Milícia oficial

Bolsonaro usa casal expulso de assentamento para pôr Força Nacional contra MST

Após expulsão de casal suspeito de crimes, PM tentou invadir território de assentados. Governo federal tenta intimidar com Força Nacional no sul da Bahia

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Deputados questionaram ministro da Justiça sobre envio da Força Nacional à Bahia

Brasil de Fato – Passava das 11h do dia 31 de julho de 2019 quando o casal Aparecida da Silva Sousa Santos e José Carlos Bispo Santos foi expulso do assentamento Jaci Rocha, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que fica no município de Prado (BA). A decisão foi tomada após assembleia realizada pelos assentados da área. A exclusão marca o início de uma longa batalha que culminou com o envio, pelo governo de Jair Bolsonaro, da Força Nacional de Segurança Pública para a região, no sul da Bahia, na última quarta-feira (2).

Os motivos apontados para a exclusão de Santos e Aparecida da área estão apontados na ata da assembleia. São eles: não residir com sua família no assentamento, após a conclusão das moradias; ausentar-se por mais de 30 dias do assentamento, sem autorização ou motivo justificado; porte de arma de fogo no assentamento; e não comparecimento de três dias consecutivos e seis dias alternados ao trabalho coletivo.

As razões que não constam da ata, mas que se tornaram preponderantes para a decisão, são o envolvimento do casal com o tráfico de drogas no sul da Bahia e o roubo de gado dos produtores rurais da área. De acordo com assentados, algumas substâncias ilícitas começaram a circular no assentamento e pessoas que não eram conhecidas dos moradores passaram a circular pelo território.


Formação de milícia

Vídeo do MST explica ofensiva do governo federal em áreas da reforma agrária na Bahia. E denuncia ação de quadrilhas financiadas por grandes fazendeiros, especializadas em se infiltrar em assentamentos com objetivo de desestabilizá-los e criar conflitos, com apoio de agentes públicos. Assista:


Desde a expulsão, o casal Santos tentou retornar à área diversas vezes e ameaçou outros assentados. Na última sexta-feira (26), Bispo e Aparecida apareceram no Jaci Rocha acompanhados da Polícia Militar. O assentamento é considerado território federal e as forças de segurança estaduais não podem acessá-lo, somente as nacionais, como a Polícia Federal.

Sabendo disso, os policiais militares que foram até o assentamento afirmaram que no comboio de carros que os acompanhava estava um representante do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que necessitava de escolta. Porém, quando os assentados pediram a identificação do servidor, os agentes não a mostraram.

No dia 27 de agosto, o casal Santos, com mais 13 pessoas, foi até o local para tentar retomar a área novamente. Após conversas com a direção do movimento, desistiram. Sem êxito, teriam, de acordo com integrantes do MST, ateado fogo em dois lotes e a um trator, na madrugada do dia 28. O veículo e uma das áreas pertenciam ao casal antes da expulsão.

A Força Nacional no sul da Bahia

Na última quarta-feira (2), o ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, publicou, no Diário Oficial da União (DOU), a Portaria Nº 493, determinando o uso da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) nos municípios de Mucuri e Prado, onde o MST mantém assentamentos no sul da Bahia.

A decisão do governo de Jair Bolsonaro surpreende e tem sido encarada por representantes do movimento como desproporcional, por conta de a dimensão do problema ser reduzida. A justificativa apresentada na portaria é auxiliar o Incra “nas atividades e nos serviços imprescindíveis à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, em caráter episódico e planejado”.

Em nota, o Incra se manifestou. “Em respeito às famílias dos nossos assentados que vivem no local e para assegurar a defesa ao patrimônio público, caso fique comprovado o envolvimento de beneficiários da reforma agrária no crime, o Incra adotará as providências administrativas e judiciais necessárias – respeitando o devido processo legal – a fim de promover o cancelamento dos contratos de concessão de uso dos assentados envolvidos e a exclusão dos mesmos no Programa Nacional de Reforma Agrária, independente das demais medidas legais eventualmente cabíveis contra os acusados.”

Repercussão

Os deputados federais Helder Salomão (PT-ES), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, e Valmir Assunção (PT-BA) enviaram um ofício ao ministro André Mendonça solicitando mais informações sobre o envio da FNSP à Bahia.

“Considerando que não há informações de que o Governo do Estado tenha solicitado a presença da FNSP, considerando que se trata de pedido do Ministério da Agricultura e considerando o histórico de conflitos agrários no Brasil, solicitamos que Vossa Excelência esclareça a motivação da Portaria e a que, precisamente, se destinarão ‘as atividades e nos serviços imprescindíveis à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio’”, afirmam os parlamentares no documento.

João Paulo Rodrigues, da direção nacional do MST, criticou a portaria. “Como todos sabem, ontem fomos surpreendidos com o envio da Força Nacional aos municípios de Prado e Mucuri, na Bahia, para intervir em nossas áreas, a pedido do Incra. Nós, do MST, repudiamos essa decisão absurda. Nós queremos crédito e terra.” Para o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP), “Bolsonaro usa a força nacional ilegalmente para fazer política e enfrentar o MST”.

Histórico

O MST ocupou a área em Prado no ano de 2010. Somente em abril de 2015, o acampamento Jaci Rocha foi reconhecido como assentamento pelo Incra e as moradias começaram a ser construídas. Desde então, os assentados aguardam o Contrato de Concessão de Uso (CCU) dos lotes.

O Brasil de Fato procurou a Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA) e o Ministério da Justiça e Segurança Pública. Os órgãos não responderam até o fechamento desta matéria.


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