Prefeitura de SP constrói parque em área com acesso privilegiado para condomínio

Moradores do Campo Limpo, na zona sul de São Paulo, reclamam que para acessar Horto do Ipê e rua pública têm de passar por portaria de conjunto residencial de classe média

Presença de portaria de condomínio intimida moradores da região a frequentar áreas públicas (Fotos: ©Victor Herege)

São Paulo – Nada convidativa. Assim pode ser definida a visita à rua Francisco da Cruz Mellão, no Campo Limpo, zona sul de São Paulo.  A rua contorna uma série de condomínios de prédios e casas e abriga um centro comercial e serviços públicos, como pontos de parada de linhas de ônibus. 

No entanto, para ter acesso à rua é preciso passar pela portaria do conjunto residencial, equipada com uma cancela.  Um parque municipal está sendo construído em uma faixa de área verde que fica além dessa portaria, isolado da estrada do Campo Limpo, uma das mais importantes vias da região, por uma grade, e aberto apenas para a rua Mellão. Somente a implantação de calçadas e de gradil está orçada em R$ 540.588,33. Moradores da região reclamam que, apesar de não serem impedidos de entrar no local, a presença da portaria intimida a população, em geral pobre, de circular pela área do condomínio de classe média.

"Vou fazer o quê lá? Com certeza, se eu for, vão querer saber o que vou fazer", prevê o lavador de carro Cesário Almeida, 46.

“É pública, mas eu não fico andando aí dentro. Vou fazer o quê lá? Com certeza, se eu for, vão querer saber o que vou fazer, já que não sou morador”, explica o lavador de carros Cesário de Almeida, de 46 anos. “Agora, se tiver um parque, eu vou ver se tem fundamento entrar”, cogita.

O parque Horto do Ipê é um dos 100 prometidos para a cidade pela gestão de Gilberto Kassab. Para a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente, parte do parque já está pronta e sendo utilizada pela população, mas vizinhos da área entrevistados pela reportagem da Rede Brasil Atual enxergam apenas um projeto a ser realizado. 

“Prometeram que iam fazer um parque aqui nesse mato, que não era para a gente limpar nem invadir porque iam fazer”, explica R. A., moradora da favela Vale da Virtude, que não quis se identificar com medo de represárias. R. se refere o tempo todo à rua Francisco da Cruz Mellão como se ela pertencesse ao condomínio e se queixa que, no trecho perto de sua casa, onde na outra margem estão sendo erguidos novos empreendimentos, não existe iluminação pública. “Fica muito perigoso andar de noite. A gente não pode cobrar porque aqui pertence ao condomínio e eles dizem que o povo da favela não tem de ter acesso aqui. Queriam até passar um muro”, afirma, sem nenhuma dúvida de que toda a área é privada. Em outros pontos da rua, onde já existem prédios, há postes de iluminação pública. 

“O condomínio é aberto”, afirma Alberto dos Santos, de 51 anos, morador de uma das torres. “A portaria serve para identificar ou interromper algum imprevisto, um roubo, um estupro ou conter invasores. Porque aqui nós estamos cercados de comunidades”, explica. “O condomínio não pode ser fechado porque se não ele se torna um condomínio particular e toda a infraestrutura pública de varrição, iluminação, asfalto, coleta de lixo, tudo isso, passa a ser responsabilidade de quem interrompe a passagem dos demais”. Mas o próprio Santos diz que não ultrapassaria a portaria que dá acesso à rua pública e ao parque se não fosse morador, porque a cancela dá a impressão de que o condomínio é fechado. 

Orçado em mais de R$ 540,5 parque é separado da principal via da região por grade

A secretaria do verde não respondeu se a implantação da portaria é regular. Apenas informou que o projeto do parque Horto do Ipê prevê duas entradas na Estrada do Campo Limpo, uma pela rua Francisco da Cruz Mellão e outra por meio de uma “viela” e que a comunidade será convidada a discutir questões necessárias na segunda fase da execução do parque. 

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