Condenação antecipada

Juíza desacata STJ e manobra para prolongar prisão de Paulo Galo

Juíza Gabriela Bertoli não acata decisão de liberar entregador e decreta prisão preventiva, mesmo sem fundamentação jurídica. Criminalistas denunciam “abuso de autoridade” e “antecipação da pena”

Mídia Ninja
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Ela quer com isso antecipar a pena e está utilizando da prisão para fins políticos", afirma o advogado

São Paulo – Um dia depois de o Superior Tribunal de Justiça (STJ) ter revogado a prisão temporária do entregador por aplicativo Paulo Roberto da Silva Lima, conhecido como Galo, a juíza de primeira instância Gabriela Marques Bertoli negou o alvará de soltura e determinou nesta sexta-feira (6) a prisão preventiva do ativista. A decisão teve como base um inquérito da Polícia Civil, concluído apenas após a decisão do STJ nesta quinta, que apura o protesto contra a estátua do bandeirante escravocrata Borba Gato, em Santo Amaro, na zona sul da cidade de São Paulo, em 24 de julho. 

Na decisão, a magistrada estendeu a ordem de prisão preventiva também para o motorista Thiago Viera Zem, que afirmou ter sido contratado para levar os pneus usados para atear fogo ao monumento escravagista. Danilo Silva de Oliveira, outro integrante do movimento Revolução Periférica, que reivindicou a autoria da manifestação, também teve prisão preventiva decretada. O militante chegou a se apresentar à Polícia Civil no dia 28 de julho para falar sobre sua participação e foi liberado no mesmo dia. Dos três acusados, apenas Paulo Galo foi detido, mesmo se apresentando de forma voluntária na delegacia no mesmo dia. 

Os três são indiciados pelos crimes de associação criminosa e adulteração de placa de veículo. Mas a pedido da defesa do entregador, o ministro Ribeiro Dantas, do STJ, deferiu liminar em habeas corpus destacando que não havia razão jurídica para manter Paulo Galo preso. A família e os advogados do entregador, que aguardavam desde ontem à tarde pela sua soltura, foram surpreendidos hoje com a decisão judicial de prisão preventiva.

Abuso de autoridade

Segundo o advogado André Lozano Andrade, a defesa está tendo seu trabalho obstruído por Gabriela. “A juíza, em outra manobra, restringiu o acesso da defesa ao processo. Ela simplesmente nos excluiu do processo”, descreveu. De acordo com Lozano, as investigações foram divididas em duas partes, e os advogados já não têm mais acesso ao principal, ficando limitados ao apenso. Ainda segundo ele, a decisão reforça mais uma vez que a manutenção da prisão de Paulo Galo tem “motivação política”. Na liminar anterior, o STJ já havia ressaltado que “não há razões jurídicas convincentes e justas para manter a prisão”. 

“Ela (Gabriela Bertoli) utilizava o argumento de que eles fazem parte de movimentos sociais. A juíza faz um pré-julgamento desacreditando a versão do Galo, levando em consideração apenas a versão da polícia. Na verdade, o que ela deseja com a decisão é antecipar uma pena, isso está super claro. Ela fez uma manobra enorme para manter o Galo preso mesmo sabendo que essa prisão é ilegal e tendo plena consciência de que não há fundamentos jurídicos nessa decisão. Ela quer com isso antecipar a pena e está utilizando da prisão para fins políticos”, afirma o advogado. 

O criminalista e um dos fundadores do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) Augusto de Arruda Botelho afirma que a magistrada comete claro “abuso de autoridade”. Já o deputado Glauber Braga (Psol-RJ) anunciou que irá ingressar com representação contra a magistrada no Conselho Nacional de Justiça (CNJ). 

Galo, Thiago e Danilo, conhecido com Biu, devem ser agora conduzidos para um Centro de Detenção Provisório, caso a decisão não seja revogada. A Defesa já prepara um novo recurso para recorrer da prisão preventiva. Esse tipo de pena prevê prazo determinado de cárcere e pode ser avaliada pela autoridade jurídica em 90 dias. 

O que diz o TJ

A reportagem questionou o TJ-SP sobre a restrição de acesso à íntegra do processo. Em nota, o tribunal argumentou que “o processo em questão tramita em segredo de Justiça”. E que o órgão “não emite nota sobre questões jurisdicionais. Os magistrados têm independência funcional para decidir de acordo com os documentos dos autos e seu livre convencimento. Essa independência é uma garantia do próprio Estado de Direito. Quando há discordância da decisão, cabe às partes a interposição dos recursos previstos na legislação vigente”. 


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