Arbitrariedade

Juíza baseia-se em acusação ‘tendenciosa” para prender líderes sem-teto

Mais nove membros de movimentos por moradia tiveram prisão decretada, além das quatros lideranças que foram mantidas presas. Para advogado Ariel de Castro Alves processo criminaliza luta social e favorece especulação imobiliária

MSTC/Reprodução
MSTC/Reprodução
"São acusações e investigações parciais, seletivas, tendenciosas", avalia Ariel sobre acusação do promotor que em novas prisões apontou ainda ligação com o PCC

São Paulo – Em mais uma decisão considerada arbitrária por advogados e movimentos de moradia, a Justiça de São Paulo decretou, nesta semana, prisão preventiva de mais nove líderes de movimentos que lutam por moradia na capital paulista. A denúncia, oferecida pelo promotor Cássio Roberto Conserino, é de extorsão e enriquecimento ilícito.

Em ação semelhante, a justiça ainda decidiu manter em cárcere Janice Ferreira da Silva, a Preta Ferreira, Sidnei Ferreira da Silva, Angélica dos Santos Lima e Ednalva Silva Franco, presos desde junho em São Paulo.

A juíza Érika Soares de Azevedo Mascarenhas, titular da 6ª Vara Criminal, ao aceitar a denúncia do Ministério Público Estadual, decretou a prisão de nove pessoas, de um total de 19 denunciadas pelo promotor. São eles: Ananias Pereira dos Santos, Andreya Tamara dos Santos de Oliveira, Hamilton Coelho Rezende, Josiane Cristina Barranco, Carmen da Silva Ferreira, Maria Aparecida Dias, Liliane Ferreira dos Santos, Adriana Aparecida França Ferreira e Manoel Del Rio Blas Filho.

À repórter Nahama Nunes, da Rádio Brasil Atual, o advogado e integrante do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe) Ariel de Castro Alves afirma que a magistrada foi induzida a erro pelos apontamentos do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) e do promotor. “São acusações e investigações parciais, seletivas, tendenciosas, com a finalidade de criminalizar os movimentos sociais e favorecer a própria especulação imobiliária no centro de São Paulo”, contesta Alves.

Na ação, a juíza justificou sua decisão dizendo que as lideranças cometeram “delitos de extrema gravidade”, alinhando-se ainda a um “poder paralelo” ao Estado, “cujo o objetivo maior é a desgraça humana com a finalidade única de vantagem financeira indevida, em detrimento de pessoas extremamente carentes e vulneráveis”. Para Conserino, as denúncias se justificam devido a supostas cobranças de taxas para viver nos prédios ocupados mediante grave ameaça ou violência. O promotor destaca também que há evidências de que os ativistas têm ligação direta com integrantes do PCC.

Sobre a acusação, o advogado Iberê Bandeira de Mello, que atua na defesa de líderes do Movimento Sem Teto do Centro (MSTC), apontou irregularidades nos argumentos da acusação. De acordo com Mello, à Rádio Brasil Atual, já houve tentativa de tomada de uma ocupação por parte do grupo, mas o caso foi denunciado à Polícia pelas próprias lideranças, que pediram investigações, posteriormente descontinuadas pelo Estado.”Ou seja, a prova de que o MSTC não tem ligação com a organização criminosa nenhuma, está exatamente nessa tentativa de tomada de uma determinada ocupação e a resistência dos moradores, isso não foi levado em consideração”, rebate o advogado.

“Mesmo essa interceptação telefônica, com essa determinada liderança, não há demonstração ou combinação de nenhum tipo de crime, por isso que eu falo, minha impressão é simplesmente que a juíza está errada”,acrescenta. De acordo com Mello, o processo no momento está estagnado, porque há acusados foragidos enquanto quatro lideranças do MTSC estão presas. A expectativa é que nas próximas semanas seja julgado o pedido de habeas corpus da defesa. Procurado pela reportagem, o promotor Conserino não quis se pronunciar sobre o caso.

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