Arbitrariedade

Polícia invade Ocupação Mauá sem mandado e intimida moradores

A pretexto de checar denúnca de existência de drogas, operação com cães intimida moradores. “O Estado não nos atende em nada. Quando vem, é pra humilhar”

Reprodução
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Dezenas de motocicletas e viaturas bloquearam o acesso por cerca de 90 minutos

São Paulo – Moradores da Ocupação Mauá, na região da Luz, centro de São Paulo, denunciaram um operação ostensiva e abusiva da Polícia Militar na tarde deste sábado (20). Os policiais chegaram pouco antes da 16h com forte aparato, em viaturas e motos e acompanhados de cães. De acordo com testemunhas, desativaram as câmeras de segurança e – a pretexto de atender a denúncia de existência de drogas – soltaram os cães nas dependências da ocupação. Uma moradora, uma jovem de 25 anos e com cerca de 20 semanas de gestação, foi conduzida ao 2º Distrito Policial por suspeita de tráfico.

Apesar do aparato considerado desproporcional ao motivo alegado, os policiais não possuíam mandado judicial. “Nem sequer foram chamadas lideranças da ocupação para conversar. Simplesmente desconectaram as câmeras para impedir o registro da ação e bloquearam o local. Ninguém podia entrar nem se aproximar. E tampouco podiam sair”, relata o advogado Eduardo Santos, integrante do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos. Segundo ele, não é a primeira vez que a polícia executa operação ostensiva e abusiva, sem mandado, na Ocupação Mauá, apenas alegando supostas denúncias.

“Eles chegaram e nem procuraram conversar com as lideranças para que a gente possa ajudar no trabalho deles no que for preciso, se for o caso. É horrível o que fazem. Agora, não pode ser desse jeito. Ficamos cercados, assediados pela PM de São Paulo, intimidados. O Estado não nos representa em nada do que precisamos. Quando aparece é para humilhar”, desabafa o morador Nelson Tim, uma das lideranças. “Se a polícia invadir qualquer condomínio de bairros de classe média alta, com cães farejadores, provavelmente vai encontrar o que só procuram aqui, onde a maioria é gente preta e pobre”, disse um morador que preferiu não se identificar.

Histórico

O edifício situado na Rua Mauá, 340, foi ocupado por mais de 200 famílias de sem-teto em 2007. Pessoas sem condições de pagar aluguel – quem gasta mais de um terço da renda com o custeio de moradia faz parte do déficit habitacional –, desempregados ou empregados em condições degradantes. “Eram pessoas que perdiam a vida dentro de um trem e não viam seus filhos crescerem. Agora a gente tem mães que trabalham a 15 minutos daqui e passam em casa na hora do almoço para comer e levar os filhos para a escola”, disse Ivanete Araújo, coordenadora do Movimento Sem-Teto do Centro (MSTC), em reportagem de 2013 da RBA.

Na ocasião, a prefeitura de São Paulo, gestão de Fernando Haddad, acabara de assinar decreto de interesse social (DIS) do prédio de seis andares. Esse é o primeiro estágio legal para a desapropriação e reforma do imóvel. No ano seguinte, 2014, a prefeitura depositou R$ 11 milhões para assegurar a aquisição do imóvel para fins de habitação social. E, com isso, barrar as persistentes ações de reintegração de posse movidas contra as famílias. O imbróglio jurídico ainda perdura. Os proprietários têm dívidas de IPTU com a prefeitura desde 1973.