"Inteligência" policial

Morte de Lázaro dificulta investigar se matador agia a serviço de alguém, e de quem

Acusado de homicídios, Lázaro era procurado desde 9 junho por força-tarefa policial em Goiás e era suspeito de trabalhar para fazendeiros. Morte deixa sem resposta investigações

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Secretário de Segurança Pública disse que foi encontrado no bolso de Lázaro R$ 4,4 mil. Polícia suspeita de ajuda

São Paulo – Procurado desde o dia 9 de junho, Lázaro Barbosa de Souza, de 32 anos, foi morto durante operação policial nesta segunda-feira (28) em Águas Lindas de Goiás. De acordo com o diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem, ele teria resistido à prisão e por isso acabou sendo baleado. Fotos do corpo de Lázaro mostram mais de 10 perfurações da cintura para cima, incluindo a cabeça. Ainda assim, segundo o secretário de segurança de Goiás, Rodney Miranda, ele teria sido “socorrido com vida” e levado para o Hospital Municipal Bom Jesus, de acordo com reportagem do UOL. A morte de Lázaro Barbosa foi confirmada pela Polícia Técnico Científica de Goiás.

Um vídeo que circula pelas redes sociais mostra cinco policiais do Batalhão de Rondas Ostensivas Táticas Motorizadas (Rotam) carregando o corpo de Lázaro e, em seguida, jogando-o dentro da ambulância. A porta é fechada pelo grupo que imediatamente comemora a captura. A operação, no entanto, vem sendo questionada com críticas por autoridades da segurança pública. 

Lázaro era suspeito pela morte de um caseiro em uma fazenda no distrito de Girassol, em Cocalzinho de Goiás, e pelo assassinado de uma família em Ceilândia, no Distrito Federal, quatro dias depois. No dia 9 de junho, ele teria invadido a chácara no Incra 9, onde vivia a família, e matado a facadas um casal e seus dois filhos. No local, ele também é acusado de praticar roubo e render o caseiro, o dono da propriedade e a filha dele. Antes disso, Lázaro também já era condenado por homicídio, na Bahia, mas estava foragido depois de fugir da prisão em 2016. 

As marcas da operação

O criminoso Lázaro Barbosa de Souza também é suspeito de latrocínio (roubo seguido de morte), estupro e porte ilegal de arma de fogo. Durante os 20 dias de busca, a polícia de Goiás se envolveu em uma série de denúncias de arbitrariedade. Terreiros de candomblé na região de busca foram invadidos e tiveram suas portas arrombadas por agentes de segurança pública após a circulação de um vídeo que ligava Lázaro à religiões de matriz africana. O material ainda teria sido forjado por policiais, segundo denúncia dos religiosos. 

O caso também foi explorado por policiais em redes sociais, como o Tik Tok, que viralizavam vídeos sobre as buscas, assim como uma parcela da mídia comercial e dos noticiários “policialescos”, que dedicavam sua programação apelando para discursos militaristas e armamentistas. 

Morte deixa caso sem respostas

Apenas na última sexta (25), a polícia descobriu que Lázaro Barbosa dormia há cinco dias em uma propriedade sob a proteção de um fazendeiro. Ele foi levado preso junto com o caseiro, que negou contato com o criminoso. O caseiro, no entanto, confessou que o fazendeiro ajudava Lázaro, deixando-o dormir na casa e se alimentar, de acordo com informações do portal G1. A relação levantou dúvidas se Lázaro Barbosa cometia os crimes a mando de alguém. No momento em que foi pego, hoje, o secretário de Segurança Pública disse que foi encontrado em seu bolso R$ 4,4 mil. 

A deputada federal Talíria Petrone (Psol-RJ) escreveu que a morte de Lázaro deixa agora várias perguntas sem respostas. “Lázaro foi morto e os ‘defensores da vida’ já comemoram. Desde o começo, a situação foi muita absurda: destruição de terreiros, cobertura sensacionalista e incentivo ao armamento da população. E agora, fica mais difícil averiguar se de fato ele estava matando a serviço de alguém. Finalizadas as buscas por Lázaro, ficam as perguntas: a quem interessa a morte de uma pessoa que precisava ser investigada? Quais os segredos Lázaro carregava com ele? O Estado precisa responder as dúvidas se ele agia a mando de algum poderoso da região”, tuitou a parlamentar. 

Outras perguntas

Pela rede social, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), alegou que apesar do tempo e dos recursos despendidos, a polícia do Estado é “a mais preparada do país”. Segundo Caiado, “era questão de tempo” capturar Lázaro. “Goiás não é Disneylândia de bandido”, afirmou. O presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, observa, porém, que, apesar das comemorações, há uma “história é toda estranha”. Lima questionou a declaração do governador de que a Casa Militar é que teria achado Lázaro, e não a Força Tarefa de Polícias. 

“Ele integra uma quadrilha que queria tomar chácaras e fazendas na região? 3) Houve perícia ou isolamento de local? Sua morte evitará o aprofundamento das investigações?”, disparou o presidente do FBSP. 

E o risco de insegurança

O advogado criminalista e um dos fundadores do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), Augusto de Arruda Botelho, também usou das redes sociais para chamar atenção ao tom de comemoração dado à morte de Lázaro Barbosa. “Não comemoro a morte de ninguém. Nem de um Lázaro”. O advogado e professor da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV), Thiago Amparo, observou que o caso expõe as marcas do punitivismo brasileiro, em resposta também à declaração do presidente da República, Jair Bolsonaro, que parabenizou a operação usando de uma gíria atribuída a milicianos. “CPF cancelado”, descreveu Bolsonaro.

“Somos um país. Que celebra mortes de CPFs, que convive com 43mil mortes violentas/ano e com 500mil mortos de doença com vacina, que mata indígenas, negros, pobres e LGBTs todo dia. Sabe quem não ganha? Nós. Ninguém está mais seguro com Lázaro morto, ao invés de preso”,  destacou. 

Ao todo, as buscas a Lázaro e sua morte que pode ter comprometido a elucidação sobre a motivação dos crimes ou quem poderia estar por trás, mobilizou mais de 270 agentes das forças de segurança, segundo a SSP, a um custo de R$ 19 milhões.

Redação: Clara Assunção