Invasão de privacidade

Idec notifica e exige medidas concretas do Dataprev sobre vazamento de dados de aposentados

Principalmente os idosos são assediados de “maneira cruel e incessante” por agentes de mercado oferecendo crédito consignado e outros serviços e produtos

Mirian Fichtner/Divulgação
Mirian Fichtner/Divulgação
Dataprev é responsável pela segurança de dados e informações previdenciárias e servidores temem desastre com privatização

São Paulo – Por meio de notificação, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) pediu esta semana à Dataprev para suspender a iminente contratação, por licitação, de tecnologia de reconhecimento facial e impressão digital de beneficiários do INSS, enquanto o grave problema de vazamento de dados e informações dos cidadãos não for solucionado. A Dataprev é responsável pela segurança de dados e informações previdenciárias.

Após o vazamento dos dados ter-se tornado corriqueiro, no início de 2019, o Idec se movimentou junto ao INSS e à Dataprev, para que adotassem medidas contra esses vazamentos. Por meio de listas fornecidas clandestinamente, principalmente idosos são assediados de “maneira cruel e incessante” por agentes de mercado, oferecendo crédito consignado e outros serviços.

“Esse vazamento gera um ciclo perverso de assédio a aposentados e pensionistas. Antes mesmo de receber seu benefício, eles já recebem ligações do mercado. É um assédio muito violento e um abuso. Muitos beneficiários acabam contratando serviços oferecidos sem necessidade de fazer isso, às vezes até para se livrar do assédio, insistente, diário, permanente e cruel. Isso gera endividamento de pessoas em situação de muita vulnerabilidade”, diz Diogo Moyses, coordenador do Programa de Direitos Digitais e Telecomunicações do Idec.

Segundo ele, a justificativa para a contratação da nova tecnologia é razoável: a de que os idosos não precisam fazer prova de vida na agência, podendo realizar esse procedimento pelo celular. A entidade de defesa do consumidor argumenta que, antes de fazer a contratação de uma tecnologia que permita o recolhimento de dados sensíveis, INSS e Dataprev precisam dar respostas concretas e objetivas em relação a vazamento de dados.

“Não sabemos se eles vão acatar nossa solicitação. Não descartamos entrar com uma ação judicial com esse objetivo para que se garanta, antes da contratação da nova tecnologia, a segurança dos dados e que comprovem em juízo terem feito mudanças substantivas no sistema”, afirma. Entre essas mudanças, esclarecimentos objetivos sobre as fontes de vazamento de dados e de onde vaza, além de responsabilizar as pessoas implicadas. “Porque isso é crime. Devem ser adotados novos procedimentos e métodos estratégicos de segurança, mas isso precisa ser comprovado. O que a gente quer dizer é que com dados pessoais não se brinca”, resume Moyses.

A movimentação do Idec e outros órgãos de defesa do consumidor não é de hoje. Já houve até mesmo representação à Procuradoria-Geral da República, audiência em comissões de defesa do consumidor da Câmara e do Senado, entre outras iniciativas. Até o momento, sem resultados objetivos. A coleta de  dados biométricos é considerada sensível, porque eles dizem respeito “à própria essência” das pessoas.

Telemarketing

O tema está intimamente ligado à questão do telemarketing. Praticamente todas as pessoas que têm telefone enfrentam as ligações intermináveis, não autorizadas e abusivas de todo tipo de empresa. “Temos defendido que é preciso fazer com que o consumidor autorize expressamente que seu telefone seja utilizado para oferta de produtos e serviços. O que precisamos fazer é inverter o jogo, dar ao consumidor o direito de dizer com quais empresas quer estabelecer relação e se aceita receber oferta de produtos e serviços”, explica.

A Lei Geral de Proteção de Dados (n° 13.709/2018) diz que o telefone é algo pessoal e os dados pessoais só podem ser utilizados com consentimento do consumidor. A prática invasiva e abusiva também viola o Código de Defesa do Consumidor (n° 8078/90).

“É preciso cortar o mal pela raiz, porque se não tiver esse mercado de telemarketing, você acaba com o tráfico de dados. As pessoas do INSS e do Dataprev não vão ter a quem passar os números de telefone das pessoas.”

Procons de alguns estados, como os de São Paulo (acesse o serviço aqui) e Santa Catarina, entre outros, já têm um serviço pelo qual o consumidor se cadastra para bloquear o telemarketing. O serviço funciona, mas não totalmente. Algumas empresas conseguem “furar” o bloqueio.

Por sua vez, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) criou o Não Me Perturbe, concebido pelas operadoras de telefonia por determinação da própria agência. A alternativa, porém, se restringe apenas a serviços de telecomunicações (telefones móvel, fixo, TV por assinatura e internet).

“Esse setor é apenas parte do problema. Há mercados, como o financeiro e outros, grandes e pulverizados”, diz Moyses. A ideia é que se criem serviços abrangentes e que também protejam os consumidores mais vulneráveis.

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