Reação nas telas

Às vésperas de Gramado, cinema brasileiro vive clima de revolta e esperança

Dias antes do festival de Gramado, o 21º Grande Prêmio do Cinema Brasileiro tem tom político e filme “Marighella” como grande vencedor

Reprodução
Reprodução
'Marighella', com direção de Wagner Moura fpi o grande vencedor do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. Resistência a ataques contra a cultura nacional

São Paulo – A Academia Brasileira de Cinema e Artes Visuais realizou na noite de ontem (10) o 21º Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, premiação qu antecede o 50º Festival de Gramado, que ocorre entre os dias 12 e 20, na cidade da serra gaúcha. O tom da cerimônia na capital fluminense foi político, com levantes de “fora Bolsonaro” durante todo o evento. O grande vencedor da noite não poderia ser mais adequado. Marighella (2019), de Wagner Moura, recebeu oito Troféus Grande Otelo, incluindo melhor filme e melhor ator para Seu Jorge, que interpreta o revolucionário Carlos Marighella. A expectativa é de que Gramado repita o tom politizado.

O Grande Prêmio do Cinema Brasileiro é considerado o “Oscar” do país, explica o jornalista e crítico Luiz Zanin à jornalista Talita Galli, apresentadora do Bom para Todos, da TVT. “É baseado no esquema do Oscar mesmo. Várias categorias, atribuições de prêmios. Ela é feita pelos membros da Academia Brasileira de Cinema. A própria categoria vota nos seus pares. Ontem tivemos uma premiação das mais interessantes. É um prêmio sediado no Rio de Janeiro. Por problemas com a prefeitura de governos anteriores (do bolsonarista bispo Marcelo Crivella), ele saiu de lá e veio pra São Paulo, no Teatro Municipal”, afirma.

“A Camila (Pitanga), na primeira fala, aproveitou o tema musical para cantar o ‘Lula lá’. Ela disse ‘Lula, queremos você de novo'” (Reprodução/Canal Brasil)

“Neste ano ele volta para o Rio de Janeiro (…). Foi uma coisa muito legal o prêmio voltar à origem”, prosseguiu. A cerimônia contou com ampla adesão da classe, que lotou o auditório. “Isso é importante, porque o tom da cerimônia foi nitidamente político. Do começo até o fim.”

A cerimônia foi apresentada pelo ator Silvério Pereira e pela atriz Camila Pitanga. “A Camila, na primeira fala, aproveitou o tema musical para cantar o ‘Lula lá’. Ela disse ‘Lula, queremos você de novo’ e foi muito aplaudida pela plateia. Foi um tom oposicionista ao atual governo e um tom de muita esperança de que, em outubro, possamos começar a mudar esse ambiente pernicioso que vivemos”, completou o crítico.

Cultura e resistência

Zanin lembra que o setor artístico foi hostilizado “desde o primeiro momento deste infeliz governo Bolsonaro”. Então, o clima geral foi de esperança em misto de revolta. “Os artistas premiados fizeram discursos contundentes contra o atual governo e com esperança da eleição de Lula. Foram acompanhados por coros de ‘fora Bolsonaro’. A premiação principal, como já era esperado, recaiu sobre Marighella. Era mesmo o favorito, com 17 indicações (…) Conseguiu as principais premiações artísticas, além de algumas técnicas. Foi o melhor filme, melhor diretor estreante, melhor ator. Foi uma consagração desta obra que teve muitos percalços. Pronta em 2017, foi boicotada pelo governo que não queria de jeito nenhum que essa obra chegasse aos cinemas. E quando chegou, foi um sucesso, um belo público”, completou.

Outro prêmio relevante do festival foi o de melhor documentário. Confirmando o favoritismo, Davi Kapenawa e Luis Bolognesi levaram a estatueta pelo longa A Última Floresta (2022). O documentário já recebeu também premiações internacionais importantes, como em Berlim e Seul. O tema não deixa de fora o tom político. Trata-se de uma obra de resistência dos povos indígenas, castigados durante o governo Bolsonaro por políticas de desmonte da proteção ambiental, incentivos diretos ao garimpo ilegal e à grilagem de terras, entre outros. “É um filme de denúncia e de elogio à cultura indígena. Davi Kopenawa esteve lá e recebeu sua estatueta. Foi aplaudido de pé. Foi muito bonito”, relatou Zanin.

Expectativas de Gramado

Gramado é um dos mais tradicionais e antigos festivais de cinema brasileiro e chega à sua 50ª edição. Após dois anos em formato on-line por causa da pandemia de covid-19, o evento agora volta a ser presencial. “É um acontecimento. Ele vai ser presencial e tem uma novidade interessante. Os ingressos serão gratuitos, em troca de um quilo de alimento que vai ser doado. Muitas pessoas carentes em todas as partes do país, inclusive no Rio Grande do Sul. Também vai ter uma parte on-line, que poderá ser acompanhada pela Globoplay“, comenta Zanin.

O festival tem uma competição brasileira de longas e de curtas-metragens, além de competição de filmes ibero-americanos, e de uma mostra separada de filmes gaúchos. Os prêmios são as famosas estatuetas chamadas “Kikitos”. “É uma maratona ao longo de nove dias. A premiação será transmitida pelo Canal Brasil, da qual eu participo, no dia 20”, antecipa o jornalista. “Teremos atividades de manhã, tarde e noite todos os dias”, comenta.

Assista aos comentários de Zanin abaixo, e confira a programação completa no site do festival