injustificável

Juíza manda prender Paulo Galo por ação contra estátua de Borba Gato

Além de Galo, sua companheira, Gessica, também foi presa. Ela tem emprego fixo e sequer estava no ato que resultou em incêndio da estátua do escravocrata, torturador e estuprador Borba Gato. O casal tem um filho de três anos

ZéBernardes - Arquivo Pessoal
ZéBernardes - Arquivo Pessoal
"Não entendo uma pessoa que veio por livre vontade ser preso. O telefone utilizado pelo Paulo está em nome da Gessica. Só por essa razão, não tem ligação nenhuma fora o fato de ser esposa. É absolutamente irrazoável", afirma a defesa de Galo

São Paulo – Paulo Roberto da Silva Lima, o Paulo Galo, foi preso hoje (28), em São Paulo. é Integrante do movimento Revolução Periférica, que reivindicou autoria do incêndio da estátua do bandeirante escravocrata Borba Gato, sábado (24), no bairro de Santo Amaro, zona sul da capital paulista. A prisão foi anunciada quando ele se apresentou voluntariamente ao 11º Distrito Policial. Além de Galo, sua família foi surpreendida com o pedido de prisão de sua companheira, Gessica, que nem mesmo estava no ato do fim de semana, além de ter emprego fixo. O casal tem uma filha de três anos.

Além da detenção injustificada de Gessica, a defesa de Galo argumenta que “prisão temporária pra quem se apresenta é um absurdo”. O ativista compareceu ao DPp para apresentar sua versão dos fatos e suas justificativas. “Foi um crime que não deixou vítimas e não tem razão alguma para você prender”, explica a defesa.

Galo assumiu ser um dos autores do protesto. A juíza substituta Gabriela Marques da Silva Bertoli é quem assina os mandados de prisão. A polícia irá fazer uma busca e apreensão na casa do manifestante ainda nesta quarta. Para tanto, contou com colaboração do próprio Galo, conforme informa nota da defesa do entregador de aplicativo. “O mandado de busca e apreensão para a residência de Paulo havia sido expedido para o local errado (…) Paulo apresentou seu endereço correto, autorizando e possibilitando a entrada em sua residência para possíveis buscas.”

Sem sentido

“O que sabemos de imediato é que os pedidos de prisão temporária são absolutamente sem sentido. Inclusive para uma mulher que sequer estava presente. Não estamos conseguindo entender a razão. Vamos ter acesso aos motivos ainda. Trata-se de uma prisão temporária de cinco dias, prorrogável por mais cinco. É prematuro falar sobre habeas corpus. O que posso é pedir uma medida de segurança. Não entendo uma pessoa que veio por livre vontade ser preso. O telefone utilizado pelo Paulo está em nome da Gessica. Só por essa razão, não tem ligação nenhuma fora o fato de ser esposa. É absolutamente irrazoável”, disse sua defesa.

Além de Galo, o ativista Danilo Oliveira (Biu) também compareceu ao DP para ajudar nas investigações. Entretanto, ele não foi preso, mesmo reivindicando abertamente a autoria do ato. “Perceba que o Danilo veio aqui, ele estava junto com Paulo no ato e não está preso. Qual a razão jurídica disso?”, questionam os advogados. “A equipe jurídica do escritório Jacob e Lozano acompanha o andamento do processo e pode dar um novo depoimento em breve”, completam.

Homenagem questionável

A jornalista Laura Capriglione, dos Jornalistas Livres, foi até Santo Amaro para acompanhar o depoimento, que foi seguido de detenção, do ativista. Ela afirma que “Galo, ao chegar no distrito policial, disse que o objetivo do coletivo com essa ação de sábado foi exatamente colocar em discussão o fato de seguirmos homenageando genocidas, assassinos, estupradores com estátuas, enfim. Por que seguimos tendo um genocida de indígenas, de negros, homenageado com uma estátua de 13 metros de altura?”.

Borba Gato foi um bandeirante paulista nascido em 1649. Começou suas expedições com seu sogro, Fernão Dias Paes. Participou da chamada Guerra dos Emboabas. Era um escravocrata que possui em sua história menções a torturas e estupros de negros e indígenas. Suas virtudes eram duvidosas e a uma das bases de suas atividades era justamente a caça de indígenas para escravizá-los.

A ação do movimento Revolução Periférica foi tomada para questionar a validade da homenagem. “Para aqueles que dizem que a gente precisa ir por meios democráticos, o objetivo do ato foi abrir o debate. Agora, as pessoas decidem se elas querem uma estátua de 13 metros de altura de um genocida e abusador de mulheres”, afirmou Galo ao chegar na delegacia.

Repercussão

A prisão de Paulo Galo mesmo diante de cooperação e da arbitrariedade cometida contra sua companheira repercurtiu nas redes sociais. O ator Gregório Duvivier foi direto ao ponto. “Foda-se o Borba Gato. Foda-se mil vezes. Não tenho pena de estátua. Menos ainda estátua de bandeirante. To com Paulo Galo e a Revolução Periférica”, disse.

O líder do Movimento dos Trabalhadores sem Teto (MTST) Guilherme Boulos classificou a ação como absurda. “Recebi agora a informação de que foram expedidos mandados de prisão do Paulo Galo, entregador antifascista, e de sua companheira Jessica por conta do ato na infame estátua do Borba Gato. Inaceitável”, disse. O deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) afirmou que o caso é “mais um absurdo acontecendo no Brasil”.

A vereadora de São Paulo Luana Alves, líder do Psol na Câmara, mulher negra, direcionou suas críticas à prisão de Gessica. “A prisão de Gessica, esposa de Paulo Galo, é um exemplo de racismo e machismo. Gessica não estava na ação contra a estátua de Borba Gato, não tem nada que a ligue ao fato. É uma mãe de criança pequena, trabalhadora, endereço fixo. É simplesmente perseguição”, disse.

Liberdade

O advogado da Educafro Brasil e procurador da cidade de Mauá, Irapuã Santana, disse não entender as razões para as prisões. “É revoltante ver expedição de mandado de prisão para crime cuja pena não se trate de detenção. Espero que um habeas corpus seja elaborado rapidamente e que Paulo Galo e Gessica possam responder o processo em liberdade o quanto antes”.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) divulgou uma nota oficial sobre o caso. “A prisão preventiva, que já era injustificável, se torna ainda mais surreal se considerado o fato de que Gessica não esteve sequer presente no local ou na organização dos atos do dia 24. Ambos têm um filho de três anos de idade que, com a decisão, fica desprotegido. Mais uma vez, o poder público se coloca contra os trabalhadores, periféricos e ativistas do país”.


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