Primeiro Comando

Livro indica razões para o crescimento do PCC

Explosão do encarceramento em massa, descaso do Estado e um código próprio de justiça aplicado nas cadeias fortaleceram a organização criminosa, que já atua de modo transnacional

EBC

Para sociólogo, o modelo do Primeiro Comando da Capital não é empresarial, e nem somente militar

São Paulo – Criado há quase três décadas, o Primeiro Comando da Capital (PCC) se expande e já atua até mesmo dentro do crime organizado de países vizinhos ao Brasil. Atualmente, a organização criminosa fatura entre R$ 400 milhões e R$ 800 milhões por ano, segundo o livro Irmãos: Uma História do PCC, do sociólogo Gabriel Feltran, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e diretor científico do Centro de Estudos da Metrópole, da Universidade de São Paulo (USP).

A frase “Lealdade, respeito, e solidariedade acima de tudo ao Partido. Lutar pela liberdade, justiça e paz. Unir-se contra as injustiças e a opressão dentro das prisões”, que ilustra o primeiro estatuto da organização, mostra que eles se fortalecem graças ao apoio mútuo, entre os chamados “irmãos”, como em uma fraternidade, diz o autor. 

Para Feltran, o modelo da facção não é empresarial nem somente militar. “Você tinha toda a cúpula do PCC, que era considerada pelo Ministério Público, sendo transferida para lugares distantes e isolar as lideranças, e isso os fortaleceu, passaram a se organizar como uma rede“, explica o sociólogo.

Fruto do Massacre do Carandiru, em 1992, o PCC nasceu em 1993, na Casa de Custódia de Taubaté, unidade prisional então destinada ao castigo dos indisciplinados. Dentro de uma cela escura, um grupo de oito presos que tinha o costume de jogar futebol resolveu disputar o comando da cadeia com o Comando Caipira, formado por presos do interior. Vinte e cinco anos depois, a organização de apenas oito pessoas faz negócios em atacado em várias regiões do mundo.

A explosão do encarceramento em massa, o descaso do Estado e a oferta de justiça nas cadeias trouxeram um novo dilema para a vida dos policiais e administradores da base operacional. Com o PCC lidando com duas políticas simultâneas –  a do crime, e a do governo –, Feltran explica como o processo da organização se deu nas ruas.

“Os anos 90 são de guerra nas periferias por conta do mercado de drogas. Na virada dos anos 2000, os irmãos do PCC são chamados para mediar qualquer conflito na região. Eles se organizaram mais na cadeia e, nesse processo, eles se fortaleceram. Como? Regulando o preço das drogas, a ética de não se atravessarem no comércio, além da oferta de Justiça que impede a molecada continuar se matando”, conta.

A primeira grande aparição pública do Comando ocorreu em 2001, na ocorrência que como ficou conhecida a megarrebelião. De acordo com o estudo do sociólogo, ali consolidou-se a hegemonia do comando no sistema carcerário paulista, ao contrário do que pensava o então secretário de Segurança da gestão Mario Covas, Marco Vinicio Petrelluzzi.

Sucessivamente, secretários da pasta de Segurança Pública e da Administração Penitenciária, passando por Michel Temer, até Ferreira Pinto falharam em suas operações contra o Comando.

Bruno Paes Manso, jornalista e pesquisador do Núcleo de Violência da USP, acredita que o policiamento ostensivo e as prisões em flagrante proporcionaram a produção de uma engrenagem de violência. “Quando você deixa 230 mil pessoas dentro da prisão, você abre o discurso: ‘querem nos matar’. Os responsáveis pelo massacre do Carandiru continuaram se elegendo, então vamos pôr a arma na cara do sistema”, afirma.

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