cegueira ideológica, Bolsonaro só consegue demonstrar ódio e raiva, sem nenhuma capacidade de diálogo. É inaceitável um presidente da República se comporte desta maneira.”

Nota de repúdio

Além de Felipe Santa Cruz, a OAB divulgou nota de repúdio às declarações de Bolsonaro. “Todas as autoridades do país, inclusive o senhor presidente da República, devem obediência à Constituição Federal, que instituiu nosso país como Estado Democrático de Direito e tem entre seus fundamentos a dignidade da pessoa humana, na qual se inclui o direito ao respeito da memória dos mortos.”

A entidade observa que a Constituição de 1988 veda atentados contra os direitos humanos. Ela também se solidariza com as famílias dos mortos, torturados ou desaparecidos durante o regime militar, “atingidos por manifestações excessivas e de frivolidade extrema” de Bolsonaro.

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