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Estudo

Os taninos do vinho no combate à covid-19

Estudo de pesquisadores chineses sugere que o ácido tânico, muito presente no vinho, especialmente nos tintos, pode ajudar a reduzir infecção por covid

Pixabay
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São Paulo – Um estudo conduzido por pesquisadores chineses sugeriu que os taninos, substância muito presente no vinho, tintos principalmente, pode ajudar a reduzir a infecção por covid-19. Publicado no prestigioso American Journal of Cancer, em dezembro, o trabalho produzido na China Medical University mostrou que o ácido tânico tem funções inibidoras duplas de bloqueio de serino-proteases virais e celulares críticas para a infecção viral.

Mas se o leitor boiou, não se desespere. Para ajudar na tarefa de tornar o estudo mais palatável (leia aqui a pesquisa na íntegra), a coluna ouviu o cardiologista gaúcho Jairo Monson Filho, estudioso e grande entusiasta de vinho – e que já falou aqui sobre as conexões da bebida com a saúde.

O que é um vírus

Para começar, é preciso entender o que é um vírus. Segundo Monson, os vírus são micro-organismos muito simples, constituídos por “um núcleo de ácidos nucleicos (material genético) envolvidos por uma capa formada por proteínas”. Em tese, os vírus são micro-organismos sem vida. Melhor dizendo, para ter vida eles precisam entrar numa célula. A partir daí, eles se reproduzem e causam doenças, mas o objetivo deles, pura e tão somente, é garantir a sobrevivência da espécie. O coronavírus, por sua vez, é um vírus conhecido há mais de 50 anos, que provoca infecções respiratórias em humanos e animais. O vírus Sars-Cov-2 é o responsável pela covid-19.

Taninos, o que são?

O ácido tânico é um polifenol da classe dos taninos, presente em quantidade significativa nos vinhos, com alguns efeitos conhecidos sobre a saúde humana. Segundo o cardiologista, eles são responsáveis por dar estrutura ao vinho e, por estarem presentes na casca da uva em maior quantidade, os vinhos tintos são os que mais têm taninos. Essas substâncias são responsáveis pela sensação de adstringência quando tomamos vinho. Quando não estão maduros, podem conferir amargor à bebida.  

Protease

Um nome comprido que sempre aparece quando o assunto é covid é o da protease transmembrana serina 2 da superfície celular (TMPRSS2). Trata-se da proteína existente na membrana celular, e que tem uma afinidade química com uma das proteínas do Sars-Cov-2, segundo Monson. Ele explica: “Quando a proteína do vírus se liga à TMPRSS2 na parede da célula, o vírus tem acesso liberado para o interior dela e, desse modo, se reproduz e pode causar a doença”.

O estudo

Bem, explicamos os conceitos anteriores para ficar um pouco mais fácil de entender em que ponto o estudo chinês quis chegar. Em laboratório (veja bem, em laboratório, não em humanos), os pesquisadores descobriram que o ácido tânico se liga com facilidade à TMPRSS2. Assim, ele impediria a entrada do Sars-Cov-2 na célula. Mas, como Jairo Monson salientou, o estudo apenas “sugere, não demonstra”, que essa barreira formada pelo ácido tânico, os taninos do vinho, coibiria o desenvolvimento da covid-19.

“Outras substâncias que também se ligam à TMPRSS2, como o Remdesivir (um medicamento antiviral), em estudos clínicos, não mostraram melhora significativa da covid-19”, pontuou o médico. “Os achados de laboratório muitas vezes não se reproduzem em humanos, que são máquinas biológicas muito complexas. A relação do ácido tânico com a covid-19 ainda é uma questão em aberto.” Na opinião dele, mais estudos são necessários para que se possa dizer, de fato, que a ingestão de ácido tânico (ou melhor, vinho) protege contra a covid-19.

Outros estudos

Não é de hoje que a ciência tenta comprovar que o vinho faz bem à saúde e pode ajudar a combater doenças. O cardiologista lembrou que estudos anteriores já demonstraram que outros polifenóis existentes no vinho, como as catequinas, as procianidinas, a quercitina e o resveratrol também são capazes de impedir que alguns vírus entrem na célula, provocando doenças.

“O ácido tânico está presente no vinho, mas a gente sabe que, nessa bebida, quase tudo é diferente. O próprio ácido tânico é um exemplo. Sozinho, ele é intragável e danoso. É utilizado para curtir couro! No entanto, no vinho, ele é responsável por uma série de atributos. E isso é mágico! É difícil entender por que no vinho ele é tão diferente”, conjecturou.

Realmente eficaz

Em suma: vinho é bom, é ótimo, é excelente e muitos de nós amamos. Mas a pesquisa sobre a capacidade dos taninos do vinho no combate à covid-19 não nos dá licença para encher a cara. Muito menos abandonarmos a máscara e fazermos aglomerações por aí.

Por ora, distanciamento social, o uso responsável da máscara e a vacina são os únicos preventivos comprovadamente eficazes que temos.


Adriana Cardoso é jornalista com mais de 20 anos de estrada, além de enóloga formada pelo Instituto Federal de Ciência, Educação e Tecnologia de São Paulo, campus São Roque. Fez estágio na Villa Francioni, vinícola localizada na região conhecida como Vinhos de Altitude, na Serra Catarinense, e hoje aventura-se a escrever e falar sobre vinhos, além de dar consultoria em comunicação para vinícolas e outros negócios do vinho. Acompanhe também o podcast Taninos e Afins nas plataformas Anchor, Breakers, Google Podcasts, Pocket Casts, RadioPublic e Spotify.