direito à justiça

Especialistas estudam alternativas para combater prisões provisórias abusivas

Instituto Veredas lançará documento com estratégias para enfrentamento do problema. Esse tipo de prisão já corresponde a 41,5% do total de presos no país e cresce a cada ano

Agência Brasil
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Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da China

Brasília – A rebelião que culminou com 62 mortes em um presídio de Altamira (PA) chamou mais uma vez a atenção do país para um problema constante nos últimos anos: o excesso de prisões provisórias no nosso sistema criminal. Conforme dados do Sistema Penitenciário daquele estado, 26 dos mortos ainda aguardavam julgamento. E dados levantados no último semestre pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostram que estes números só aumentam.

Com base nessas estatísticas, o Instituto Veredas – entidade formada por profissionais que atuam na produção de conhecimento na gestão pública – lançará nesta semana um trabalho que aponta evidências e alternativas para o combate a esse tipo de prisão. 

A situação preocupa desde magistrados a entidades da sociedade civil. Do Pará, o presidente da seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, Alberto Campos, destacou considerar preocupante “ver uma quantidade elevada de presos provisórios misturados com presos que já estão cumprindo pena”.

Já o estudo mais recente do CNJ aponta que do total da população carcerária existente no Brasil – que hoje é de 812.564 presos, conforme o chamado Banco de Monitoramento de Prisões, vinculado à entidade –  41,5% (ou 337.126 pessoas) correspondem a presos provisórios.

Além disso, o Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da China, e esta população continua em crescimento, com o número de presos provisórios seguindo no mesmo patamar de quatro anos atrás.

Fatores diversos

Segundo o defensor público da União Gustavo Ribeiro, são vários os fatores que fazem com que a situação do sistema prisional brasileiro se agrave, como a demora na conclusão dos processos, as prisões cautelares (sem condenação) que se estendem por muito tempo e o encarceramento de pessoas por crimes de baixo potencial lesivo.

Ribeiro é da opinião que embora haja casos de reiteração criminosa, pequenos crimes como furtos famélicos – aqueles em que se furta para suprir uma necessidade urgente, como fome – deveriam ser tratados do ponto de vista social, diante a situação observada nos presídios. A seu ver, a questão é “muito mais social do que de polícia”.

De forma semelhante, a especialista Maria Carolina de Jesus Ramos afirmou em estudo intitulado “O abuso das prisões provisórias” sua posição, no sentido de que este tipo de prática termina sendo um cumprimento antecipado de pena.

“Se a pena deve ser a sanção imposta a um determinado delito, o grande problema das prisões provisórias é a afronta aos princípios da presunção de inocência e do devido processo legal. Dessa forma, o abuso de prisões provisórias implica numa antecipação (ilegal) da pena que ainda será decidida no decorrer do devido processo legal. A pena antecipada é um castigo desnecessário ao réu”, ressaltou.

Por todas essas críticas e preocupações, o Fundo Brasil Direitos Humanos (FBDH), a OAK Fundacion e o Instituto Betty e Jacob Laffer resolveram buscar alternativas que ajudem a amenizar o quadro. Estas entidades pesquisaram informações sobre audiências diversas de custódia realizadas no Distrito Federal entre 2016 e 2017, de forma a identificar problemas relacionados às prisões provisórias.

Sem redução de crimes

O resultado levará a estratégias a serem apresentadas como alternativas para o enfrentamento do problema no âmbito do sistema de justiça criminal. Para se ter uma ideia, relatório de gestão do núcleo de audiências de custódia do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), no período entre outubro de 2015 e dezembro de 2017, constatou que de 24.765 audiências realizadas, 52% resultaram em prisão preventiva e em apenas 5% dos casos houve alegação de violência no ato da prisão.

Isso, na avaliação dos pesquisadores, coloca em dúvida o fato de que estas prisões contribuiriam para a redução de crimes. “Temos estudos apontando que essas prisões podem, inclusive, aumentar os crimes cometidos por estas pessoas”, afirmou a diretora executiva do Instituto Veredas, Laura Boeira.

Os dados apurados mostram também que além da superlotação dos presídios, as sentenças não reduzem mais a reincidência do que penas e medidas alternativas em meio aberto, que são mais baratas e apresentam menos consequências para as pessoas e suas famílias. Todas as apurações serão apresentadas na terça-feira (13), às 19h, na sede da Escola Nacional de Administração Pública (Enap), em Brasília.

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