Pinóquio envergonhado

Tribunal dos Povos: presidente se autoincrimina, diz advogado. Belisário: ‘Estado de direito em risco’

Líder indígena do Pará lamentou descaso do governo. “Com os anciões está a sabedoria do nosso povo. Vamos falar e lutar por eles”

Reprodução/YouTube
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Auricélia, líder indígena da região de Santarém: vítimas de mercúrio e da covid. 'Bolsonaro acha que podemos morrer'

São Paulo – Depois da acusação apresentada contra o governo brasileiro e depoimentos de testemunhas, concluídos nesta quarta-feira (25), os 12 jurados do Tribunal Permanente dos Povos (TPP) vão se reunir nos próximos meses para proferir sua sentença. De acordo com o secretário-geral do TPP, o epidemiologista e sanitarista italiano Gianni Tognoni, a expectativa é de que isso aconteça até o final de julho, “dependendo da nossa capacidade de trabalho”.

Neste segundo dia de sessão, a partir do Salão Nobre da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), advogados como o criminalista Antonio Claudio Mariz de Oliveira e Belisário dos Santos Jr., da Comissão Arns, fizeram críticas ao governo. Para o ex-secretário Mariz, “várias infrações, vários atentados à dignidade do povo brasileiro, à nação brasileira, foram cometidos pelo presidente”.

Circo de horrores

Ele observou que o TPP é um “órgão não punitivo”, mas a reprovação vinda desta corte deve ter repercussão mundial. Mariz se referiu a vídeo com declarações do atual presidente como “um espetáculo de um verdadeiro circo de horrores”, protagonizado por Jair Bolsonaro no centro do picadeiro. “Não fosse pelos subsídios valiosos e pelo brilho dos acusadores, eu entenderia desnecessária qualquer acusação formal, pois o próprio acusado se incumbiu de fazer um convincente libelo crime contra si próprio. Creio que ele convenceu os jurados de sua responsabilidade pelo delitos que cometeu contra a civilização brasileira e o humanismo, cometeu e comete.”

Assim, além de demonstrar várias vezes que não se sensibiliza com a morte, o presidente tem “temperamento mais do que autoritário, verdadeiro despótico, o apego ao poder paira acima de qualquer bem ou valor”. Ainda segundo o advogado, Bolsonao é “portador de um discurso desagregador, predatório, intolerância raivosa, ódio, uso de armas, carente de projetos e de planos, falas chulas, tocas, contrárias ao bom senso e à razão, recheadas de mentiras e de falácias, que com certeza deixariam Pinóquio envergonhado” .

Bibliotecas vivas

Já o também ex-secretário e ex-advogado de presos políticos Belisário classificou o Tribunal dos Povos como um “tribunal moral”, que analisa causas que cortes regulares não julgariam. Sentenças políticas, afirmou, atraem solidariedade e dão às protagonismo às vítimas. E o TPP tem “idoneidade e capacidade moral” para demonstrar a prática de crimes contra a humanidade e violações sistemáticas contra a população. Para ele, o governo Bolsonaro foi “irresponsável na ação e reincidente na omissão”. “Colocou o Estado de direito em risco no Brasil”, acrescentou.

Auricélia Fonseca, da coordenação do Conselho Indígena Tapajós Arapiuns (Cita), fez um relato emocionado sobre a situação na região onde vive, em Santarém (PA), área com 180 Territórios Indígenas. Afirmou que “70% da nossa população” está contaminada pelo mercúrio. E lamentou as muitas vítimas da covid-19 – ela mesma contraiu o vírus três vezes. “Para algumas pessoas, uma anciã pode ser apenas uma pessoa velha. Como é para o Bolsonaro, que acha que a pessoa pode morrer. Mas para nós, os anciões são nossas bibliotecas vivas. É com eles que está a sabedoria do nosso povo. Não vamos fazer nem um minuto de silêncio, vamos falar por eles, vamos lutar por eles. Eles levaram consigo parte de nossa história e da sabedoria de nosso povo”, afirmou.

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