abandono e gentrificação

Moradores e ativistas ‘reinauguram’ praça na Cracolândia

Após tentativas de estado e prefeitura de expulsar moradores e dependentes, Cracolândia se mantém no centro de São Paulo. Ato neste sábado reage a 'higienização'

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‘Já que a praça não foi inaugurada pelos gestores, nós, de baixo, vamos mostrar de quem é esse lugar’

São Paulo – O ex-prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), prometeu extinguir a Cracolândia. Também prometeu cumprir seu mandato. Não cumpriu nenhuma delas. Após tentar solucionar o problema social da região com o uso da violência policial em 2017, a Cracolândia ainda existe e resiste no centro de São Paulo.

A política de expulsar dependentes químicos do local para “limpar” o bairro culminou no dia 29 de março deste ano com uma “inauguração” de um “novo bairro”, Nova Luz e Complexo Júlio Prestes, com uma praça homônima. Com presenças de Doria e do ex-governador tucano Geraldo Alckmin.

Após uma violenta ação policial promovida horas antes no local, para expulsar os moradores e frequentadores habituais, protestos resultaram no cancelamento da “inauguração”. Agora, a população está se organizando para, distante do poder público, inaugurá-la.

“A praça é cercada por uma grade e conta com seguranças particulares, deixando claro que pobres não podem mais entrar. Já que a praça não foi inaugurada pelos gestores, nós, de baixo, vamos mostrar de quem é esse lugar”, afirma o coletivo ‘A Craco Resiste’, que organiza o ato para sábado (1º).

A partir das 13h, o local será tomado pela população que deve apreciar apresentações artísticas. “Estaremos nós, militantes, moradores, frequentadores, trabalhadores, com nossos instrumentos, reafirmando nossas raízes a partir do samba.” Além de música, estão confirmadas presenças de expositores de fotos e poesias.

Em movimento

A Craco Resiste é um movimento formado em 2016 e consolidado após as políticas violentas aplicadas pela gestão Doria em parceria com Alckmin. A ideia é justamente entender os problemas do povo da região, estigmatizado muitas vezes pelo vínculo com o uso de drogas. A política se concentra basicamente na repressão aos usuários. O tráfico, de um lado, e a questão social e de saúde pública, de outro, seguem intocados. O coletivo defende medidas de redução de danos antiproibicionistas.

“A partir de uma discussão com militantes e usuários, iniciou uma vigília na área com atividades de lazer e cultura. Com exibição de filmes, rodas de samba, capoeira e apresentações musicais, a ideia era não só estar presente no fluxo, para denunciar a violência institucional, como trazer cada vez mais gente para conhecer aquela realidade, formando uma rede de apoio”, afirmam.

O coletivo lembra que o vínculo imediato daquelas pessoas com o uso de crack é incorreto, mas o nome do local foi apropriado. “Reivindicamos o nome Cracolândia primeiro por ser o termo usado pelos próprios frequentadores, uma contraposição às outras ‘lândias’ negadas ou desprezadas por eles. Uma comunidade de pessoas que foram excluídas ou que de alguma forma optaram por estar à margem da sociedade (…) Não se trata de um espaço físico, mas de um fluxo de pessoas unidos por diversos fatores, sendo o crack o mais conhecido, talvez o mais evidente, porém, nem de longe o único”, completam.