Ameaça

Projeto de linhas de energia sobre terras indígenas é inconstitucional, afirma Cimi

Para os advogados do Conselho Indigenista, a proposta afeta a proteção das terras indígenas estabelecida pela Constituição Federal. E delegar ao presidente da República a escolha das terras abrevia o rito democrático também previsto na Carta

wikimedia commons
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Aprovado no Senado, PL que autoriza linhas de energia sobre terra indígena segue para a Câmara

São Paulo – A assessoria jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) divulgou nota técnica com argumentos que apontam que o Projeto de Lei Complementar (PLP) 275/2019, que autoriza a passagem de linhas de energia elétrica em terras indígenas é inconstitucional. De autoria do senador Chico Rodrigues (União Brasil-RR), a proposta foi aprovada no Senado no último dia 4 e agora segue para análise da Câmara.

O autor do projeto evoca o parágrafo 6º do art. 231 da Constituição, segundo o qual o relevante interesse público da União que tenha por objeto a ocupação das terras indígenas e a exploração de recursos naturais nelas existentes deverão ser regulados por lei complementar.

Investimento em estrutura

Os advogados do Cimi reconhecem a necessidade de investimento na estrutura elétrica do estado de Roraima que, além de sofrer com constante instabilidade energética, é o único da federação que não está ligado ao Sistema Interligado Nacional (SIN). Mesmo assim, entendem que o projeto é inconstitucional.

“Consta notável inconstitucionalidade no texto proposto, sobretudo no que afeta aos direitos dos povos indígenas e o que é estabelecido pela Constituição Federal quanto à proteção de suas terras”, diz trecho da nota.

Eles ressaltam também que, por meio do projeto, o senador Chico Rodrigues pretende conferir ao presidente da República a discricionariedade, sem a participação do Congresso Nacional, de dizer quais são as terras indígenas de relevante interesse público para a passagem de linhas de transmissão de energia elétrica.

Competência inexistente

Na avaliação dos advogados do Cimi, essa previsão de delegação da regulamentação para o presidente da República é “oca, padecendo de evidente inconstitucionalidade a proposição legislativa, pois cria uma competência inexistente para o presidente da República e abrevia o rito democrático para incidir em terras protegidas pela Constituição Federal”.

“Essa matéria não pode, em hipótese nenhuma, ser regida por meio de Decreto, mas tão somente mediante Lei Complementar com deliberação do Congresso Nacional, consultadas as comunidades indígenas afetadas”, completam, em nota.

Conforme nota pública divulgada pelo Cimi no mesmo dia em que a maioria dos senadores aprovou o PLP 275/2019, o projeto trata de mais um “ataque contra os direitos dos povos indígenas do Brasil”.

“Ressaltamos que os povos indígenas são as primeiras vítimas dessa ambição ‘desenvolvimentista’ na qual afeta, diretamente, o modo de vida e a cultura dos povos. Mas eles não são as únicas vítimas desse sistema. Todas as demais populações próximas, bem como todas as formas de vida do entorno e do planeta, correm risco de serem gravemente afetadas e até mesmo extintas. Não se trata de retórica, trata-se de emergência na defesa da vida e de riscos reais, comprovados por estudos científicos”, afirmou o Cimi.

Clique aqui para ler a nota técnica na íntegra.