Onda de ataques

Após despejo violento da PM no Mato Grosso do Sul, indígenas resistem na luta por terra

Sem ordem judicial, povo Kinikinau retomava seu território quando foi surpreendido nesta quinta (1º) por bombas de gás lacrimogênio lançadas pela polícia

Cimi/MS
Cimi/MS
Terra ocupada nesta quinta é reconhecida como indígena por estudo antropológico. Povo Kinikinau reivindica demarcação há anos

São Paulo – Indígenas da etnia Kinikinau que tentavam nesta quinta-feira (1º) retomar sua terra no município de Aquidauna, no Mato Grosso do Sul, foram surpreendidos com forte repressão policial em uma ação forçada de despejo sem ordem judicial. Policiais militares do Batalhão de Choque adentraram o território da Fazenda Água Branca, reivindicado há anos e que estava ocupado pelos povos originários desde a madrugada desta quinta, lançando bombas de gás lacrimogênio no momento em que os anciões e lideranças descansavam e as crianças brincavam. Imagens e vídeos que circulam nas redes sociais mostram um indígena ferido na cabeça e crianças desesperadas.

Segundo uma liderança do povo Terena, que vive próximo ao local do conflito, não houve nenhum diálogo por parte da PM, que partiu de imediato para a expulsão dos 500 indígenas que ali estavam. “Não teve conversa, eles chegaram para machucar e tentar humilhar o povo”.

À Rádio Brasil Atual, o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto, que acompanha as denúncias, explica que a Fazenda Água Branca já é reconhecida por um estudo antropológico como uma área tradicional que pertence à etnia Kinikinau. No entanto, embora a terra, hoje propriedade do Banco Bradesco, seja uma reivindicação antiga em tramitação no Ministério Público Federal, até o momento o governo brasileiro não criou um grupo de trabalho para analisar a demarcação.

Diante das imagens de violência, o secretário executivo do Cimi afirma que a ação policial parece “servir como verdadeiras milícias privadas”, como destaca à jornalista Marilu Cabañas. De acordo com relatos dos indígenas ao Mídia Ninja, o prefeito de Aquidauna, Odilon Ribeiro, teria comandado a ordem de desocupação. Há pelo menos um áudio e um vídeo atribuídos ao prefeito, que, segundo a reportagem é primo da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, em que ele comemora o planejamento da ação para retirar os índios “vão sair por bem ou por mal. Isso é uma boa notícia”, chegou a dizer.

“É extremamente preocupante a ação das forças policiais do estado brasileiro, do estado do Mato Grosso do Sul, servindo como verdadeiras milícias privadas, ao serviço de interesses particulares, isso contra um direito sagrado e constitucional dos povos originários”, contesta Buzatto.

Mídia Ninja/Reprodução

Indígena ferido por policiais em meio a ação de despejo sem ordem judicial

As informações mais recentes passadas ao Cimi indicam que os Kinikinau estariam abrigados nos arredores da fazenda, numa área do povo Terena, onde parte deles já vivem por não terem seu território demarcado. Um grupo ainda se deslocaria para um acampamento também pertencente aos Terena, uma terra indígena um pouco mais distante de Aquidauna.

“O povo, evidente, sofreu um impacto muito grande, estão ainda em estado de choque, especialmente as crianças. Mas as lideranças estão fazendo um trabalho de reanimação, mesmo a própria liderança, que sofreu um corte na cabeça em função do ataque, disse que eles estão dispostos a continuar na luta pela reconquista dessa terra que lhes foi roubada, também de forma violenta, durante o século 20”, destaca o secretário executivo.

STF barra MP de Bolsonaro sobre remanejamento das demarcações da TI

Na contramão da onda de violência sofridas pelos indígenas, o Supremo Tribunal Federal barrou a Medida Provisória  (MP) 886/2019 do presidente Jair Bolsonaro que buscava remanejar as demarcações de terras indígenas da Fundação Nacional do Índio (Funai) para o Ministério da Agricultura. Por unanimidade, o plenário do STF derrubou a ação, mantendo suspensa a MP de Bolsonaro.

Para Buzatto, essa é “uma importante decisão, do ponto de vista tático, embora a gente saiba que ela não muda a posição política do próprio poder Executivo, do governo Bolsonaro, de não dar sequência às demarcações e portanto a decisão dele de continuar desrespeitando a própria Constituição brasileira”.

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