Combate ao crime

Ações articuladas globais conseguem avanço contra tráfico de pessoas e trabalho escravo

Evento promovido pelo sindicato dos auditores fiscais destaca os 20 anos do Protocolo de Palermo, adotado pelo Brasil desde 2004

Sinait/Sérgio Carvalho
Sinait/Sérgio Carvalho
Grupos móveis de fiscalização, criados em 1995, já libertaram 55 mil pessoas

São Paulo – Nos 20 anos do chamado Protocolo de Palermo, adotado pelas Nações Unidas, fiscais, juízes, procuradores e outros envolvidos com o tema enfatizaram a necessidade de ações articuladas para combater tanto o tráfico de pessoas como o trabalho escravo. Esse é o tema da live promovida nesta quinta-feira (30, Dia Mundial contra o Tráfico de Pessoas) pelo Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho (Sinait).

O Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças, foi ratificado pelo Brasil em 2004. O Decreto 5.017 – assinado pelo então presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, e pelo embaixador Samuel Pinheiro Guimarães Neto – entrou em vigor em 12 de março daquele ano.

Trabalho escravo contemporâneo não traz correntes, torna a pessoa uma ‘coisa’

“É urgente avançar na erradicação desse crime, que afeta todos os países”, afirmou o presidente do Sinait, Carlos Silva, que coordenou a mesa de abertura da live. “Não há como não discutir como uma agenda prioritária, intersetorial, que envolve a todos que em nome do Estado brasileiro se preocupam em conferir dignidade às pessoas, ao ambiente do trabalho.”

Ele lembrou que os grupos móveis de fiscalização do trabalho escravo acabaram de completar 25 anos de atuação no Brasil. Até hoje, mais de 55 mil pessoas foram encontradas em situação análoga à escravidão e libertadas. Neste ano, mesmo com a pandemia, as ações de fiscalização resgataram 231 trabalhadores.

Crime internacional

A presidenta da Associação Brasileira de Defesa da Mulher, da Infância e da Juventude (Asbrad), Dalila Figueiredo, lembrou dos primeiros passos da entidade, acolhendo mulheres que haviam recebido propostas do exterior para trabalhar como babás ou acompanhantes de idosos. “Mas acabavam sendo obrigadas a se prostituir, tinham o passaporte apreendido, acumulavam dívidas”, acrescentou.

Ou de homens explorados principalmente em indústria de sucos e frigoríficos no exterior. O protocolo tornou-se, segundo ela, a principal ferramenta no combate ao crime internacional.

O diretor do escritório brasileiro da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Martin Hahn, citou a Convenção 29, sobre trabalho forçado, como uma das normas fundamentais da entidade. A prática atinge setores como a manufatura e os serviços domésticos, incluindo exploração sexual.

Segundo cálculos da OIT, o trabalho forçado no setor privado rende lucro de até US$ 150 bilhões por ano. Isso vem de quem se aproveita da “vulnerabilidade e do desespero” das pessoas.

De uma selva para outra

O presidente da Confederação Iberoamericana de Inspetores do Trabalho (Ciit), o uruguaio Sérgio Voltolini, também defendeu as ações integradas entre os vários órgãos públicos no combate a essas práticas. E fez referência à dificuldade no Brasil, onde os auditores-fiscais enfrentam baixo orçamento. Além disso, não têm concurso público há anos, levando a uma defasagem de mão de obra.

Os vice-presidentes da Anamatra (magistrados do Trabalho), Luiz Antônio Colussi, e da ANPT (procuradores), Lydiane Machado e Silva, participaram da abertura. Além deles, Glícia Salmeron, pela Ordem dos Advogados do Brasil, Daniela Muradas e Hugo Melo Filho, da Associação Latinoamericana de Juízes do Trabalho.

Na sequência do evento, a auditora-fiscal Vera Jatobá fez um histórico da atuação antes mesmo da criação dos grupos móveis. Lembrou que isso possibilitou o aperfeiçoamento do conceito de trabalho escravo, inclusive do ponto de vista legal. E um avanço para o “pacto civilizatório”, lembrou.

“A gente tinha que ter um outro olhar. Não era só Direito do Trabalho. A gente descobriu que tinha aliciamento, que tinha fraude, uma série de crimes”, comentou a auditora. Vera observou que as mudanças no mundo de trabalho também atingiram a prática da exploração, que ganhou novas formas. Não se restringindo só ao meio rural. “A exploração do trabalho persiste e se sofistica nas suas formas. O que a gente via na selva amazônica passou a ver na selva urbana.”