"novos tempos"

‘Servir está acima de trabalhar’, diz general, novo diretor-presidente da EBC

Para jornalista Laurindo Lalo Leal, 'ele não tem compreensão do que é a comunicação pública e muito menos das relações de trabalho'

Marcello Casal Jr./Agência Brasil
Marcello Casal Jr./Agência Brasil
Luiz Carlos Pereira Gomes dá pistas de que sua nomeação segue processo de degradação da comunicação pública iniciado com o golpe de 2016

São Paulo – Na última segunda-feira, o Diário Oficial da União publicou o decreto de nomeação do general Luiz Carlos Pereira Gomes para o cargo de diretor-presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Gomes é general do Exército formado em Ciências Militares e em Administração na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman). Como medida inaugural no cargo, o general encaminhou uma carta de apresentação aos funcionários da EBC na qual um dos itens é intitulado “Servir sempre”.

Segundo a diretriz, os jornalistas e funcionários devem seguir “o difícil dever de servir, o duro dever de servir, o sublime dever de servir e o divino dever de servir”.  O general diz que “servir impõe uma dedicação de corpo e alma à missão sem pedir nada em troca”.

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Para deputada Jandira Feghali, carta parece que foi resgatada do século XV

A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) comentou em sua conta no Twitter que a carta “parece que foi resgatada do século XV, mas é só a expressão da ineficiência deste governo de propor ou fazer qualquer coisa!!!”.

Para o jornalista Laurindo Lalo Leal Filho, a manifestação do novo diretor-presidente da EBC faz parte de “um processo de degradação da comunicação pública iniciado com o golpe de 2016”. No início de seu governo, lembra, o ex-presidente Michel Temer enviou uma medida provisória ao Congresso, depois transformada em lei, que extinguiu o conselho curador da EBC, principal espaço de participação da sociedade civil na gestão da empresa.

“Naquele momento ele acabava com a comunicação pública, porque o que caracterizava na prática a empresa pública era a presença do conselho, que intermediava a EBC com a sociedade. Ali foi o golpe contra a comunicação pública”, diz.

“Já o governo de Jair Bolsonaro institucionalizou esse rompimento ao juntar uma emissora teoricamente pública, a TV Brasil, com a NBR, uma estatal”, avalia.  A junção de ambas foi, em vão, considerada ilegal e inconstitucional por entidades defensoras do direito à comunicação, em audiência pública na Câmara dos Deputados. Já para o governo, a medida se justificava pela economia de recursos.

“A Constituição prevê que a radiodifusão deve contemplar o público privado e estatal”, aponta Lalo Leal. “Eu achava que havíamos chegado ao fundo do poço. Hoje, nos deparamos com o fato de que esse poço é ainda mais fundo, com a declaração do diretor-presidente da EBC”, observa. “Ele não tem compreensão do que é a comunicação pública e muito menos quais são as relações de trabalho que devem existir numa empresa como essa. A empresa já havia se degradado ao deixar de ter uma comunicação pública para ser uma agência de propaganda do governo. Agora impõe internamente uma relação não empresarial.”

Para o general Gomes, segundo diz na carta, “servir está acima de trabalhar”.  “Espero que a reação seja bem forte dos empregados e do movimento sindical dos radialistas e dos jornalistas contra a barbaridade desse documento”, diz Lalo.

O jornalista e professor lembra também que a comunicação pública na Europa vai completar 100 anos em 2022. O marco é a criação da British Broadcasting Corporation, a popular BBC de Londres. “Nós começamos a construir uma comunicação pública quase 80 anos depois, em 2007. Em menos de dez anos ela foi destruída.”

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