Aliados de Kassab na Câmara criticam mudança de Haddad na inspeção veicular

Defensores do modelo atual apresentaram diversos questionamentos ao Projeto de Lei 24/2013, que estabelece um novo modelo para a inspeção veicular na capital

Enquanto Police Neto pede a retirada do projeto de Haddad, o secretário Massonetto critica o modelo que dá monopólio à Controlar (Foto: Joel Silva/Arquivo Folhapress)

São Paulo – A primeira audiência pública sobre o Projeto de Lei 24, de 2013, que dispõe sobre a inspeção veicular e o Plano de Controle de Poluição Veicular (PCPV) ficou polarizada entre partidários do modelo da gestão Gilberto Kassab (PSD) e os representantes do prefeito Fernando Haddad (PT). Entre os temas que provocaram maior discordância estão a periodicidade da inspeção e o credenciamento de estabelecimentos para realizá-la.

Convidado ao debate promovido pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Vereadores, o ex-diretor da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) Alfred Schwarz afirmou que credenciar mais estabelecimentos para prestar o serviço é caminho aberto para fraudes. “Inspeção em oficina é o mesmo que deixar a raposa cuidando do galinheiro. Como vai ser fiscalizado um grande número de estabelecimentos, se com apenas um a prefeitura já teve dificuldade? O sistema funciona. Se algo deve mudar no contrato, que se mude somente isso”, salientou.

O secretário municipal de Negócios Jurídicos, Luis Fernando Massonetto, contrapôs-se afirmando que, da mesma forma que é possível fiscalizar um estabelecimento, é possível fiscalizar vários. “Temos hoje cerca de 250 estabelecimentos cadastrados que já realizam a pré-inspeção veicular, com equipamentos equivalentes aos da Controlar. São 150 que atuam em veículos a álcool e gasolina e cem que atuam com diesel. A rede credenciada será regulamentada e teremos salvaguardas para a prefeitura acompanhar a prestação do serviço e evitar fraudes”, explicou.

O contrato que a gestão Kassab estabeleceu com a Controlar é alvo de diversas investigações do Ministério Público (MP). Em uma delas a Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público de São Paulo identificou um prejuízo de R$ 1,1 bilhão aos cofres públicos e aos donos de carros registrados em São Paulo. Em outro caso, o MP chegou a pedir o afastamento de Kassab e do então secretário do Verde e do Meio Ambiente, Eduardo Jorge, por improbidade administrativa, em razão de diversas ilegalidades existentes no contrato.

O ex-presidente da Câmara durante parte do mandato de Gilberto Kassab, vereador José Police Neto (PSD), criticou o projeto, afirmando que o prefeito age como se a cidade tivesse nascido no dia 1º de janeiro. “O projeto propõe criar um plano de controle da poluição veicular, mas já existe um plano elaborado em 2011. O governo está agindo como se não tivesse havido planejamento anterior. Se a questão principal é o contrato, então vamos rever o contrato. Mas, vendo isso, creio que o mais coerente nesse momento é que o Executivo retire a proposta apresentada e faça outra, tomando como base o projeto existente”, criticou.

Massonetto rebateu a ideia de reelaboração do projeto, afirmando que as questões elencadas por Police Neto não são pertinentes. “Não há nenhuma possibilidade de isso acontecer. O projeto foi feito levando em consideração todo o sistema que marca a legislação ambiental, de modo que cabe à Câmara aperfeiçoar o projeto. Mas de maneira alguma o Executivo pensa em refazê-lo”, explicou.

O vereador Ricardo Trípoli (PV), que chegou a ser indicado a Haddad como secretário do Verde e do Meio Ambiente, propôs que seja realizada uma nova audiência pública para esclarecer alguns pontos do projeto. “É preciso ouvir especialistas técnicos, para que se exponha com mais clareza as questões do novo projeto relativas à periodicidade das inspeções e o impacto disso. Devemos fazer isso antes da segunda votação da Câmara sobre o PL”, ponderou. No texto, a definição da periodicidade ficaria a critério de um instituto técnico, que ainda não foi definido.

O secretário do Verde e Meio Ambiente, Ricardo Teixeira, disse que aguarda parecer da procuradoria do município para definir como será a contratação para realizar o estudo. “Neste primeiro momento estou esperando que a procuradoria defina se podemos contratar por dispensa de licitação, por notório saber, o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). Ainda não há definição. Também conversamos com a Fundação Getúlio Vargas. No momento não há prazo. Esperamos que até o projeto ser votado, sancionado e validado, tenha dado o tempo de contratar a empresa. Agora, se a Câmara parar a tramitação por conta disso, eu não posso fazer nada”, ponderou.

Até mesmo a ex-vereadora e candidata derrotada à prefeitura de São Paulo na última eleição, Soninha Francine, dedicou o início da tarde para participar da audiência. Ela defendeu o modelo proposto por Kassab e afirmou que, como se trata de uma portaria, as regras da inspeção veicular podem ser alteradas diretamente pela Secretaria do Verde e do Meio Ambiente, sem a necessidade de o governo municipal propor a aprovação de um projeto de lei. Os secretários não comentaram as colocações de Soninha.

Mudança de promessa

Uma das questões que foi alterada em relação à promessa de campanha de Fernando Haddad é a isenção da taxa de inspeção, atualmente em R$ 44. Haddad prometeu que acabaria com a taxa, mas voltou atrás e decidiu que a prefeitura fará o reembolso do valor aos veículos que forem aprovados na inspeção, mantendo a cobrança somente dos reprovados. Para tanto, o proprietário do veículo aprovado deverá entrar com contato com a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente e solicitar o reembolso.

Em sua exposição Massonetto destacou o problema dos veículos que migram seu licenciamento para outros municípios e cobrou atitudes do governo Alckmin. “Por conta da forma como é realizada a inspeção veicular, muito proprietários licenciam seus veículos fora da capital. Isso representou uma perda da ordem de R$ 300 milhões em tributos no período 2009-2012. Queremos que o governo estadual estabeleça a inspeção veicular em todo estado, para incluirmos a região metropolitana, além de efetivar a fiscalização sobre os veículos que não estão licenciados”, disse.

De acordo com o secretário, cerca de dois milhões de veículos estão com o licenciamento irregular e desse modo fogem da fiscalização e da inspeção. No entanto, a Polícia Militar não efetua a fiscalização alegando que não tem onde depositar os carros apreendidos. “É preciso harmonizar o sistema, relacionando o plano municipal e o estadual de combate à poluição veicular. A situação atual esta onerando demais a capital, enquanto o governo estadual silencia sobre a legislação ambiental”, explicou Massonetto. O PL 1187, de 2009, de autoria do governo estadual, que institui a inspeção veicular no âmbito do estado de São Paulo, está parado na Casa há quase quatro anos.