reserva de Amambai

Justiça contraria fazendeiros e garante a indígenas Guarani e Kaiowá retomada de terra ancestral

Em decisão histórica no Mato Grosso do Sul, Justiça nega a fazendeiros pedido de despejo de indígenas das terras retomadas. Decisão determina “proteção integral” contra ameaças dos ruralistas

Divulgação/Povos Guarani Kaiowá
Divulgação/Povos Guarani Kaiowá
Disputa judicial começou no final de junho, com a retomada de área indígena ancestral invadida por fazendeiros. Houve violência policial, uma morte e dezenas de feridos

São Paulo – A Justiça Federal em Ponta Porã (MS) negou a fazendeiros o pedido de despejo de indígenas Guarani e Kaiowá da retomada de Guapo’y, em Amambai, naquele estado. A decisão, considerada histórica, garante a permanência no território ancestral, considerado sagrado. Mas ainda cabe recurso.

A disputa judicial teve início após a chegada das famílias, no último dia 24, na sede da fazenda construída pelos fazendeiros que invadiram o território indígena. Eles então chamaram a Polícia Militar, que atendeu prontamente, mesmo sem ordem judicial. Os agentes usaram de violência na ação.

Vitor Fernandes Guarani Kaiowá, de 42 anos, foi assassinado. E dezenas de pessoas ficaram feridas devido aos disparos de arma de fogo e de bala de borracha. Inclusive crianças e adolescentes. Muitos foram hospitalizados, chegando a ir para UTI.

Omissão do Estado expõe indígenas a violência

Para a Justiça, o que se vê no caso é mais uma disputa por “terras tradicionalmente ocupadas por comunidades indígenas”. Isso em meio à “completa ineficiência estatal em resolver a questão”, razão pela qual negou o pedido de liminar para despejar as famílias Guarani e Kaiowá.

“Na situação dos autos foram colhidos elementos mais do que convincentes a respeito da relevância da discussão promovida pela comunidade indígena, o que justifica pelo menos que recebam a proteção integral e atenção às suas reivindicações, oportunidade a partir da qual poderão ser impelidas a se retirarem do local tomado”, diz trecho da decisão.

Conforme o advogado e assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Anderson Santos, o advogado do fazendeiro se esquivou em dizer de quem partiu a ordem para ação da Polícia Militar, que matou o indígena Vitor Fernandes. “Tivemos uma decisão rara no estado de Mato Grosso do Sul. Agora, o juiz irá aguardar o andamento do processo para ter melhor fundamentação quanto à reivindicação feita pela comunidade”, disse.

A reserva de Amambai é a segunda maior de Mato Grosso do Sul, com quase 10 mil indígenas. Para os Guarani e Kaiowá, Guapo’y é parte de um território tradicional que lhes foi roubado, quando foi subtraído de parte da reserva. Os indígenas ainda clamam por atenção e exigem proteção às suas vidas e aos seus direitos.

Despejos suspensos pelo STF

Anderson lembrou que, apesar de não constar na decisão judicial, os indígenas devem ser resguardados também por uma determinação do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF). Em maio de 2020, a Corte determinou a suspensão de todos os processos que tratem do tema que possam resultar na anulação de demarcações. Ou no despejo de comunidades indígenas.

A decisão é válida até o fim da pandemia de covid-19. Ou até o término do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) que trata do Marco Temporal. Isso caso ainda não tenha sido concluído quando a crise sanitária for considerada encerrada. Apesar disso, as medidas estão sendo burladas e desrespeitadas por juízes e forças de segurança.

Nesta semana, o ministro Luís Roberto Barroso, também do STF, prorrogou até 31 de outubro a suspensão de despejos e desocupações, em razão da pandemia. A medida também poderá resguardar os indígenas até pelo menos o prazo definido por Barroso.

Saiba mais

Ataque de fazendeiros a indígenas em Mato Grosso do Sul deixa feridos e desaparecidos

Na ONU, Cimi reforça pedido de socorro a indígenas brasileiros e seus defensores


Leia também


Últimas notícias