Intimidação

Bolsonaristas ameaçam jornalista após matéria sobre operação policial que matou 26 em Minas Gerais

Ameaças de morte e insultos homofóbicos se intensificaram após Eduardo Bolsonaro comentar sobre a reportagem de Marcelo Hailer, que questionava suposto confronto em Varginha. Entidades repudiam ataques e cobram providências

Reprodução/Twitter/Marcelo Hailer
Reprodução/Twitter/Marcelo Hailer
As ameaças partem de grupos bolsonaristas em redes sociais, e vão desde rastrear a vida do jornalista à execução dele e de seus familiares

São Paulo – O jornalista Marcelo Hailer vem recebendo desde domingo (31) inúmeras ameaças de mortes e insultos homofóbicos por conta uma reportagem publicada por ele no site da Revista Fórum que questionava a tese de confronto usada pela Polícia Militar de Minas Gerais para justificar a morte de 26 pessoas durante uma operação conjunta com a Polícia Rodoviária Federal na madrugada do mesmo dia, em Varginha, no sul do estado. 

A reportagem apontava para as suspeitas de massacre devido à desproporção no número de mortos em apenas um lado da “intensa troca de tiros”, descrita pela PM, que não deixou nenhum policial ferido. “Massacre: Operação policial em Minas deixa 25 mortos e nenhum deles policial”, descrevia a manchete sobre o número total de vitimados, inicialmente divulgado. A possiblidade de execução também vem sendo levantada por especialistas de Segurança Pública em outros veículos da imprensa. Mas o caso passou a ser explorado politicamente pelo governo de Jair Bolsonaro, principalmente pelo filho do presidente e deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-RJ). Pelo Twitter, o parlamentar comentou a reportagem da Fórum, destacando o título e o nome do jornalista. 

“Para ser uma operação bem sucedida alguns acham que tem que morrer policial. Se vivessem no mundo real perceberiam que o povo aplaude este tipo de operação”, escreveu ele. Em outra sequência, o filho 03 de Bolsonaro também parabenizou a operação, alegando que “só vagabundos reclamarão”. Os comentários de Eduardo intensificaram uma onda de ataques contra o jornalista da Fórum, que já soma centenas de ameaças de mortes contra ele e sua família e insultos homofóbicos. Em um dos ataques, usuários afirmavam que iriam rastrear o endereço do jornalista para executá-lo. 

Rede de ódio

“Só espero que algum policial te ache e faça você explicar o porquê teria que ter algum policial morto”, ameaça um internauta. “Pode ter certeza que faremos ele explicar direitinho. E depois postaremos o vídeo. Força e honra”, responde outro usuário na sequência. Na página do Instagram de Marcelo, uma usuária encaminhou a ele uma mensagem, dizendo ser uma “pena” não ter “sobrado tiro de fuzil na cara da sua família, viado maldito de merda”. Com o mesmo tom criminoso, outro internauta completa que “pena que moro em outra cidade, queria muito dar uns 8 tiros na sua cara. Viado nojento. Tua hora vai chegar”.

De acordo com a Revista Fórum, todas as medidas legais contra os responsáveis pelas ameaças ao jornalista será tomadas. Em nota à imprensa, a publicação repudiou “ataques ao exercício do jornalismo e à liberdade de imprensa”. A Fórum também lamentou a participação de autoridades na ofensiva. “Hoje, infelizmente, a violência contra jornalistas parte do presidente que ocupa o Planalto e seus filhos, que alimentam uma rede de ódio.”

Solidariedade ao jornalista

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) também se solidarizaram com Marcelo Hailer, conhecido pela cobertura em direitos humanos, e cobraram providências. “A reação criminosa contra a atividade do jornalista é reflexo do ódio promovido pelo governo Bolsonaro contra os profissionais da imprensa e à liberdade de expressão. Inadmissível e repugnante”, criticaram as entidades. Ainda segundo o SJSP, o departamento jurídico também foi colocado à disposição do jornalista, que registrou um boletim de ocorrência eletrônica após as ameaças. 

“Neste momento, o que me faz sentir melhor é a solidariedade que tenho recebido da categoria”, disse Marcelo Hailer à Fórum. Pelo Twitter, os jornalistas Xico Sá e Cynara Menezes também prestaram apoio ao repórter, que também vem recebendo mensagens de solidariedade de personalidades políticas.

A Associação Brasileira de Mídia Digital (ABMD) e o Grupo Prerrogativas divulgaram nota conjunta repudiando as ameaças de grupos bolsonaristas ao jornalista e sua família. De acordo com as entidades, os ataques são parte da “estratégia nazifascista de intimidação”. 

“Cobraremos a Justiça e o Parlamento brasileiros, instituições que representam os pilares da nossa democracia, para que estejam atentos e exijam a imediata identificação e punição dos responsáveis pelos atos terroristas contra a Revista Fórum e o jornalista Marcelo Hailer”, ressaltou a ABMD e o Grupo Prerrogativas. 

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