Virando o jogo?

CPI da Covid leva bolsonarismo a apagar centenas de posts e vídeos com ‘fake news’

Além do temor pelas consequências da CPI da Covid, analista também aponta que o bolsonarismo digital é cada vez mais limitado a uma bolha: para cada dez tuítes, sete estão “detonando o governo”

Waldemir Barreto/Ag. Senado
Waldemir Barreto/Ag. Senado
Depoimentos colhidos pela CPI da Covid, com contradições e mentiras desmentidas em tempo real, têm sido desastrosos para o governo e para o bolsonarismo

São Paulo – A CPI da Covid aparentemente está apavorando as hordas bolsonaristas, celebrizadas como senhoras das redes sociais e especialistas em disseminar notícias falsas de grande repercussão. Os movimentos deles próprios na internet revelam um recuo não verificado desde o início do mandato do presidente Jair Bolsonaro. Segundo o site Vice.com, centenas de vídeos bolsonaristas no YouTube, promovendo boatos, cloroquina e fake news sobre a pandemia passaram a ser deletados a partir de abril deste ano.  “O desaparecimento dos vídeos coincide com uma investigação em andamento conduzida pelo Parlamento brasileiro sobre a forma como o governo está lidando com a pandemia, anunciada no início de abril”, informa a publicação, em inglês (leia aqui).

Citando o estúdio de análise de dados Novelo, o texto diz que “desde 14 de abril, quando o juiz da Suprema Corte Luís Roberto Barroso ordenou a instauração da CPI, tivemos um total de 847 vídeos apagados, de 51 canais”. Segundo a matéria, o número total de vídeos “desaparecidos” pode chegar a milhares. Isso porque os dados contabilizados são apenas até 17 de maio, além de ser “virtualmente impossível monitorar todos os canais pró-Bolsonaro no YouTube”.

Alexandre Garcia e Leda Nagle

As postagens excluídas não são apenas de robôs ou bolsonaristas anônimos. De acordo com o Vice.com, em maio o comentarista da CNN Brasil Alexandre Garcia, com quase 2 milhões de inscritos em seu canal do YouTube, excluiu 73 vídeos e escondeu outros 476, “quase 50% dos vídeos em seu canal”, de acordo com a análise de Guilherme Felitti, sócio da Novelo. A apresentadora Leda Nagle, com mais de 1,2 milhão de inscritos, excluiu cerca de 92 vídeos em uma única semana. A jornalista espalhou uma fake news que beirou o absurdo, de acordo com a qual o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) teriam um plano plano para matar Bolsonaro.



O pesquisador e analista de redes Fabio Malini também detecta movimentos significativos relacionados à CPI no Twitter. Segundo ele, para cada dez tuítes relacionados aos cenários político e sanitário do país, sete são “detonando o governo”. A análise – postada na terça-feira (1° de junho) – foi feita com uma base de 2,4 milhões de retuítes na semana do depoimento do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello.

“O bolsonarismo digital segue o ‘modelo boiadeiro’. Uma comitiva q toca o gado, ganha projeção, acumula eleitorado. Mas é cada vez (mais) limitada a uma bolha”, escreveu Malini no Twitter. No gráfico abaixo, o predomínio da área rosa sobre a cinza mostra que o antibolsonarismo parece estar virando o jogo no Twitter.

Fábio Malini explica (grafia do Twitter mantida): “Sobre a CPI no Twitter. Para cada 10 tuítes, 7 são detonando o governo. Fiz esse grafo de RTs (2.4 milhões) da semana do Pazzuelo. Cinzas, os negacionistas. Uma dezena de hubs, que recebem número muito alto de RTs. No rosa, antibolsonarismo, centenas de hubs recebendo número alto de RTs.”

200 gigabytes tirados do ar

Em resposta a requerimento do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI da Covid, a Google, dona do YouTube, encaminhou à comissão aproximadamente 200 gigabytes de arquivos sobre youtubers bolsonaristas retirados do ar. As postagens deletadas, todas de apoiadores de Bolsonaro, eram sobre tratamento precoce, hidroxicloroquina e “até ataques a outros poderes da República”, segundo matéria do Congresso em Foco.

Em maio, surgiu a informação de que Bolsonaro prepara um decreto para dificultar o controle da disseminação de fake news e a suspensão de contas em redes sociais e sites. Isso ocorre como reação após ele e seus apoiadores terem várias publicações retiradas do ar por plataformas de rede.

Não é este o caso do movimento apontado pela Vice.com a partir de dados do estúdio de análise de dados Novelo, que registra publicações retiradas do ar espontaneamente pelos próprios internautas, aparentemente atemorizados com a CPI da Covid. O que Bolsonaro quer com o decreto que supostamente prepara é virtualmente legalizar as notícias falsas plantadas por seus apoiadores. Com isso, mais uma vez o presidente pretende declarar guerra ao STF, particularmente ao ministro Alexandre de Moraes, que conduz um inquérito na Corte que investiga as fake news.


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