União e reconstrução

Mudanças sobre o aborto mostram ‘espírito colaborativo’ de ministérios com as políticas para as mulheres

Pactos firmados durante a transição começam a dar sinais positivos, de acordo com a secretária-executiva do Ministério das Mulheres. Nesta semana, a Saúde revogou portaria de Bolsonaro sobre o aborto, retomando o cumprimento à lei das vítimas de violência sexual

Agência Brasil/Reprodução
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Na retomada da política externa, Brasil também deixou ‘aliança antiaborto’ estabelecida por Trump com bloco ultraconsevrador de cerca de 30 países

São Paulo – As mudanças sobre o tratamento do aborto no campo da política externa e na saúde brasileira, divulgadas nesta semana, mostram um “espírito colaborativo” de diferentes pastas do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com as políticas para as mulheres. É o que destaca a secretária-executiva do Ministério das Mulheres, Maria Helena Guarezi. De acordo com ela, esse trabalho de transversalidade começou já na transição de governo, no final do ano passado, quando os grupos de trabalho estavam abertos não só ao debate sobre gênero, mas também à igualdade racial, da diversidade, dos povos indígenas e das pessoas com deficiência. 

O que já “começa a dar sinais” neste início de governo, de acordo com Maria Helena. A secretária faz referência à revogação da portaria assinada pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sobre o aborto, revista nesta semana pela ministra da Saúde, Nísia Trindade. A medida anterior previa que o médico avisasse a polícia em caso de aborto por estupro. O que contrariava a própria legislação vigente, que estabelece o direito ao sigilo e autoriza o procedimento em casos de violência sexual, risco de vida e fetos anencéfalos. 

“O próprio código de ética médica não dá essa orientação. Em muitos casos, a situação de violência sexual infelizmente ocorre no núcleo familiar, o que causa dificuldade no registro policial. Isso não pode ser um constrangimento, uma obrigação”, alertou a ministra em entrevista à CNN. Com a revogação, a portaria da Saúde retomou as orientações anteriores, de cumprimento da lei e cuidados com as mulheres e meninas vítimas de violência. 

Saída de aliança ultraconservadora

Os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres também voltaram a ser defendidos em âmbito internacional. Na terça-feira (17), o governo brasileiro confirmou seu desligamento da Declaração do Consenso de Genebra sobre Saúde da Mulher e Fortalecimento da Família. Uma aliança ultraconservadora formada por 37 países e que se posiciona contra o aborto. O bloco havia sido costurado pelo ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump e o então chanceler brasileiro Ernesto Araújo e a então ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves. 

O Itamaraty, o Ministério da Saúde e o Ministério dos Direitos Humanos de Lula decidiram, contudo, “atualizar o posicionamento do país em fóruns e mecanismos internacionais que tratam da pauta das mulheres, com objetivo de melhor promover e defender os mais altos padrões dos direitos humanos e liberdades fundamentais, em linha com a legislação brasileira e os compromissos assumidos pelo país no plano regional e multilateral”, informaram os órgãos em nota. 

“Hoje estamos com um espírito muito colaborativo entre o Ministério das Mulheres e todos os outros. E o governo federal também faz isso de forma articulada como um todo, de responsabilidade de alguns ministérios. Estamos num novo momento de efetivamente fazer um país melhor para todo mundo, inclusive para as mulheres que foram uma das mais prejudicadas pelo governo que passou e que debilitou políticas que a gente já tinha avançado. Queremos políticas fortes, robustas e que tragam um equilíbrio para a sociedade”, destacou Maria Helena em entrevista à TV PT, nesta quinta (19). 

As prioridades para 2023

A secretária-executiva também detalhou as prioridades da pasta que começa a atuar “praticamente do zero”, de acordo com ela. O relatório da transição identificou um “desmonte” na área pelo governo Bolsonaro. Apesar do aumento da violência contra a mulher, apontando em dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, a equipe bolsonarista deixou de apoiar políticas de enfrentamento à violência de gênero. 

Do programa “Mulher Viver Sem Violência”, por exemplo, foram retirados os principais eixos que garantiam a capacidade de execução da medida, desobrigando o Estado de cumpri-los. O orçamento do programa foi desidratado em 90% e a construção de Casas da Mulher Brasileira foi paralisada, mostra o documento. O grupo de trabalho também observou um “desmantelamento” do Disque 180 – a central de atendimento à mulher. 

O serviço tinha um papel de orientação, informação e denúncia, mas foi reduzido ao registro de queixas. O programa também corre risco de ser paralisado neste ano por conta do orçamento previsto por Bolsonaro, de apenas R$ 6 milhões. A pasta, como um todo, vem tentando recuperar recursos da área. Uma vez que no projeto de lei orçamentário do governo anterior houve uma redução de 90% do orçamento quando comparado ao montante de 2015. 

“Estamos negociando parte do orçamento que vem do ex-orçamento secreto, e outros orçamentos que buscamos para tentar recompor o 180, a Casa da Mulher Brasileira e o projeto pró-equidade de gênero e raça do mundo do trabalho. Estamos fazendo uma articulação com todos os ministérios. Vendo quais são as parcerias que cada ministério pode fazer com a questão das mulheres. Porque, esse momento, como diz o slogan do governo, é de união e reconstrução”, ressalta a secretária-executiva Maria Helena Guarezi. 


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