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Em meio ao desmonte, Cinemateca resiste e exibe filme raro de Carlos Reichenbach

'Amor, Palavra Prostituta' será exibido hoje em nova cópia, fiel ao original de produção que foi retalhada pela censura no país

arquivo inácio araújo

Reichenbach (c) durante as filmagens de ‘Amor, Palavra Prostituta’

São Paulo – A Cinemateca Brasileira resiste ao desmonte das políticas públicas do governo de Michel Temer como pode. Subordinado ao Ministério da Cultura, o órgão tem atrasado salários e paralisou as atividades de restauro de filmes, uma de suas atribuições institucionais. Isso não tem impedido a Cinemateca de continuar organizando mostras importantes como a que está em cartaz desde o dia 9 e que retoma suas sessões a partir desta sexta-feira (18).

Na noite de hoje acontece aquela que pode ser “a última” projeção do filme Amor, Palavra Prostituta, de Carlos Reichenbach.

“Trata-se de um filme razoavelmente raro do Carlão, pois foi retalhado pela censura e, depois do lançamento, o Carlão proibiu a exibição do filme no estado em que estava”, escreveu em seu blog o escritor e crítico de cinema Inácio Araújo, que também trabalhou na redação do roteiro.

O alerta sobre essa derradeira oportunidade de assistir em película a produção de 1982 foi feita no último final de semana, por jovens cineastas, numa das sessões da Mostra “Direitos em Pauta”.

Pode ser a última vez que o filme do Carlão (como o cineasta, morto em 2012, era chamado pelos colegas) será exibido, porque é a única cópia restaurada a partir do original que existe no Brasil”, explica Bruno Risas, ex-trabalhador da Cinemateca e fotógrafo do longa Era o Hotel Cambridge, também na programação da mostra. Segundo Risas, há divergências sobre a conveniência ou não de exibir cópias que podem se danificar durante as projeções.

Ele é um dos jovens que, no final de semana anterior, foi à frente de uma das salas de exibição da Cinemateca para breve debate com a reduzida plateia que compareceu. Além da condenação do golpe – assim por eles chamado – em curso no Brasil, reiteraram a importância daquele espaço público como direito das pessoas à exibição, em tela grande e com tecnologia de ponta, de filmes fora do circuito comercial.

Ficou evidente que, simultaneamente ao descaso governamental, os programadores aproveitam o “esquecimento” para produzir resistência. “A Cinemateca está na mão deles (os golpistas), mas é nossa”, provoca Risas. “Antes de ser um órgão governamental, a Cinemateca foi uma iniciativa de pesquisadores e cinéfilos para preservar e divulgar raridades. Num momento crítico de desmonte, não é hora de baixar a guarda”.

Risas está concluindo a montagem do primeiro longa dirigido por ele, com estreia prevista para o início do ano que vem. Ontem Havia Coisas Estranhas no Céu acompanha o cotidiano da família dele, a partir do momento em que seu pai perde o emprego, em 2012. Gravado em celular e também em câmera profissional, dependendo da disponibilidade do equipamento, o filme tem como ponto ficcional a abdução de sua mãe por um OVNI. Ao retornar à Terra, ela revela que nos outros mundos as coisas não estão muito diferentes.

Em Amor, Palavra Prostituta, atração de hoje da Cinemateca, Carlos Reichenbach narra um final de semana vivido por um casal cujo marido, professor desempregado, vive às custas da mulher, operária da indústria têxtil. Acompanham-nos um técnico de computação e sua namorada ingênua. Ambientado na região do ABCD, em grande parte às margens da Represa Billings, o filme fala de um momento de crise econômica e social, que marcou aquele período em que a ditadura militar se desfazia e o movimento operário se reorganizava.

Gaúcho de Porto Alegre, Carlão se tornaria um dos mais paulistanos cineastas brasileiros. Além de seus longas autorais, também trabalhou para o cinema de propaganda.

Serviço
Amor, Palavra Prostituta, de Carlos Reichenbach – Hoje, 20h15, com entrada grátis. Endereço: Largo Sen. Raul Cardoso, 207 – Vila Clementino, São Paulo – SP; telefone: (11) 3512-6111.

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