Vida de luta

Leonardo Boff: ‘Casaldáliga quis se identificar com os últimos, os sofredores, até o final da vida’

Corpo do bispo emérito será sepultado nesta quarta (12) em cemitério onde peões e indígenas que resistiram à grilagem em São Félix do Araguaia, no Mato Grosso, também foram enterrados

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Amigo de Dom Pedro Casaldália, teólogo diz que o bispo "é um fenômeno do cristianismo, do seguimento da mensagem de Jesus"

São Paulo – O teológo Leonardo Boff ainda se recorda do dia em que ouviu a “mais bela” das mensagens de Dom Pedro Casaldália. O bispo emérito estava de passagem pela Nicarágua, quando Fidel Castro fez questão de que ele fosse até Cuba. Nas terras do triunfo revolucionário, Dom Casaldáliga, no entanto, respondeu: “Em Cuba há pouca igreja, pouca liturgia e devoções. Mas há muito reino. Porque reino é feito de justiça, de solidariedade, de igualdade, de esforço, de ter uma visão universal das coisas. Aqui tem muito reino”, lembra o religioso. 

Em entrevista a Marilu Cabañas, do Jornal Brasil Atual, Boff disse que as palavras do velho amigo são belas porque há nelas “algo de eternidade, os valores do reino e o respeito à pessoa, à liberdade, à igualdade, que todos tenham o suficiente e o decente para comer”. O que Fidel ainda considerou ser a “análise da revolução sob todos os pontos de vista, econômico, político e estético”. Mas que também poderia sintetizar toda a luta do bispo emérito, que morreu neste sábado (8), aos 92 anos. “O socialismo integra todo mundo, todos somos irmãos e irmãs. E ele (Casaldáliga) criou esse sentimento de fraternidade”, compara .

Com o povo

Nesta segunda-feira (10), o corpo do bispo foi velado em Ribeirão Cascalheira (MT), depois da realização de uma missa de exéquias em Batatais (SP). De Ribeirão, o cotejo segue para São Félix do Araguaia, onde Dom Casaldáliga deve ser sepultado para “virar estrela”, como reflete Boff, nesta quarta-feira (12). O local foi escolhido pelo próprio bispo, que pediu para ser enterrado no Cemitério dos Sertões, onde peões e índios que resistiram à grilagem em Mato Grosso foram também sepultados. 

“Ele pediu no comunicado à assistência que ‘para descansar quero só essa cruz. Cruz de pau, com chuva e sol, estes sete paus e a ressurreição’. Ele quis se identificar com os últimos, com os sofredores, até o final da sua vida”, explica o teólogo. 

Boff lembra que o amigo também rejeitou o título de “Dom”. Na comunidade de São Félix, ele queria ser conhecido apenas como “Pedro, o irmão de vocês”. A luta de uma vida, a despeito de perseguições e ameaças, o tornam “estrela não só para as comunidades cristãs e as igrejas”, como adverte o teólogo. “Porque ele é maior do que a Igreja Católica. Ele é um fenômeno do cristianismo, do seguimento da mensagem de Jesus”.

Para Boff, assim como Cristo, é o corpo de Casaldáliga que será enterrado nesta quarta, jamais seu espírito. “E ele nos encherá de alegria e esperança. Porque a coisa que ele mais suscitava era a esperança do povo, apesar dos sofrimentos e perseguições.” 

Confira a entrevista 

Redação: Clara Assunção


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