Crise Hídrica

Sabesp adia obra ‘de reforço’ para a Billings. Especialistas contestam

Sem transpor água do Rio Pequeno e com retirada iniciada ontem, Rio Grande pode secar em seis meses. 'Enquanto tiver o que secar, eles vão secar'

Andris Bovo/ABCD Maior

Vazamento nos dutos forçou o adiamento da inauguração da obra para o fim da tarde ontem em Rio Grande da Serra

ABCD Maior – De acordo com o presidente da Sabesp, Jerson Kelman, uma obra do Rio Pequeno, braço da represa Billings que será usado para reforçar e evitar a seca do braço Rio Grande, deixou de ser tratada pela empresa como uma intervenção emergencial. A afirmação foi feita ontem (30) em Rio Grande da Serra – região do Grande ABC paulista. Também ontem, o manancial responsável pelo abastecimento de São Bernardo, Diadema e de Santo André passou a contribuir com 4 mil litros de água por segundo para socorrer o sistema Alto Tietê.

“A obra do Rio Pequeno não é necessária agora, porque o Rio Grande tem muita água armazenada”, afirmou Kelman. O presidente da Sabesp ainda assegurou que os moradores do ABC atendidos pela Estação de Tratamento de Água Rio Grande não ficarão sem água. “São 90 bilhões de litros de água, o que é suficiente para abastecer o Alto Tietê e não deixar o ABC sem água. Pelo menos, por ora”, argumentou. A obra de interligação do Rio Pequeno com o Rio Grande, realizada em São Bernardo, não tem data para ser entregue.

Conforme especialistas ouvidos pelo ABCD Maior, o braço Rio Grande tem capacidade de armazenar 112 bilhões de litros de água, mas ontem operava com nível de 85 bilhões de litros. Pelas estimativas, o reservatório tem capacidade de recarga apenas para os 5,5 metros cúbicos por segundo que já são captados na estação de tratamento que abastece parte do ABC e 250 mil pessoas dos bairros Americanópolis e Pedreira, no extremo sul da capital paulista. Sem um reforço, o braço Rio Grande pode secar em seis meses, avaliam.

Seca

“A política estadual não é criar um equilíbrio, mas sim secar o que tiver pela frente”, acusou Hamilton Rocha, integrante do coletivo Luta pela Água. O receio dos ambientalistas é que aconteça com o braço Rio Grande o mesmo que ocorreu com os sistemas Cantareira e Alto Tietê.

“Um foi secando após o outro e o estado não está preocupado com isso. Enquanto tiver o que secar, eles vão secar”, completou Rocha. Para ele, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) e a Sabesp ainda apostam nas chuvas. “Eles acreditam que a chuva do próximo período vai remediar a situação e em paralelo a isso o rodízio disfarçado segue velado”, destacou.

Interligação

Conforme as placas de sinalização das obras, os serviços para transpor as águas do Rio Pequeno para o Rio Grande, no trecho de São Bernardo, foram iniciados em 6 de julho e podem levar 180 dias para ser finalizados. A interligação é feita por canal e túneis: um que passa sob a estrada Ribeirão Pires e outro que passará embaixo do km 35,8 da rodovia Índio Tibiriçá. Atualmente, os trabalhos estão centrados nos túneis. No trecho que passará por baixo da rodovia já havia dois túneis, mas um terceiro está sendo escavado para aumentar a vazão da água.

Quando a obra estiver pronta, outra preocupação dos especialistas está na capacidade de recarga do Rio Pequeno, que seria de apenas dois metros cúbicos por segundo, de modo que a Sabesp teria de continuar a puxar os outros dois metros cúbicos do braço Rio Grande ou da parte central da Billings, uma vez que o braço Rio Pequeno possui uma interligação direta com a parte mais poluída da represa do ABCD.

Outra obra

Ainda na tarde de ontem, o governador Geraldo Alckmin esteve no município de Rio Grande da Serra, onde deu início à transposição das águas do braço Rio Grande, na represa Billings, para a represa Taiaçupeba, do sistema Alto Tietê. O evento, que seria realizado pela manhã, precisou ser adiado devido a vazamentos e problemas técnicos detectados em alguns pontos dos nove quilômetros de dutos que interligam os dois sistemas.

O problema mais grave ocorreu na altura da avenida Guilherme Monteiro Pinto, em Rio Grande da Serra, onde equipes da Sabesp trabalharam desde as 6h da manhã para conter um vazamento submerso. Mergulhadores e um guindaste foram usados na operação. “Este é o início das fases de testes, então é comum aparecerem problemas, mas estamos corrigindo tudo”, justificou o superintendente de Gestão de Empreendimentos da Diretoria Metropolitana da Sabesp, Guilherme Paixão.

Desde o início da obra, de R$ 130 milhões, é cercada de problemas e com licenças ambientais a “toque de caixa”. A falta de EIA/Rima (Estudo e Relatório de Impacto Ambiental) é criticada por ambientalistas e virou alvo de investigação pelo Ministério Público. Além disso, ocorreram vários danos ambientais, entre eles o aterro de parte da represa e a morte de capivaras em Rio Grande da Serra.