mobilidade urbana

Multar pedestres e ciclistas é injusto e não melhora segurança

Diretora da organização Cidadeapé destaca que comportamento de pedestres e ciclistas é só uma parte da problemática do trânsito nas cidades do Brasil e é preciso maior investimento em fiscalização dos motoristas

Rubens Chaves/Folhapress

A alegada melhora na segurança que a medida produziria é questionada por organizações que estudam mobilidade

São Paulo – A aplicação de multas a pedestres e ciclistas pelos órgãos de trânsito, que entra em vigor no mês de abril, é considerada injusta e ineficiente pela diretora da Associação pela Mobilidade a Pé em São Paulo (Cidadeapé), Ana Carolina Nunes. O comportamento de pedestres e ciclistas é só uma parte do problema, avalia Ana Carolina, e é preciso maior investimento em fiscalização dos motoristas.

“Nossa principal crítica é que o poder público não cumpre com o básico. Uma estrutura mínima, ter calçada, fiscalização do trânsito. No caso da bicicleta é o mesmo. Não se fiscaliza o comportamento dos motoristas, são mantidas velocidade altas nas vias. É uma balança injusta, que vai ficar ainda mais injusta”, afirma.

A diretora da Cidadeapé lembra que é muito comum locais em que as calçadas estão sem condições de passagem ou com a sinalização inadequada ou da área de deslocamento das pessoas. “Um pouco de observação mostra que quando as faixas estão dispostas onde há mais demanda por travessia ou existe mais fiscalização sobre os carros na conversão, as pessoas fazem o mais seguro. O investimento do poder público devia ser orientado nesse sentido”, diz.

Para Ana Carolina, o discurso de ampliar a segurança também não se sustenta. A Cidadeapé avalia que medidas como o “gesto do braço”, em que o pedestre deve fazer sinal aos carros para pedir passagem, como aplicado na cidade de Santos, no litoral paulista, transferem a responsabilidade pela segurança aos pedestres.

“Reforça a ideia de que os atropelamentos de pedestres e ciclistas têm muito mais a ver com comportamento do que com a estrutura em si. Talvez 30 anos atrás esse discurso de comportamento pudesse se sustentar. Mas hoje temos ampla literatura mostrando que esses fatores são apenas uma parte do problema. É uma narrativa obsoleta”, explicou.

A diretora lembrou ainda que a maior parte da ação da fiscalização de trânsito na capital paulista, por exemplo, prioriza garantir maior fluidez e segurança aos automóveis. Dados da plataforma Mobilidade Ativa revelam que a fiscalização também é altamente concentrada em alguns locais e sobre algumas infrações: 70% das autuações são feitas em apenas oito das 32 subprefeituras da cidade; E 77% delas focam em apenas dez dos quase 240 enquadramentos registrados na base de dados da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET).

Quando se observam as infrações que dizem respeito diretamente à segurança de pedestres e ciclistas, a situação se inverte. O agrupamento “Ameaçar ou deixar de dar preferência a pedestres e ciclistas” é composto de 10 tipos de infrações. Mas nos últimos quatro anos, somente 108 mil multas foram aplicadas. Ou 0,8% do total de multas. Isso ocorre também porque esse tipo de multa é aplicado exclusivamente por agentes de trânsito, cuja presença vem sendo reduzida na cidade, enquanto multas por velocidade ou rodízio contam com radares eletrônicos.

As multas para pedestres e ciclistas estavam previstas no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), já em 1997. Mas a medida nunca havia sido regulamentada. Em 2017, o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) aprovou uma resoluçãodefinindo o procedimento de autuação. As multas serão aplicadas por agentes de trânsito, que deverão abordar as pessoas que infringirem as regras, preenchendo o auto de infração com nome, documento de identificação, endereço e CPF.

As multas serão de R$ 44,19 para pedestres e de R$ 130,16 para ciclistas, que podem ter a bicicleta apreendida.

Para os pedestres, as infrações são:

Ficar no meio da rua

Atravessar fora da faixa, da passarela ou passagem subterrânea

Utilizar as vias sem autorização para festas, práticas esportivas, desfiles, ou atividades que prejudiquem o trânsito.

Para ciclistas: 

Andar na calçada quando não há sinalização permitindo

Guiar de forma agressiva

Andar em vias de trânsito rápido, que não têm cruzamentos

Pedalar sem as mãos

Transportar peso incompatível

Andar na contramão na pista dos carros em locais onde não houver ciclovia.

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