luta antimanicomial

Bloco Tá Pirando, Pirado, Pirou homenageia Dona Ivone Lara

A ideia da homenagem está relacionada com a história da cantora. Ela trabalhou como enfermeira e assistente social em hospitais psiquiátricos de 1947 a 1977

Tânia Rêgo/Agência Brasil

Bloco formado por usuários e profissionais da rede pública de saúde mental do Rio de Janeiro desfila no bairro da Urca

Rio de Janeiro – Desde 2004 levando para as ruas do Rio de Janeiro a bandeira da luta antimanicomial, o bloco Tá Pirando, Pirado, Pirou realizou na tarde de hoje (4) um desfile em homenagem à cantora e compositora Dona Ivone Lara. O cortejo se concentrou às 15h na Avenida Pasteur, no bairro da Urca. De lá, os foliões seguiram até a entrada do Bondinho do Pão de Açúcar.

O Tá Pirando, Pirado, Pirou nasceu a partir de uma articulação feita há 14 anos por trabalhadores do Instituto Philippe Pinel, hospital psiquiátrico do Rio de Janeiro. Entre os acompanhantes do desfile, estão pacientes e profissionais da rede de saúde mental. O cortejo busca desmistificar a ideia de que pessoas com sofrimento mental são perigosas. O objetivo é proporcionar aos pacientes um sentimento de pertença à sociedade, mostrando que o tratamento pode ser conduzido sem que haja um aprisionamento.

A ideia de homenagear Dona Ivone Lara neste ano está relacionada com a história da cantora. Ela trabalhou como enfermeira e assistente social em hospitais psiquiátricos de 1947 a 1977. Nessa trajetória, atuou também no Serviço Nacional de Doenças Mentais juntamente com a doutora Nise da Silveira, uma das principais referências da luta antimanicomial no Brasil.

A música tema Dona Ivone Lara, orgulho brasileiro deu o tom do desfile. “Hoje o Tá Pirando se agiganta e o mundo do samba levanta para homenagear Dona Ivone Lara, nossa diva popular”, diz um dos versos escritos por André Cabral. “É uma maneira de desinstitucionalizar a loucura. O sofrimento existe, às vezes é difícil. Mas ainda assim, existe alegria. Numa tarde como hoje, independentemente dos sofrimentos psíquicos de cada um, estão todos aqui felizes e extrovertidos. Ninguém precisa sofrer todo dia. O bloco é uma iniciativa fantástica de inclusão social”, disse o compositor.

Dona Ivone Lara, também conhecida como a Rainha do Samba, está hoje com 96 anos. Sua carreira artística é marcada pela busca do protagonismo em uma época onde o ambiente do samba era dominado majoritariamente por homens e de difícil inserção para as mulheres. Suas composições, como Sonho meu, Acreditar e Alguém me avisou, ficaram marcadas tanto em sua voz como na de cantores como Maria Bethânia, Gal Costa, Zeca Pagodinho, entre outros.

A homenagem contou ainda com a participação de um convidado especial, o músico André Lara, neto de Dona Ivone Lara. Ele cantou sucessos de sua avó. Outra peculiaridade do desfile deste ano foi a criação de uma ala para crianças, uma iniciativa do Centro de Atenção e Reabilitação à Infância e Mocidade (Carim). A unidade, vinculada à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), atende o público infanto-juvenil, buscando promover a inserção social e criar neles o sentimento de pertencimento à cidade.

Lembrando um verso composto por Dona Ivone Lara, a ala foi denominada Eu vim de lá, eu vim de lá, piquininim. De acordo com a psicóloga Nathália Armony, a iniciativa foi parte de um projeto que envolveu a realização da várias oficinas e atividades com as crianças, os familiares e a própria equipe. “A escola ainda é o grande local de inserção para crianças e adolescentes que tenham questões de saúde mental. Então, quando chegam as férias, é difícil elas estarem na cidade, ocuparem espaços da cidade. Daí veio a ideia de realizarmos várias atividades durante as férias, em museus, na praia, e o carnaval fez parte do projeto”.

A analista de sistemas Mônica Gomes Rodrigues dos Santos aprovou. Ela é mãe de Victor Gomes dos Santos, um dos atendidos pelo Carim. “É uma oportunidade que nós temos de estarmos juntos em um momento de diversão para as crianças. E é um momento em que ele pode socializar com outras pessoas e buscar superar suas dificuldades”.

Outros blocos

Desde sexta-feira (2) até hoje (4), as ruas do Rio de Janeiro foram ocupadas por mais de 115 blocos, que realizaram ensaios ou desfiles. Entre os maiores, estavam o Bloco da Preta, que arrastou cerca de 450 mil pessoas no centro da cidade nesta manhã, e o Simpatia é Quase Amor, que no sábado (3) levou aproximadamente 60 mil foliões para as ruas de Ipanema, na zona sul.

O Bloco da Preta, comandado pela cantora Preta Gil, teve a atriz Carolina Dieckmann como madrinha. A cantora Pablo Vittar também marcou presença como convidada especial. “É um arraso. A Preta Gil representa. Ela abraça a causa gay e toda a comunidade LGBT [Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros]. Ela abraça a todos nós”, disse Iuri Abreu, que veio de São João de Meriti (RJ) fantasiado de minnie [personagem de Walt Disney].

As crianças também puderam se fantasiar e se divertir em sete blocos realizados integralmente para elas. No sábado, desfilaram o Bloco da Mamadeira, o Bloco da Sá Pereira Infantil, o Bloco da Pracinha e o Mini Bloco. Hoje foi a vez do Bailinho do Capitão Trombeta, Gigantes da Lira e do Pipoca e Guaraná.