Gentrificação

Famílias são despejadas no centro de São Paulo após intervenção da prefeitura

Prefeitura de São Paulo vem desabrigando moradores da região conhecida pejorativamente como Cracolândia, na Luz, com a justificativa de que os prédios estão em risco. Vereador contesta e aponta argumento como “desculpa para uma violação”. Patrimônio cultural também é ameaçado

Comissão de Direitos Humanos da OAB/Reprodução
Comissão de Direitos Humanos da OAB/Reprodução
Pelos menos 28 famílias ficaram desabrigadas após intervenção da prefeitura, em 20 de outubro

São Paulo – A conservação da história do bairro de Campos Elíseos, região central de São Paulo, que existe há mais de 130 anos, pode ser destruída por conta do desejo de elitização do território. E, mais do que isso, dezenas de famílias ficarão sem ter onde morar. Isso porque a prefeitura de São Paulo, por meio de uma Parceria Pública-Privada (PPP), pretende demolir parte dos prédios do bairro e construir novos edifícios na região. A área, que é conhecida pejorativamente como “Cracolândia”, passa por um processo de desvalorização no preço dos imóveis.

Uma estratégia econômica, segundo especialistas e ativistas, para venda com valor inferior. As irregularidades do projeto, contudo, são muitas, segundo especialistas. Desde 20 de outubro, a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) vem retomando as ações de despejo de famílias na região, iniciadas em 2017. Segundo advogados da comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), pelo menos 28 famílias ficaram desabrigadas após intervenção da prefeitura. Com apoio da Polícia Civil, hotéis e pensões da regiões foram emparedados enquanto parte dos moradores não estava no local, deixando dentro os seus pertences. As remoções foram feitas sem aviso prévio ou a presença de representantes do conselho tutelar e assistentes sociais, de acordo com a OAB. 

Ao portal G1, a advogada da comissão de Direitos Humanos, Luise Aguirram, denunciou ainda que a administração municipal não ofereceu às famílias “nem auxílio aluguel. Eles estão lacrando os locais e as pessoas estão tirando os pertences e deixando na calçada mesmo. Elas não têm para onde ir”. À imprensa, a gestão Nunes alegou que os imóveis interditados ofereciam risco aos ocupantes, segundo inspeção recente da Defesa Civil. 

Afastar os mais pobres

Mas, de acordo com o vereador Toninho Vespoli (Psol), esta tem sido uma estratégia por parte da prefeitura em relação a edifícios que sequer apresentavam rachaduras, mas mesmo assim foram considerados com risco de desmoronamento para serem demolidos. 

“Esse negócio de falar que tem risco de cair já foi utilizado em outras administrações. Era essa mesma desculpa. Tiraram pessoas de alguns prédios, também chegaram a emparedar dizendo que era a parte elétrica ou hidráulica que não estava bem e tinha perigo de cair. Só que já passaram seis, sete anos e não aconteceu nada. Eles estão usando isso como uma desculpa para uma violação, querem na verdade tirar aquele pessoal de lá”, contesta Vespoli.

O presidente do Movimento da População de Rua de São Paulo, Robson Mendonça, que está próximo da região, comenta que a presença de policiais armados no local também é frequente. Segundo ele, a prefeitura não mencionou nenhum tipo de apoio imediato às famílias despejadas nas últimas semanas. “Eles falam que o prédio está com o risco de desabar, por isso tiveram que fazer a reintegração de posse. Mas também questionamos se eles tinham oferecido alguma coisa e disseram que não, que não estava sendo oferecido nada e que futuramente iria ser pensada a oferta de bolsa-aluguel”, aponta o ativista. 

Violações

As remoções foram denunciadas ao Conselho Nacional de Direitos Humanos. O vereador do Psol avalia que os atos da prefeitura são ilegais e que a presença de policiais intimida os moradores. Dentro do perímetro que o município quer destinar às PPPs, há ainda pelo menos 18 prédios tombados que correm o risco de perder grande parte da arquitetura original. 

“A prefeitura está cometendo atos ilegais, acaba emparedando locais com os pertences das pessoas dentro, inclusive documentos. Como as pessoas vão andar na rua sem documentos? Os pertences delas estão lá dentro. É uma verdadeira violação o que a prefeitura está fazendo com as pessoas”, argumenta. “Além de fazer um negócio desses, ainda está colocando a guarda fortemente armada naquela região para impedir as pessoas de circularem. Ou seja, o direito à moradia das pessoas está sendo altamente violado”, ressalta o vereador.

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