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Criando canções na pandemia: apesar dos problemas, a música não pode parar

Com 45 anos de estrada, guitarrista e compositor conta como é fazer música em tempos sem palco

Reprodução Facebook
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'Já vendi alguns instrumentos, mas estamos aí', diz Toni Costa

São Paulo – Logo que começou a pandemia, Antonio Luiz Silva Brandão Costa, mais conhecido como Toni Costa, guitarrista, arranjador, compositor, sentiu um princípio de pânico. Correu, então, para o instrumento e compôs seu primeiro blues. “Nunca fiz, não sou blueseiro“, diz. Ele também fez a letra, o que não é muito comum. E assim nasceu Não me covid, gravado pelo grupo Humaitá Blues Combo, que tem seu filho Diogo entre os integrantes, além do baterista Charles Gavin, ex-Titãs.

Perto de completar 67 anos, com mais de 45 de estrada, o carioca Toni Costa não sobe ao palco há mais de um ano. Estava ensaiando com a cantora e atriz Emanuelle Araújo, sua parceira no trio Moinho (além da percussionista Lan Lanh), quando a notícia de um vírus passou a circular com insistência. “Começou a pipocar cancelamento, cancelamento…”, lembra, com saudades dos shows com público, da troca de ideias musicais. “Adoro viajar, tocar com músicos diferentes. São 45 anos tocando. O show não é só o show, é a viagem, é o bar depois, a conversa.”

Tem que “botar pra fora”

Mas a música não pode parar. Pelo contrário. Nesse tempo de isolamento, Toni Costa compôs até mais. “Se a gente não compor, não botar pra fora, acho que a cabeça não aguenta”, explica. O compositor lançou dois EPs, de maneira independente e adaptado ao chamado “novo normal”. “Eu aqui e cada um dos meus amigos músicos em suas casas”, conta. Há cinco anos ele mora em Teresópolis, na região serrana do Rio de Janeiro, em uma área mais afastada da cidade. No trabalho mais recente, Toni lançou o single Eu não quero você longe de mim, canção interpretada por Emanuelle, com pegada pop. “É um desabafo de saudade”, define.

Carioca nascido no bairro de Botafogo, com pais piauienses, ele fez carreira acompanhando vários cantores, mas sempre mantendo o seu trabalho autoral, com um LP (Gente da Rua) e quatro CDs. Tocou nas bandas de Moraes Moreira, Caetano Veloso e Elba Ramalho, entre outros. E tem muitas parcerias. Como Vamo Comer (com Caetano), Grito de Guerra (com Moraes e Antônio Risério) e A sorte muda (com Chacal), esta última interpretada por Cássia Eller e incluída em novela global.

Apoio à cultura

Toni também desenvolveu dois projetos com a prefeitura de Teresópolis, por meio da Lei Rouanet. Em um deles, conta histórias de canções em seis capítulos de 20 minutos cada. Para ele, a lei de incentivo à cultura padecia de “vícios” e precisava de ajustes, mas não foi o que aconteceu agora. “Esse governo é contra a cultura. Acham que os artistas são inimigos deles. Esse segmento de arte e cultura gera muita renda. Fomenta a economia, gera renda, está girando a roleta.”

Na última quarta-feira (31), o Senado aprovou o Projeto de Lei (PL) 795, que prorroga o auxílio emergencial para o setor cultural, a chamada Lei Aldir Blanc. Pela proposta, o pagamento aos artistas será estendido pelo mesmo período do auxílio emergencial voltado à população em geral. Agora, o projeto seguiu para votação na Câmara. A maior parte dos recursos disponíveis na primeira fase da lei ainda não foi usada.

Contra a crise

Por enquanto, o palco físico ficou vazio (neste sábado 3, o guitarrista fez uma live com Emanuelle) e a renda despencou. A crise pegou a classe artística em cheio. Não só músicos, lembra Toni, mas técnicos, roadies, todos os profissionais do setor. Muita gente, conta, vendeu instrumentos para se manter minimamente durante a pandemia. Ele mesmo teve que fazer isso. “Vendi dois instrumentos que eram raros e que eu levei muito tempo para comprar. Mas estamos aí.”

Afinal, a sorte muda.