Cinema

Em ‘O que Está por Vir’, mulher de meia idade redescobre liberdade total

Filme de Mia Hansen-Løve com Isabelle Huppert aborda a necessidade de se reiventar depois do fim de um longo casamento. Drama francês estreia nesta quinta-feira (22) no Brasil

Divulgação

Sem vitimização: Nathalie toma o curso de sua vida nas mãos e, mesmo sofrendo, supera as adversidades

A vida de Nathalie Chazeaux (Isabelle Huppert) parece quase perfeita: professora de Filosofia em um liceu em Paris, ela sente um imenso prazer em dividir seu conhecimento e incentivar seus jovens alunos a pensar por si próprios; sua vida intelectual é muito fértil; e seu casamento com o filósofo e tradutor Heinz (André Marcon) já dura 25 anos. Ela é uma mulher linda, madura, inteligente e ativa. Tudo parece em equilíbrio até que a vida dá um golpe surpresa e vira tudo de cabeça para baixo.

Filme sobre mulheres feito por uma mulher, O que Está por Vir, da diretora francesa Mia Hansen-Løve, estreia nesta quinta-feira (22) nos cinemas brasileiros. Trata-se de uma história sobre recomeços e sobre a dificuldade e a beleza de reiventar-se. O papel brilhantemente interpretado por Isabelle Huppert é forte, de uma mulher segura de si que divide seu tempo entre os alunos de Filosofia, seus livros, o trabalho para uma editora, o cuidado com a mãe idosa e depressiva (Édith Scob), sua casa, seu marido e os dois filhos.

De uma hora para outra, tudo começa a desmoronar: ela descobre que seu marido vai deixá-la para viver com uma mulher mais jovem, sua mãe morre, ela perde o emprego na editora e os filhos saem de casa. De repente, solidão e questionamentos. Mas Mia Hansen-Løve não deixa espaço para vítimas ou vilões. Nathalie toma o curso de sua vida nas mãos e, apesar de sofrer, supera os próprios medos.

A protagonista acaba percebendo o quanto mudou nos últimos 25 anos. Uma das cenas que evidenciam tais mudanças é quando ela ignora a greve dos estudantes por melhores condições de educação e contra as mudanças no regime previdenciário propostas pelo então presidente Sarkozy. Comunista durante a década de 1960, hoje ela já não quer saber de política ou protestos.

Mas esta juventude que ela considera “radical” está impregnada em seu ex-aluno preferido, Fabien (Roman Kolinka), um filósofo belo e brilhante com quem trabalha e divide suas inquietações pessoais. O fato de ele ter tomado caminhos distintos na filosofia e na vida alegra e entristece Nathalie ao mesmo tempo. Talvez ela reconheça nele os sonhos e a febre juvenil que tinha no passado e que a vida burguesa tratou de congelar.

Calma e segura, ela conta à Fabien que está se divorciando de Heinz: “Não se preocupe. Estou levando numa boa (…) Não é tão sério assim, minha vida não acabou. No fundo, já estava preparada. Não precisa ter pena de mim. Além do mais, tenho sorte por ser intelectualmente bem resolvida e isso basta para eu ser feliz”, afirma, mesmo que hora ou outra ela chore sozinha, machucada pela solidão.

Para refletir sobre a felicidade, Nathalie cita o filósofo Jean Jacques Rousseau em uma de suas aulas: “Conquanto o desejemos, podemos viver sem a felicidade. Esperamos para conquistá-la. Se a felicidade não vem, a esperança se prolonga e o charme da ilusão dura o mesmo tempo que a paixão que a causa. Assim, esse estado basta a si mesmo e a inquietude que ele traz é uma espécie de alegria que suplanta a realidade, talvez melhorando-a. Pena de quem não tem nada a desejar. Ele perde tudo aquilo que possui. Gostamos menos daquilo que obtemos do que daquilo que desejamos e ficamos felizes antes de realmente nos tornarmos”.

Em uma das cenas mais tocantes do longa, Nathalie nos dá a impressão de que o divórcio e todas as mudanças recentes fizeram com que ela voltasse a se encontrar com ela mesma: “Quando eu paro para pensar, meus filhos já saíram de casa, meu marido me abandonou, minha mãe morreu… Encontrei minha liberdade. Uma liberdade completa como nunca conheci. É incrível”, diz, ao som engajado do folk de Woody Guthrie.

O que Está por Vir não é um filme filosófico, muito menos pesado, ao contrário. Trata com leveza temas que são comuns na vida da maioria das pessoas: o envelhecimento, o caos trazido por mudanças inesperadas, a necessidade de se adaptar, a solidão da meia-idade… Tudo isso, à partir de uma visão feminina e um tanto feminista. Não é à toa que o quinto longa-metragem de Mia Hansen-Løve foi premiado com o Urso de Prata de Melhor Direção no 66º Festival de Berlim.

O QUE ESTÁ POR VIR_trailer (lançamento Brasil) from Zeta Filmes on Vimeo.

O que Está por Vir
Direção: Mia Hansen-Løve
Roteiro: Mia Hansen-Løve
Direção de fotografia: Denis Lenoir
Montagem: Marion Monnier
Música: Raphael Hamburger
Produção: Charles Gillibert
Distribuição: Zeta Filmes
País: França
Ano: 2016
Duração: 102 minutos
Classificação: 14 anos

Leia também

Últimas notícias