HISTÓRICO RACISTA

Movimentos pedem ao MPF que investigue Carrefour por morte de João Alberto

No documento, Coalizão Negra por Direitos pede providências para responsabilização das empresas Carrefour e Vector Segurança Patrimonial

Felipe Ouverney/NINJA
Felipe Ouverney/NINJA
João Alberto Silveira Freitas, o Beto, homem negro de 40 anos, foi espancado até a morte por dois seguranças de uma loja do Carrefour na zona norte de Porto Alegre

São Paulo – A Coalizão Negra por Direitos ingressou com uma representação no Ministério Público Federal (MPF) pedindo a abertura de investigação contra o Carrefour e a empresa de segurança Vector. A entidade, que reúne 150 organizações do movimento negro, pede para que seja investigada a responsabilização das empresas na participação da morte de João Alberto Silveira Freitas, na última quinta-feira (19).

A advogada da entidade, Sheila de Carvalho, lembra que a empresa de segurança também é responsável pela vigilância no supermercado Extra, que também possui histórico de violência. “Nossa representação busca cobrar responsabilidade da empresa Carrefour por mais um episódio de violência racial. Esse episódio não é isolado, há diversas violações de direitos humanos e, algumas delas, com conotação racial. Além disso, não é novidade a prática de violência por parte da Vector, que também cuida do Extra e já foi investigado por crimes raciais”, disse à repórter Larissa Bohrer, da Rádio Brasil Atual.

João Alberto Silveira Freitas, o Beto, homem negro de 40 anos, foi espancado até a morte por dois seguranças de uma loja do Carrefour na zona norte de Porto Alegre. O crime brutal foi filmado e as cenas circulam nas redes sociais. Os dois estão presos. Um deles é policial e foi levado para um presídio militar. O outro, funcionário de uma empresa de segurança contratada pelo Carrefour, foi detido pela Polícia Civil. A investigação trata o crime como homicídio qualificado.

Segundo o documento protocolado, são muitos casos de violência contra corpos e vidas negras que ocorrem no interior de grandes lojas no Brasil. “Solicitamos com urgência que providências sejam tomadas para que haja responsabilização efetiva não somente daqueles que praticaram os atos de violência e homicídio contra o Sr. João Alberto Silveira de Freitas, mas também a responsabilização por racismo, omissão e conivência das empresas Carrefour e Vector Segurança Patrimonial que perpetuam uma ação de violência contra a população negra brasileira”, diz o texto.

Caso no Carrefour não é isolado

A morte de João Alberto resultou em protestos durante três dias em diversas cidades do país. Para a presidenta do Geledés, Maria Silva de Oliveira, a sociedade não pode mais permitir esse modelo racista de organização. “A população negra vive um processo histórico de exclusão, marginalização e desumanização. O assassinato ocorreu dentro da loja e não há, em nenhum momento, tentativa de parar o espancamento. Já passou da hora de a sociedade refletir sobre qual o modelo de civilização daqui”, defendeu.

A loja paulistana do Carrefour, localizada próxima à Avenida Paulista, foi atacada após a 17ª Marcha da Consciência Negra de São Paulo, que se concentrou no vão do MASP (Museu de Arte de São Paulo). Centenas de manifestantes se dirigiram àquela unidade do supermercado, na rua Pamplona, na região central da capital. Vidros foram quebrados, os bloqueios foram derrubados, e algumas prateleiras tiveram seus produtos derrubados ao chão. Houve ainda um princípio de incêndio, rapidamente debelado.

Uma das lideranças do movimento negro no Brasil, Douglas Belchior, criticou o tratamento por parte da imprensa, que rotulou os protestos como “vandalismo”. “Nossa sociedade é patrimonialista e criminaliza lutas sociais. Criminoso é taxar de vandalismo uma manifestação tão legítima. Em São Paulo, o que vimos foi um clima de cansaço, as pessoas não aguentam mais. O movimento negro faz manifestações jurídicas, faz denúncias em fóruns internacionais, ou seja, a gente tem ações de diálogo. O que houve na sexta-feira foi um sinal de perda de paciência do movimento negro”, afirmou, ao jornalista Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual.

O presidente Jair Bolsonaro e seu vice, Hamilton Mourão, minimizaram o caso e disseram que não existe racismo no Brasil. “Em uma única família brasileira podemos contemplar uma diversidade maior do que países inteiros. Foi a essência desse povo que conquistou a simpatia do mundo. Contudo, há quem queira destruí-la, e colocar em seu lugar o conflito, o ressentimento, o ódio e a divisão entre classes, sempre mascarados de “luta por igualdade” ou “justiça social”, tudo em busca de poder”, acrescentou Bolsonaro.

Para Douglas, a reação dos chefes de Estado tem como objetivo frear a narrativa do movimento negro que avançou recentemente. “Neste ano, ficou a marca do aprofundamento do debate nacional sobre o racismo. Somos um país que se reconhece estruturalmente como racista. Em que época um executivo mundial de uma empresa, como ocorreu sexta, pediu desculpas e se reconheceu como privilegiado? É uma mudança importante, mas o imbecil do presidente da República é racista e defende essa tese”, finalizou.


Leia também


Últimas notícias