Vaza Jato

Sem responder maior parte das perguntas, Moro deixa audiência chamado de “juiz ladrão”

Deputados da oposição criticam ex-juiz da Lava Jato e atual ministro da Justiça. Glauber Braga (Psol-RJ) avisa que provaria no Conselho de Ética que Moro é "juiz ladrão"

Lula Marques
Lula Marques
Ex-juiz Sergio Moro deixou muitas perguntas sem resposta em audiência na Câmara dos Deputados

São Paulo – O depoimento do ministro da Justiça, Sergio Moro, à Câmara dos Deputados pouco acrescentou às investigações que avaliam a parcialidade do então juiz, exposta pelas conversas com procuradores da Operação Lava Jato. Essas mensagens, trocadas pelo aplicativo Telegram, estão sendo publicadas pelo site The Intercept Brasil. As ilegalidades de conduta – juiz combinar tática de ação com acusadores – levaram o deputado a Glauber Braga (Psol-RJ) a usar o termo “juiz ladrão”. A linguagem usada para classificar árbitro de futebol que interfere no resultado de uma partida, fez com que Sergio Moro abandonasse a sessão.

Moro agradeceu às homenagens e elogios recebidos dos parlamentares da base do governo Jair Bolsonaro – inclusive um troféu do deputado Boca Aberta (Pros-PR), classificado como a “Champions League do Combate à Corrupção”. Mas não respondeu às perguntas feitas pelos deputados da oposição.

A sessão, iniciada às 14h da terça-feira (2), foi encerrada quando já passava das 21h, após exposição de Glauber Braga.

https://www.facebook.com/glauber.braga1/videos/555231735007459/

“Pode o juiz indicar testemunha, orientar operações e sugerir troca de procuradores em fases do processo? Ele não respondeu pois sabe que foi parte no processo. Foi juiz parcial!”, avalia Braga. Ao ser chamado de “juiz ladrão”, Moro abandonou a sessão.

“Moro não respondeu aos questionamentos, se esquivou o tempo todo”, critica o deputado do Psol. “Chama atenção também a sua covardia. Quando confrontado preferiu fugir, foi embora, não sustentou o debate.”

Braga está sendo ameaçado por “deputados bolsonaristas” com processo no Comitê de Ética da Câmara. E avisa: “Se for aceito, o que não acredito, podem ter certeza que vou propor a produção de provas, a convocação de testemunhas. Vai ser mais uma oportunidade para demostrar que Sergio Moro é um juiz ladrão. Eu não retiro uma palavra do que disse ontem”.

A deputada Gleisi Hoffmann (PT/PR), questionou o ministro a respeito de suas relações com o advogado Carlos Zucolotto. “Sua esposa teve escritório com Carlos Zucolotto? Sim ou não? O senhor ou a esposa tiveram ou têm conta no exterior? O senhor já fez viagem ao exterior acompanhado do advogado Zucolotto? Ele já fez pagamentos em favor do senhor nessas viagens?”

O ex-juiz afirmou ser “maluquice” as contas no exterior e “repudiar” a pergunta sobre Zucolotto.

O senhor vai ser julgado

O ex-juiz participou de audiência no Senado em 19 de junho para falar sobre o mesmo assunto. E adiou para essa terça a audiência na Câmara anteriormente prevista para 26 de junho. Três comissões foram responsáveis pela convocação: Constituição e Justiça (CCJ), Direitos Humanos e Minorias (CDHM) e Trabalho, Administração e Serviço Público (CTASP). Basicamente, Moro repetiu o que havia dito aos senadores e, apesar de não reconhecer ou se lembrar das mensagens divulgadas, afirmou que não configuram crime.

A deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) não concorda e questionou se Moro gostaria de ser julgado por um juiz que indicasse testemunha para a acusação. “O senhor vai ser julgado, mais cedo ou mais tarde. E quando for julgado o senhor quer um juiz que tenha orientado a acusação, como o senhor fez?”

Rosário lembrou que o atual  ministro usou muito a palavra “convicção” durante o julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Eu tenho convicção de que o senhor é um juiz parcial, tenho convicção de que sua operação foi movida por interesses pessoais”, disse, elencando uma série de situações ocorridas durante todo o processo da Lava Jato, que indicariam a parcialidade do atual ministro.

“No dia 8 de julho de 2018 o senhor falou com algum juiz do TRF4, com a PF, o MPF ou Ministério da Justiça?”, perguntou a deputada. “O senhor já não era juiz do caso, mas trabalhou para que ele (Lula) não fosse solto pela liminar que o Dr. Favreto (o desembargador Rogério Favreto, do TRF-4) havia assegurado.” Moro não respondeu nem comentou.

Líder do PT na Câmara, o deputado Paulo Pimenta (PT-RS) lembra, ainda, que dez deputados perguntaram a Moro se a Polícia Federal está investigando o jornalista Glenn Greenwald, do Intercept. Moro igualmente não respondeu.

Puro teatro

“Ele fugiu de todas as perguntas e não aceitou o desafio de abrir o seu sigilo. Passou vergonha na audiência pública sobre a Vaza Jato”, ironiza o parlamentar petista que sugeriu a Moro abrirem mão, os dois, dos sigilos fiscal, bancário, telefônico, e das contas de WhatsApp e Telegram, além de ter seus equipamentos eletrônicos periciados. O ministro não aceitou o desafio que classificou de “puro teatro”.

“Estamos dando oportunidade a Moro de provar que as mensagens que estão sendo divulgadas não são verídicas. Basta ele assinar todos os documentos que deixei na mesa, abrindo mão de todos os seus sigilos. Sergio Moro, não seja covarde”, provocou Pimenta, que aponta, ainda, contradições nas falas do ex-juiz. “Ele disse que não reconhece autenticidade dos diálogos revelados na Vaza Jato, mas atestou a veracidade do diálogo com críticas à procuradora Laura Tessler”, exemplifica.

Mais que contradições, o deputado Marcelo Freixo (Psol-RJ) vê ardil nas falas de Moro. “É equiparar a ação do hacker (se houve violação é um crime que tem mesmo que ser investigado) com o trabalho jornalístico. Tudo pra criminalizar não só Glenn, como atacar a liberdade de imprensa. É algo muito perigoso vindo de um ministro da Justiça”, ressalta o parlamentar.

Freixo considera a contradição mais gritante, Moro não reconhecer a autoria dos diálogos, mas se preocupar tanto em dizer que as conversas não apontam ilegalidade. “Se não é ele, porque essa preocupação?”, questiona. “Moro fala em fortalecer o combate a corrupção, mas ao usar os resultados da Lava Jato como justificativa para sua conduta ilegal, ele está fragilizando o enfrentamento à corrupção ao dizer que os fins justificam os meios.”

Frases prontas e cinismo

Para o deputado Alexandre Padilha (PT-SP), além de “fugir” da sessão, Moro mentiu pelo menos três vezes ontem: “disse q não há mensagens sobre o vazamento do grampo com Dilma-Lula; que nunca vazou grampo ilegal; que nunca processou ou perseguiu, os jornalistas que o digam”.

Líder da minoria na Câmara, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) lembra de pelo menos três perguntas suas feitas a Moro, que ficarem sem resposta. O senhor acha correto o que está revelado nas conversas? Fez ou não fez? Houve contato com desembargadores e procuradores sobre habeas corpus de Favreto enquanto o senhor estava de férias? O senhor manteve contato com advogados de defesa pelo Telegram de forma isonômica e quais?

“Moro não respondeu nenhuma pergunta incisiva dos deputados de oposição, inclusive, a que eu fiz para que ele falasse em tese sobre o que ele praticou como juiz, já que é professor”, pontua a parlamentar. “Usou frases prontas e cinismo, mostrando que desrespeita o conjunto dos parlamentares, tendo olhos apenas para os que o adula.”

 

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