SP: movimentos pressionam por direito à moradia contra ameaças de despejo

Cerca de mil pessoas foram às ruas do centro da capital protestar contra reintegrações de posse e remoções forçadas que atingem famílias de baixa renda em São Paulo

“Há muitos problemas em São Paulo e, no fim das contas, as vítimas são sempre as mesmas: trabalhadores de baixa renda.” (Foto: Rafael Vilela/Fora do Eixo)

São Paulo – As organizações populares convocaram, o sol colaborou e cerca de mil pessoas marcharam hoje (11) pelas ruas do centro da capital em protesto aos mandatos de reintegração de posse e remoções forçadas que ameaçam colocar na rua milhares de famílias na região metropolitana de São Paulo.

“Queremos continuar onde estamos, porque estamos dando uma função social a imóveis que antes estavam abandonados”, resumiu Ivaneti Araújo, coordenadora do Movimento Sem-Teto do Centro (MSTC), quando a manifestação passou em frente à Câmara Municipal.

A caminhada começou por volta das 11 horas na rua Mauá, 340, endereço de um dos seis prédios ocupados pelas organizações populares que exigem uma reforma urbana em São Paulo. “Os prédios abandonados estão ilegais. Segundo as leis brasileiras, o imóvel deve ter uma utilidade”, explica Manuel del Rio, advogado da Frente de Luta por Moradia (FLM).

O destino final da marcha foi a sede da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), órgão ligado à Secretaria de Habitação do governo do Estado. “A manifestação foi positiva: mobilizou conjunto de pessoas envolvidas em conflitos diferentes na cidade, e conseguiu abrir um canal de diálogo com o governo”, avalia Osmar Silva Borges, membro da Central de Movimentos Populares (CMP).

Uma das principais exigências do protesto foi pedir ao poder público estadual que congele os mandatos de despejo lançando mão do Decreto de Interesse Social (DIS), que favorece as famílias que hoje em dia ocupam áreas e imóveis sujeitos a remoções forçadas e a reintegração de posse. Mas há muitas outras demandas.

Leque de exigências

A diarista Duília Domingues Simões, 50 anos, conseguiu negociar uma dispensa com o chefe e foi à marcha apresentar a situação do Jardim Paraná, na zona norte da capital. O governo do estado pretende remover cerca de quatro mil famílias que moram na região para construir o trecho norte do Rodoanel.

“A única coisa que estamos sabendo é que seremos desapropriados. Nenhuma autoridade até hoje nos disse para onde vamos”, lamenta. “Queremos que governo do estado, prefeitura e Dersa, que é a companhia responsável pela rodovia, assumam um compromisso documentado com a população: onde e quando vão ser construídas as moradias. Apenas com promessas verbais, não iremos sair.”

Os moradores da Vila Nova Esperança, na zona oeste de São Paulo, também sofrem ameaças de despejo – no caso, devido à construção do Parque Urbano de Conservação Ambiental e Lazer da Fazenda Tizo. São cerca de 600 famílias que, segundo a líder comunitária Maria de Lourdes Andrade de Souza, lutam contra a CDHU para permanecer numa área ocupada pela população desde os anos sessenta.

“Por trás da nossa remoção existe uma forte especulação imobiliária: vai ser criado um parque maior do que o Ibirapuera e querem fazer condomínio de luxo”, acredita. “A perícia diz que nossas terras não estão dentro da área do parque. Por isso, exigimos que se urbanize o bairro, com energia e saneamento básico, para que possamos continuar morando na vila.”

Na zona leste é a Copa do Mundo de 2014 que vem causando problemas aos moradores. Juliana Machado, membro do Comitê Popular da Copa, explica que aproximadamente quatro mil famílias estão sob ameaça de remoção devido à construção do Itaquerão, o estádio que deve receber a partida de abertura do torneio, além de obras de infraestrutura viária para permitir a realização do evento na região.

“As desocupações têm de acontecer chave por chave: o morador só pode ser removido se o poder público disponibilizar imediatamente uma alternativa habitacional, seja pagando indenização no valor do mercado, seja oferecendo imóvel”, defende. “A política habitacional não pode produzir sem-teto. Os governos municipal e estadual não prestam às famílias nenhuma informação necessária para que possam se preparar e participar das remoções.”

Compromissos

Os organizadores da marcha conseguiram junto à CDHU o compromisso de realizar pelo menos mais quatro reuniões para tratar dos problemas habitacionais da capital. De acordo com Osmar Silva Borges, membro da CMP, a promessa é de construir ao menos 160 moradias no centro de São Paulo para as famílias que ocupam imóveis abandonados na rua Mauá e na avenida Prestes Maia. Há ainda o compromisso de postergar a remoção da Vila Nova Esperança, na zona oeste, por pelo menos dois anos – tempo que a CDHU deve levar para viabilizar nova moradia às famílias da região.

“Estava faltando um momento como este, em que vários movimentos sociais da cidade se unissem numa só manifestação”, analisa Osmar, lembrando que a marcha desta quarta-feira reuniu população de rua, moradores de áreas de risco, ocupações sem-teto e afetados por grandes obras e megaeventos. “Há muitos problemas em São Paulo e, no fim das contas, as vítimas são sempre as mesmas: trabalhadores de baixa renda.”