Contra o obscurantismo

Moraes vota pelo fechamento de igrejas: “O Estado não se mete na fé, a fé não se mete no Estado”

“Mesmo na Idade Média os grandes líderes religiosos defenderam em época de pandemia o fechamento de igrejas, isolamento, a transformação de igrejas e templos em hospitais”, disse ministro no voto

Carlos Moura/STF
Carlos Moura/STF
Ministro do STF endurece medidas contra aplicativo que diz defender "liberdade de expressão", mas é usado por milícias digitais para ataques à democracia

São Paulo – O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, nesta quinta-feira (8), o julgamento de ação do PSD contra decreto do governo de São Paulo que adota uma série de medidas para o combate à disseminação da covid-19, cujo tema central é o fechamento de igrejas e templos religiosos para evitar a disseminação do Sars-Cov-2, o vírus transmissor do coronavírus. O placar está em 4 votos a 1 a favor do enquadramento das igrejas e seu fechamento. Votaram nesse sentido os ministros Gilmar Mendes (relator), Alexandre de Moraes e Edson Fachin. Nunes Marques, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para a vaga aberta com a saída de Celso de Mello, que se aposentou, votou em sentido contrário.

Com posição marcada por princípios iluministas, Moraes foi contundente em defesa do Estado laico e da ciência. Agnósticos e ateus também devem ser protegidos, destacou. Pela liberdade religiosa, as igrejas não podem impor os seus dogmas ao Estado, disse o ministro do STF. “O Estado não se mete na fé, a fé não se mete no Estado”, disse. Sem citar o termo negacionista, o ministro afirmou que nem na Idade Média se via esse comportamento perante pandemias como a peste na Europa. Ele citou Martinho Lutero, que defendia isolamento para evitar a contaminação pela peste.

“Mesmo na Idade Média os grandes líderes religiosos defenderam em época de pandemia o fechamento de igrejas, isolamento, a transformação de igrejas e templos em hospitais”, disse Moraes. “Em pleno século 21 estamos defendendo retrocesso a medidas restritivas temporárias e justificadas?”. O ministro citou ainda o exemplo de Araraquara, onde “há três ou quatro dias não há uma morte”, como efeito de medida do prefeito Edinho Silva (PT), que decretou lockdown radical na cidade.

Fanatismo religioso

Ao ser interrompido, no início de sua fala  por um advogado que pediu um momento para fazer um “desagravo” ao ministro Nunes Marques, Moraes se irritou. Afirmou que a participação de advogados pró-igrejas vem desrespeitando o tribunal – em referência aos amici curiae que tumultuaram o julgamento citando a Bíblia e esquecendo o Direito, na quarta-feira. “Isso não é jogo de futebol. Espero votar sem advogados interrompendo por supostas questões de ordem”, protestou.

“Em alguns momentos pareceu que estamos criminalizando e perseguindo religiosos, decretando a prisão de pastores e padres”, continuou. Segundo Moraes, algumas passagens da participação desses advogados “foram inacreditáveis num momento em que o país chega a 4 mil mortos por dia”.

Como era esperado, Nunes Marques votou a favor de abrir igrejas. O sentido de seu voto, disse, é “evitar a supressão de liberdade de culto, mas não permitir templos lotados”, impondo limite de 25% da ocupação das igrejas. Ele reclamou da imprensa, que não teria entendido sua decisão de sábado, quando autorizou a abertura de templos, o que provocou enormes aglomerações.

“Parte da mídia me alcunhou de negacionista, insensível e até mesmo genocida. Sou adepto do consequencialismo jurídico”, explicou o novato. Ele se disse consciente do contexto pandêmico, “mas a garantia constitucional da liberdade religiosa – acrescentou – não pode ser suspensa nem por estado de sitio, nem mesmo em guerra”. Neste último caso, exemplificou com os capelães celebram cultos. Aduziu ser discriminatório o fechamento de templos de o trabalhador tem de pegar ônibus e trens lotados.


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