Disputa

Cimi: Bolsonaro tenta ‘fragilizar o STF na decisão sobre o marco temporal’

Secretário-executivo da entidade destaca o peso da manifestação histórica dos indígenas também em apoio à democracia

Daniela Huberty/Apib
Daniela Huberty/Apib
"Indígenas estão colocando suas vidas em jogo, porque estamos vivenciando um período de pandemia, para também dar apoio a um poder da República", destaca secretário-executivo do Cimi

São Paulo – Para o secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Antônio Eduardo Cerqueira de Oliveira, o governo de Jair Bolsonaro “usa de todos os argumentos” para tentar “fragilizar” o Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do marco temporal, que pode definir o futuro da demarcação de terras indígenas no país. Isso porque, nos bastidores, os ministros da Corte estariam vendo a discussão como uma “polêmica” diante dos ataques do presidente da República ao STF. 

Bolsonaro é favorável à tese defendida por ruralistas, que determina que só podem ser demarcadas terras ocupadas por povos indígenas na data de promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. E a avaliação interna é que um julgamento contrário ao marco temporal poderia acirrar ainda mais a relação entre os poderes. Embora não descarte esse desdobramento, o secretário-executivo do Cimi destaca, em entrevista a Marilu Cabañas, do Jornal Brasil Atual, que a manifestação histórica dos povos indígenas também presta um serviço de defesa da democracia. 

Desde domingo (22) cerca de 6 mil indígenas, de mais de 170 povos, estão no acampamento “Luta pela Vida” em Brasília. A mobilização reivindica direitos para as comunidades originárias e acompanha a votação no STF. Mas também “reafirma a confiança no Supremo”, de acordo com Oliveira. “Portanto, vejam bem a importância desse julgamento. Ele não discute apenas os territórios indígenas, mas o apoio a um dos poderes da República. Os povos indígenas saem de suas aldeias com sacrifício. Eles estão colocando suas vidas em jogo, porque estamos vivenciando um período de pandemia, para também dar apoio a um poder da República”, observa.

Expectativa sobre o julgamento do marco temporal

O julgamento estava previsto para esta quarta (25), mas foi adiado para hoje pela quarta vez em dois meses. A sessão deve começar após o término do debate sobre a autonomia do Banco Central, que não foi concluído ontem, para logo depois a Corte apreciar o pedido de reintegração de posse movido pelo governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng. O processo é referente à TI Ibirama-Laklãnõ, no qual o Estado invoca a tese do marco temporal para anular a posse dos indígenas. A decisão dos ministros neste caso será de repercussão geral, ou seja, será aplicada em todos os processos envolvendo demarcação de terras.

De acordo com levantamento do Cimi, se aprovado, 63% dos territórios tradicionais que existem hoje podem ser prejudicados. O percentual representa 829 processos de demarcação paralisados ou com alguma pendência pelo Estado.

A expectativa dos povos originários e movimentos é que o ministro Edson Fachin, relator da matéria, confirme sua manifestação contrária ao marco temporal. Em plenário virtual, Fachin já havia antecipado essa posição. Há rumores, porém, de que algum ministro possa pedir vistas dos autos. Ainda assim, o Cimi destaca como positiva a avaliação da Comissão de Meio Ambiente do Senado, que, ontem, em debate sobre o Projeto de Lei (PL) 490/2007, que trata do marco temporal, rechaçou a medida. 

“Acreditamos e estamos com confiança de que os direitos dos povos indígenas, contidos na Constituição Federal, serão reafirmados por esse julgamento”, aponta Oliveira. 

Confira a entrevista 

Redação: Clara Assunção


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