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MST garante feira da reforma agrária no Parque da Água Branca: ‘Doria não é dono’

Quarta edição da feira da reforma agrária, na cidade de São Paulo, com produtos de todo o país, foi transferida para agosto. O local ainda precisa ser confirmado. Abaixo-assinado já tem 20 mil adesões

MST

Apoio a comércio de produção agroecológica implica também debate sobre segurança alimentar e sustentabilidade

São Paulo – Barrada pelo governo paulista, a 4ª Feira Nacional da Reforma Agrária vai ser realizada no Parque da Água Branca, na zona oeste da capital, garantem os sem-terra, que organizaram manifestação na tarde desta quarta-feira (17) no local, que sediou as três edições anteriores. Eles apostam na mobilização – que já inclui um abaixo-assinado – e na pressão contra o governador João Doria (PSDB), que alegou um veto do conselho responsável pelo parque. Isso aconteceu nas outras vezes, mas não impediu que o Executivo estadual confirmasse a feira na Água Branca, que está sob os cuidados da Coordenadoria de Parques Urbanos, da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente.

“É um conjunto de atividades econômicas, sociais e culturais que faz essa integração entre cidade e campo”, define Delwek Matheus, da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Com a decisão do governo paulista, o evento teve de passar de maio, como estava previsto, para a primeira semana de agosto.

Mas o movimento espera garantir a realização da feira na Água Branca, “um dos parques mais caipiras de São Paulo”, segundo o coordenador do MST João Paulo Rodrigues, que citou o professor e pensador Antonio Candido e seus estudos sobre a vida caipira.

No ano passado, de acordo com o MST, 260 mil pessoas visitaram a feira, consumindo 500 toneladas de produtos – 1.500 itens. Mais de 1.200 trabalhadores estiveram no evento, representando 24 das 27 unidades da federação. Durante quatro dias, também se organizaram debates, seminários e apresentações artísticas, além do espaço conhecido como Culinária da Terra, que servia pratos de todas as regiões.

Segundo Delwek, o objetivo da feira – além de permitir a comercialização dos diversos produtos feitos em assentamentos e cooperativas pelo país – é fazer o debate sobre modelos econômicos, um baseado em uso intensivo de agrotóxicos e outro defensor de alimentação mais saudável e diversificada. “Trata-se de uma discussão de projeto de desenvolvimento”, afirma.

Ele considera um “mito” o argumento de que a produção familiar, orgânica, é “cara”. “É possível produzir em escala de mercado, inclusive para exportação. Isso é uma decisão política, sobre qual é o modelo que a gente quer.” Para o coordenador, o parque da Água Branca “oferece as melhores condições para as características da feira”. “E é um evento que já se tornou uma agenda da população”, acrescentou.

Conquista da sociedade

Guilherme Gandolfi (@guifrodu)/FBP
Vamos continuar em vigília até que o governo de São Paulo libere o parque", disse João Paulo

Antes do ato na entrada do parque, os sem-terra fizeram pela manhã uma ocupação na sede do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em São Paulo, no bairro de Santa Cecília. De lá, à tarde, seguiram em passeata até a Água Branca, em um percurso de pouco menos de dois quilômetros. No trajeto, foram espalhados cartazes como “Incra não é quartel” e “São Paulo merece a Feira da Reforma Agrária”.

O MST conta com apoio de várias entidades e personalidades ligadas ao mundo da alimentação, como chefs de cozinha. No ato de hoje, o editor Haroldo Ceravolo informou que está organizando um abaixo-assinado pela manutenção da feira na Água Branca, em defesa de um modelo baseado na produção orgânico. O link para adesões é bit.ly/feiramst. Até as 19h, quase 20 mil pessoas haviam assinado. “É uma conquista da sociedade”, enfatizou.

“Ele (Doria) não quer mostrar que a reforma agrária funciona, ele quer nos apagar da história”, criticou o presidente da Cooperativa Paulista de Teatro, Rudifran Pompeu. Criada em 1979, a CPT tem, segundo ele, 4 mil artistas associados e aproximadamente 800 coletivos. “Ele não é dono da cidade, não é dono do estado”, acrescentou.

Na mesma linha, a deputada estadual Maria Izabel de Azevedo Noronha, a Bebel (PT), disse que a postura de Doria “é não querer reconhecer que tem movimento que dá resposta à questão da alimentação, pondo comida de qualidade na mesa”.

“Vamos continuar em vigília até que o governo de São Paulo libere o parque”, disse João Paulo, falando em mobilização nas redes sociais e em outras atividades. Ele lembrou que foram realizados atos em todo o país no dia de hoje, como parte da Jornada Nacional de Luta pela Reforma Agrária. Também nesta quarta, completaram-se 23 anos do massacre de Eldorado dos Carajás (PA), onde 19 trabalhadores foram assassinados.

Em nota, a Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente afirma que a decisão do conselho gestor e a deliberação da administração do parque “têm caráter estritamente administrativo e legal”. Como o público previsto excede o máximo estipulado por uma resolução, o pedido deve ser apreciado pelo conselho. A pasta informa ainda que recebeu membros do MST e a deputada estadual Beth Sahão (PT), oferecendo outros parques estaduais (o da Juventude e o Ecológico do Tietê), “que são maiores e oferecem mais segurança ao público”, mas as sugestões não foram aceitas. E que segue à disposição para discutir outras alternativas.

As centenas de manifestantes que se concentraram na Água Branca saíram do local por volta das 17h, depois da leitura de textos e ao som de Cio da Terra, canção de Chico Buarque e Milton Nascimento.

 

 

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