São Paulo

Eventos promovem feminismo negro com rodas de samba e de conversa

'Empoderadas do Samba' ocupa espaço ainda prioritariamente masculino e reúne nos quatro cantos da cidade pesquisadoras, comunicadoras e ativistas pelo empoderamento da mulher negra

Divulgação

‘Nossa proposta é ampliar as discussões sobre feminismo interseccional em todos os espaços possíveis: no samba, na política ou na fila do pão’

“O samba é uma das nossas resistências”, afirma Renata Martins, cineasta e idealizadora do projetoEmpoderadas do Samba, que começa neste domingo, 30 de outubro e leva às quatro regiões de São Paulo, até 3 de dezembro, atividades públicas que promovem diálogos e reflexões sobre a mulher no samba paulista e o feminismo negro.

O projeto que nasce no ano em que o samba comemora o seu centenário é resultado do encontro entre o Samba Sampa, criado pela jornalista Maitê Freitas, e a web-série Empoderadas, de Renata Martins. “Um dia, numa conversa, pensamos que podíamos unir os dois projetos: o Samba Sampa que é um projeto multimídia que tem as rodas de samba paulistas, suas histórias, personagens, poéticas e liturgias como foco, com o Empoderadas, que é um projeto que visa o protagonismo da mulher negra através da produção, difusão e realização audiovisual. Unimos o que os projetos têm em comum: a criação de espaços para se pensar o protagonismo da população negra brasileira, seja por meio das manifestações culturais, seja por meio das histórias e ativismo de mulheres negras e indígenas”, afirma Maitê.

Serão quatro encontros que contarão com intervenções e discussões sobre o feminismo nas rodas de samba, onde a presença masculina ainda é majoritária. A intensão é promover encontros entre mulheres negras que protagonizam o samba em suas vidas acadêmica, profissional e/ou artística. Chamadas de “Samba-Conversação”, as atividades também reúnem sambistas, sejam elas pesquisadoras, musicistas e/ou cantoras negras nas rodas temáticas.

“Num país cuja estrutura social e histórica são pautadas pelo racismo e extermínio da população negra, ao longo da história, esta população criou formas de existir e resistir. O samba é uma das nossas resistências. A roda é um dos espaços onde manifestamos nossas liturgias, nossas poesias e o nosso convívio. No entanto, além de vivermos num país racista, o machismo e a machocracia, que estruturam as relações sociais no Brasil, assolam a população feminina negra”, afirma Maitê Freitas.

Para as organizadoras, o país vive um tempo em que é necessário se falar do racismo, do machismo e se buscarem meios de produzir novas narrativas frente às hegemonias e opressões cotidianas. “Neste sentido, a roda torna-se o nosso espaço de provocação e reflexão sobre a importância e resistência dessas mulheres diante de espaços muitas vezes hostil e que a presença das mulheres, sobretudo as negras – como cantoras, compositoras ou instrumentistas – é bem-vinda, ao mesmo tempo em que o corpo delas povoa o imaginário machista, racista e sexista vigente”, afirma Renata Martins.

Samba-conversação

Neste domingo (30), o projeto reúne a jornalista e pesquisadora Claudinha Alexandre e a cantora Ericah Azeviche, que falam na roda Axé de langa sobre a espiritualidade e o feminino nas rodas de samba e refletem sobre os aspectos litúrgicos e sagrados presentes na tradição do samba, a preservação da ritualística e da memória através da presença feminina.

No dia 8 de novembro, a pesquisadora Kelly Adriano e cantora Roberta Oliveira se encontram no Samba do Congo, na Casa de Cultura da Brasilândia, para falar sobre suas memórias nas rodas de samba em São Paulo e os aspectos da memória e da identidade. Na terça-feira, 21 de novembro, o Samba da Vela recebe o Empoderadas do Samba com o tema “Sereia Guiomar: a representação feminina e o corpo feminino no samba”, com a participação da performer Val Souza e da ritmista e socióloga Verônica Borges.

O projeto se encerra no dia 3 de dezembro, no Samba das Pretas, roda idealizada e composta integralmente por mulheres negras, na Cidade Tiradentes, na zona leste da capital. Com o tema “Das coisas que mamãe me ensinou: feminismo, samba e interseccionalidade”, o evento tem participação da pesquisadora Jaqueline Lima e de Djamila Ribeiro, filósofa e secretária adjunta dos Direitos Humanos do município.

“Ainda que tenhamos um legado deixado por Tia Ciata, Jovelina Pérola Negra, Clementina de Jesus, defendido e honrado por Leci Brandão, Tereza Cristina, Dona Iná, Mariene de Castro, Tia Cida, Roberta Oliveira, Samba Delas, Adriana Moreira, Fabiana Cozza, entre tantas, são poucas as mulheres que se mantêm visíveis e resistentes no universo do samba e na indústria fonográfica e cultural brasileira”, observa Renata Martins. “A maior compositora da música popular brasileira é uma mulher negra e sambista: dona Ivone Lara, e pouco se fala sobre isso. Ao longo da história, o que vemos é a mulher negra sendo invisibilizada na história e na sua produção poética, política e social. Mais do que dar respostas, nossa proposta é provocar questões no público presente, assim como, ampliar as discussões sobre feminismo interseccional em todos os espaços possíveis: seja no samba, seja na política ou na fila do pão”, completa Renata.

Realizado com o patrocínio do Programa de Valorização à Iniciativas Culturais (VAI) da Secretaria Municipal de Cultura, o Empoderadas do Sambaé composto por uma equipe de mulheres negras de diferentes regiões de São Paulo. Além das rodas de Samba-Conversação, o projeto também deve resultar em documentários sobre as mulheres e os grupos femininos que protagonizam e fazem resistência no samba de São Paulo, com exibição prevista no primeiro trimestre de 2017 na web-série Empoderadas.

Todos os encontros são gratuitos e abertos para o público em geral.

Empoderadas do Samba
Roda 1 – Axé de langa: A espiritualidade e o feminino nas rodas de samba
Quando: domingo, dia 30 de outubro, das 15h às 17h
Onde: Kolombolo Diá Piratininga
Praça Aprendiz das Letras, Rua Belmiro Braga, s/n

Roda 2 – Samba, minha raiz: o samba, a roda e a cidade como espaços de pertencimento e afetividade
Quando: terça-feira, dia 8 de novembro, das 18h às 20h
Onde: Samba do Congo, na Casa de Cultura Brasilândia
Praça Benedita Cavalheiro, s/n, Brasilândia

Roda 3 – Sereia Guiomar: a representação feminina e o corpo feminino no samba
Quando: segunda-feira, dia 21 de novembro, das 18h às 20h
Onde: Samba da Vela, na Casa de Cultura de Santo Amaro
Praça Dr. Francisco Ferreira Lopes, 434, Santo Amaro

Roda 4 – Das coisas que mamãe me ensinou: feminismo, samba e interseccionalidade
Quando: sábado, dia 3 de dezembro, das 20h às 22h
Onde: Samba das Pretas, na Cidade Tiradentes
Point da Naná, na Avenida dos Têxteis, 668, Cidade Tiradentes

Quanto: grátis

Acompanhe outras ações do Empoderadas do Samba, como o projeto Gritem-me Negra, no Sesc