futebol e política

Em noite de união entre torcidas e povos, Venezuela resiste dentro e fora de campo

Enquanto a seleção venezuelana enfrentava a brasileira pela Copa América, simpatizantes e migrantes debateram, pensaram e demonstraram respeito pelo país vizinho

RBA
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Apesar do clima festivo e descontraído, o evento lembrou dos ataques aos direitos sociais e aos elementares direitos democráticos na Venezuela

São Paulo – A noite era de jogo da seleção brasileira. Mas no bar localizado na Vila Anastácio, zona oeste de São Paulo, não eram as cores verde e amarela que se sobressaíam. Um clima de união e solidariedade ao povo venezuelano foi o mote principal do encontro promovido pelo Comitê Brasileiro pela Paz na Venezuela, nesta terça-feira (18), durante o duelo entre as duas seleções, pela Copa América.

Quando a reportagem chegou ao local, a trilha sonora que predominava no ambiente era a canção italiana Bella Ciao –, símbolo da resistência contra o fascismo. Na decoração do espaço, destaque para o azul, branco e vermelho de Cuba e uma grande bandeira venezuelana pendurada na parede, além de bandeiras do Corinthians e Palmeiras. O ambiente era de total união, com corintianos e palmeirenses, representados pelos coletivos Democracia Corintiana e Porcomunas, dividindo a mesma cerveja.

Em meio ao clima festivo e descontraído, o evento lembrou dos ataques aos direitos sociais e à democracia na Venezuela, promovidos pelos Estados Unidos, com apoio do atual governo brasileiro de Jair Bolsonaro.

De acordo com Giovani del Prete, um dos organizadores do evento, o futebol é a melhor ferramenta para reunir a população que está “fora da bolha” e promover o diálogo e a tolerância. “São um país irmão e vizinho, e precisamos defender a soberania venezuelana e a paz em toda a América Latina. A gente trouxe como lema “nem briga entre torcidas, nem guerra entre povos”. Então, juntamos o futebol com a política, nesse bonito encontro.”

O venezuelano Hector Meleán contou sobre a felicidade de ser abraçado pelos brasileiros e se diz esperançoso com tamanha unidade. “Para mim é interessante e significativo, ver que num jogo de seleção brasileira, onde o Brasil para, estamos criando um espaço para pensarmos na Venezuela. Isso é de suma importância, mostrando solidariedade e comprometimento para efetivar o carinho ‘com nós’. Isso é a comemoração da esperança.”

Bola rolando

O clima de tranquilidade antes da partida não mudou após o apito inicial. Aliás, poucos demonstraram grande interesse pela partida em si. Apesar de a TV do local estar sintonizada na Globo, não houve espaço para os bordões de Galvão Bueno. O jogo foi exibido sem volume, embalado pela trilha sonora comandada por um DJ convidado, que abriu com a clássica Soy Loco Por Ti, América, de Caetano Veloso.

Como esperado, o público estava dividido entre os que torceram pelo Brasil e pelos venezuelanos, o que em nada abalou o clima de muita confraternização e o debate sobre a política internacional e saídas para a crise no país de Nicolás Maduro.

“A gente aprende com os venezuelanos que é preciso lutar, mas nunca perder o dever, o valor patriótico e a soberania nacional”, contou Giovani, que torceu pelo Brasil, apesar da militância pelo esclarecimento da situação política e social na Venezuela.

Em clima também de futebol, o tempo todo o bar teve comemorações. Ao fim do primeiro tempo, o Brasil teve seu primeiro gol da noite anulado pela arbitragem. Na segunda etapa, outros dois tentos foram invalidados pelo árbitro de vídeo. Se quando a bola balançou a rede, o grito de “gol” foi forte, a mesma empolgação foi notada quando o 0 a 0 voltar ao placar do jogo “Venezuela resiste”.

Por outro lado, após o terceiro gol do Brasil invalidado – numa noite de futebol fraco – , as associações do juiz da partida com o ex-juiz Sergio Moro não foram deixadas de lado. “O VAR está roubando como o Moro. É a Lava Jato do futebol”, disse uma torcedora, ao lembrar dos vazamentos contra o ministro da Justiça e provocar risos ao redor.

Apesar do empate sem gols, ninguém naquele bar encerrou a noite da terça-feira sentindo-se triste. O encontro que misturou futebol e solidariedade, foi uma forma de promover esperança, fornecer boa informação e fortalecer a resistência do povo venezuelano. “É importante unir esses setores aqui. Apesar de rivais na arquibancada, a gente senta junto aqui, toma uma cerveja, sempre falando de futebol e política. Tudo aqui é democrático”, finalizou Giovani. “Com o momento da Venezuela, o futebol pode representar uma enorme alegria e esperança”, acrescentou Meleán.

Falam Giovani del Prete e Hector Meleán: