Validando direitos

Justiça de São Paulo dá 48 horas para governo Doria apresentar plano de vacinação de presos

Segundo magistrada, ao não observar nem mesmo “equivalência com a população em geral”, governador paulista “incorre em grave afronta dos direitos fundamentais da pessoa humana”

Defensoria/Divulgação
Defensoria/Divulgação
Em liminar, magistrada afirma que o governo Doria "incorre em grave afronta dos direitos fundamentais da pessoa humana" ao não observar critérios de prioridades da imunização, estabelecidos no PNI

São Paulo – O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) deu prazo de 48 horas para que o governo João Doria (PSDB) apresente um cronograma de vacinação da população carcerária para ser efetivado em, no máximo, 15 dias. De acordo com a decisão judicial, em caráter liminar (provisório), a primeira dose ou a dose única da vacina deve ser garantida no período para todas as pessoas, sob pena de multa diária a ser definida em caso de descumprimento. 

A determinação atende ação civil pública movida, terça-feira (20), pela Defensoria Pública. O órgão afirma que o Estado viola o Plano Nacional de Imunização (PNI) ao descumprir o critério de prioridade que deveria ser dado ao grupo. Ao conceder a liminar, ontem (22), a juíza Maricy Maraldi, da 10ª Vara de Fazenda Pública, também reconheceu “flagrante descaso do Governo com a população carcerária, já tão privados dos direitos mais básicos e elementares do ser humano”.

Segundo a magistrada, ao não observar o critério de priorização estabelecido ou providenciar a cobertura vacinal das pessoas privadas de liberdade “ao menos em equivalência com a população em geral”, o governo Doria “incorre em grave afronta dos direitos fundamentais da pessoa humana”. “Em especial à igualdade e aos princípios basilares do Sistema Único de Saúde, como a universalidade, a equidade e a integralidade da assistência, além de claramente ignorar a normativa da ONU sobre o tema”, aponta Maricy. 

Ritmo de imunização é lento

A decisão completa que “ao integrar o Plano Nacional de Imunização e receber vacinas, ainda que em parte, custeadas e distribuídas pelo Ministério da Saúde, deve o Governo do Estado de São Paulo respeitar os grupos prioritários definidos na normativa nacional, podendo ampliar, mas não restringir, a cobertura vacinação”, menciona a juíza. 

Estado com a maior população carcerária do país, São Paulo vacinou, até o momento, segundo a Secretária de Administração Penitenciária (SAP), 56 mil das 207.700 pessoas privadas de liberdade. Incompatível, segundo a Defensoria, com o nível de prioridade previsto no PNI. O núcleo especializado de situação carcerária calcula que se o ritmo de imunização dentro do sistema prisional acompanhasse o da população, – atualmente estacionado na faixa dos 30 anos –, ao menos 100 mil detentos teriam sido vacinados.

No pedido à Justiça, o órgão cita relatórios de inspeções realizadas nos presídios do estado ainda durante o ano passado, onde flagraram outras diversas violações. Incluindo celas superlotadas, racionamento de água e uma maioria de unidades que não recebem itens de higiene e sequer têm equipes mínimas de saúde. 

As violações do cárcere

O núcleo ressalta que, por conta dessa elevada vulnerabilidade social, “a imunização deste grupo deveria acontecer antes da população jovem e sem comorbidades que não está encarcerada”. As pessoas privadas de liberdade foram incluídas na lista de prioridades por serem mais suscetíveis a doenças infecciosas devido às condições do sistema prisional. Locais considerados como verdadeiras “bombas biológicas“. A avaliação de especialistas indica que “é impossível que eles se protejam da doença nesses espaços”.

Somente nos presídios de São Paulo, 74 presos morreram em decorrência da covid-19. A ação civil destaca que 39 deles nos últimos cinco meses. “Pessoas estão morrendo ou sofrendo danos permanentes e irreversíveis à saúde nos estabelecimentos prisionais, sem que tenham acesso à vacinação, em evidente afronta à dignidade humana”, afirmam os 24 defensoras e defensores que assinam a ação. 

O grupo também cobra que o governo Doria seja condenado por danos morais coletivos no valor de R$ 5 milhões, a serem destinado ao Fundo Estadual de Defesa dos Interesses Difusos (FID). 

Em nota, a SAP afirmou que a Procuradoria Geral do Estado ainda não foi intimada.

A pasta disse que “a expectativa é que a vacinação avance a partir do mês de agosto, considerando a ampliação das faixas etárias elegíveis para a vacinação pelo PEI (Plano Estadual de Vacinação). O governo também alega que a vacinação dos presídios é de responsabilidade dos municípios. Questionada sobre o ritmo da vacinação nas unidades prisionais, a SAP alegou que, por conta da campanha de vacinação contra a Influenza, “aguarda o intervalo de 15 dias entre as aplicações das duas vacinas (contra a Covid-19 e Influenza). Assim, alguns presos já elegíveis para vacinação contra a Covid podem não ter recebido a dose ainda em virtude da necessidade deste intervalo”, argumenta em nota.

(*) Matéria atualizada às 16h46 do dia 23 para inclusão de nota

Presidente do TJ derruba a decisão

(*) Atualização: Na noite de sexta-feira (23), o Tribunal de Justiça de São Paulo divulgou nota à imprensa informando a suspensão da liminar. Com a decisão, fica vetado o prazo de 15 dias para a vacinação imediata da população carcerária. O presidente do TJ-SP, Geraldo Francisco Pinheiro Franco, acolheu o pedido da Procuradoria Geral do Estado, que inicialmente alegou não ter sido intimada da decisão. O desembargador deu razão ao argumento do governo Doria de que “a população privada de liberdade é mais jovem que a população em geral, assim a expectativa é que a vacinação avance a partir do mês de agosto, considerando a ampliação das faixas etárias elegíveis para a vacinação pelo PEI”, decretou. 

Redação: Clara Assunção


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