Casa do povo

Movimentos protestam contra despejo em Mauá de mulheres vítimas de violência e sem-teto

Prédio que há quatro anos é sede da Casa de Referência para Mulher Helenira Preta e da Ocupação Manoel Aleixo, que abriga mais de 40 famílias, está sendo leiloado sem nenhum aviso sobre a função social do espaço

Jorge Ferreira
Jorge Ferreira
Em ato nesta quinta (22), organizações cobraram a suspensão da venda do terreno que pode levar ao despejo mulheres e sem-teto

São Paulo – Os movimentos de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) e das Mulheres Olga Benário marcharam pelas ruas do centro de Mauá, no Grande ABC Paulista, nesta quinta-feira (22) contra o leilão do prédio que há quatro anos sedia a Casa de Referência para Mulheres Helenira Preta e a Ocupação Manoel Aleixo, que é moradia para mais de 40 famílias. As organizações cobram a suspensão da venda do terreno que pode levar ao despejo mulheres e sem-teto. De acordo com elas, o prédio foi colocado para leilão pela prefeitura de Mauá sem nenhum contato prévio com os movimentos. 

Anunciado em março, o prédio é avaliado em mais de R$ 8 milhões sem nenhum aviso sobre a função social que o espaço cumpre. A venda diz apenas que o espaço está ocupado. As organizações denunciam que o terreno onde as ocupações funcionam esteve abandonado por mais de 10 anos. 

O local foi primeiro ocupado em 2018 pelo Movimento de Mulheres Olga Benário que revitalizou o espaço. A organização vinha negociando desde 2017 com a gestão do então prefeito Átila Jacomussi (PSB) a implementação de uma casa de referência para atender mulheres em situação de violência. O município, no entanto, não cumpriu o acordo, e o prédio seguiu sob a ocupação do movimento. De lá para cá, já são centenas de vítimas da violência de gênero atendidas. Atualmente, além do centro de referência e da ocupação de moradia, o prédio também é sede da “brigada de solidariedade”. Uma iniciativa que ocorre desde o início da pandemia, em março do ano passado, para a entrega de cestas básicas em favelas e apoio no cadastro para o recebimento do auxílio emergencial  e em serviços jurídicos, sociais e sanitários. 

Serviços em risco

“Nenhum oficial de Justiça foi a nossa casa perguntar qual é o trabalho que a gente faz. Um trabalho que inclusive faz o que é dito na Constituição como o que deveria ser feito, o direito das mulheres viverem. Porque a nossa casa salva a vida de mulheres do estado de São Paulo”, contesta uma das organizadoras do espaço, Amanda Bispo. 

Para marcar a indignação com o caso, os manifestantes marcharam da ocupação, na Vila Bocaina, até o Paço Municipal, onde foram recebidos por os vereadores que se comprometeram a convocar uma audiência pública sobre o tema para a próxima terça (27). A comissão do protesto também reivindica instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o processo de leilão. Os movimentos também cobram diálogo com o atual prefeito Marcelo Oliveira (PT) para que possam debater a continuidade do trabalho das ocupações. 

Nas redes sociais, a luta das organizações também conta com o apoio por lideranças de todo o país. A deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS) critica o projeto de remoção em meio ao recorde de infecções e morte pela covid-19. “Em momento de pandemia, a pior que o Brasil já viveu, que aumenta os casos de feminicídio e de violência contra as mulheres, o governo de Mauá levar esse projeto de leilão, vai despejar um dos poucos serviços de referência às mulheres vítimas de violência. É inadmissível”, enfatizou a deputada. 

Em paralelo, os movimentos também estão recolhendo, de forma online, assinaturas para uma carta aberta que cobra a suspensão da venda do prédio.

Jorge Ferreira
Casa Helenira Preta atende centenas de mulheres vítimas da violência no mesmo terreno que abriga mais de 40 famílias que temem perder suas moradias em meio à maior crise sanitária do último século (Foto: Jorge Ferreira)