Mudanças no programa VAI devem ampliar iniciativa cultural na periferia de São Paulo

Em 10 anos programa municipal já financiou mais de mil projetos. Agora, há mais recursos e mais tempo de incentivo público a iniciativas, com novo edital em dezembro

CC / A Banca – Produtora Cultural Social

Projetos culturais promovem soberania das comunidades da periferia paulistana e podem ter novo impulso com o VAI 2

São Paulo – Criado há dez anos, o Programa de Valorização de Iniciativas Culturais (VAI) em São Paulo terá novo edital em dezembro, ampliado por mudanças recém-aprovadas pela Câmara Municipal. A partir de agora, o projeto da prefeitura terá dois tipos de fomento.

Um voltado para iniciantes, que terão acesso a até R$ 30 mil, nos mesmos moldes do atual, e outro para grupos que tenham mais de dois anos de experiência comprovada, e que poderão acessar até R$ 60 mil. A expectativa de ativistas e produtores culturais é de que as mudanças consolidem a “primavera periférica” que tem afirmado a cada dia uma estética política e social.

Até sofrer mudanças, na última quarta-feira, o VAI encaminhava R$ 24 mil para cada proposta aprovada. As alterações promovidas pelo vereador Nabil Bonduki (PT) são consideradas fundamentais para atender a grupos que, depois de dar os primeiros passos com ajuda do programa, não conseguem acesso a outras fontes de financiamento público.

“O VAI, sem dúvida, é o mais bem executado programa de apoio à cultura popular, comunitária, negra e periférica do país. Ele teve – e deverá ter cada vez mais com o VAI 2 – uma importância crucial no fomento direto, sem grandes burocracias, à produção cultural autônoma dos coletivos de artistas, contribuindo bastante para ampliar, aprofundar e qualificar essa produção recente, hoje amplamente reconhecida no país afora e mesmo no mundo”, avalia Danilo Dara, que participou, entre outros, da proposta “Cine Bijou – Cinema e Memória”, projeto que pretendia resgatar a memória do próprio cinema, um espaço de resistência à ditadura (1964-85). O projeto foi contemplado com o VAI em 2011 e, mesmo após o fim dos recursos do programa, continua a pleno vapor.

Apenas este ano, 176 projetos foram selecionados entre grupos de dança, coletivos de midiativismo, saraus, grupos de grafite, escritores e cantores, entre outros, mas quase mil se candidataram.

Para o coordenador do programa, Renato Almeida, o VAI se diferencia pela própria concepção que se faz do jovem e da periferia. “O jovem historicamente no Brasil é visto como um problema social, algo que perturba a ordem. E aí as políticas estão sempre no âmbito do controle, da tutela. Mas o programa parte da premissa que os jovens precisam de autonomia”, explica. “Quando esse jovem é da periferia, então, isso se intensifica ainda mais. E o VAI é voltado para ele. Reconhece a produção dele. Não é o Estado levando cultura para ele, mas o Estado fomentando o que ele já desenvolve. O Estado reconhecendo que ele é um sujeito de direito”, detalha Almeida.

“O programa sempre teve uma preocupação que não é só cultural, mas é territorial e de classe. Por isso é extremamente importante”, avalia Rafael Mesquita, um dos coordenadores da Agência Cultural Solano Trindade, que surgiu no Campo Limpo, extremo sul de São Paulo, com o fomento do VAI e agora ajuda a dar visibilidade a outros projetos contemplados.

No VAI 1, cada grupo só pode ser beneficiado pelos recursos duas vezes. No VAI 2, essa trava não existe, assim como a que limitava a idade máxima dos proponentes a 29 anos. “Isso é um ganho considerável porque em algumas regiões em que há pouco movimento cultural, os que existem passavam a não receber”, explica Vitor Hugo da Silva Ramos, da Pastoral da Juventude.

“O exemplo do Programa VAI 1, e agora do Programa VAI 2, deveria ser seguido, fortalecido e ampliado para outros municípios, estados e para o próprio nível federal. É preciso se pensar em políticas ainda mais profundas, como a Lei de Fomento à Produção Cultural Periférica, nos moldes da Lei de Fomento ao Teatro e à Dança, para efetivar a democratização das políticas culturais, que ainda hoje seguem priorizando muito mais a produção artística mais elitizada – como o alto mercado editorial, a grande indústria do cinema, os grandes shows e concertos eruditos”, enfatiza Dara.

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